O ESCRAVISMO NO BRASIL
OBJETIVO: Ensinar os alunos como se desenvolveu a história do Brasil e as motivações que levaram os portugueses a possuir escravos, quais as condições de vida os escravos, a quem interessa o escravismo e o porque os negros e índios foram escravizados.
METODOLOGIA: Quando necessário usaremos recursos audiovisual, mas prezando sempre pelo discurso descritivo seguindo o plano de aula. Proponho duas alternativas para dar esta aula: Primeiro: o próprio professor abordaria os temas abaixo usando recursos lúdicos como forma de apresentação que faria parte do seu acervo pessoal de auxilar na transmissão do conhecimento, tais como vídeos, fotos, trabalhos em Power-Point, objetos e artesanatos relativo ao tema ou então iriamos para a segunda alternativa que seria mais educativa, porém, menos prática devido a complexidade, mas seria interessante elaborar o plano de aula sobre o tema com a participação máxima dos alunos em um trabalho escolar que abaixo exponho:
COMPETÊNCIAS E HABILIDADES TRABALHADAS: Podemos separar a classe em grupos para trabalharmos o tema proposto, assim uma sala com trinta alunos, poderia ser divida em 6 grupos com cinco integrantes que iriam retratar o Escravismo no Brasil com os seguintes sub-títulos
Grupo 1 – Abordaria a captura de negros na África -
Grupo 2 – Abordaria a captura de índios no Brasil –
Grupo 3 – Abordaria a vida de escravos nas fazendas e senzalas
Grupo 4 – Abordaria as fugas e os Quilombos
Grupo 5 – Abordaria a vidas dos beneficiados pela escravidão
Grupo 6 – Abordaria a Abolição e as consequências
As formas de apresentação seriam com habilidades trabalhadas por cada grupo que utilizaria os seguintes recursos artísticos:
Exposição de fotos e gravuras
Video
Música
Desenhos
Miniaturas
Exposição de 0bjetos comum na época (ARTE EM SALA DE AULAartesanatos, cerâmicas)
Pintura em tela à óleo, guache e outros
Teatro
INTERDISCIPLINARIDADE: Na elaboração de uma aula com esta estrutura os alunos necessariamente terão conhecimentos de outras disciplinas como: geografia, antropologia, economia, e sociologia
PÚBLICO ALVO: Os alunos de 5a a 8a série seriam os mais visados pressupondo que tenham mais tempo e menos obrigações sociais, como trabalho remunerado
RECURSOS OU MATERIAIS DIDÁTICOS: Os livros didáticos seriam utilizados com base para o estudo do tema e recursos O recurso didático de estimular as pesquisas escolares feitas pelos próprios alunos é muito interessante, pois o aluno aprende a buscar o conhecimento por conta própria e quando vão apresentar em sala de aula, todos ensinam e todos aprendem, inclusive os alunos podem trazer conhecimentos que o proprio professor pode desconhecer. A apresentação de trabalho é um recurso didático que estimula e desenvolve outras habilidades nos alunos inclusive a retórica e a confiança de se expressar em público.
FORMA DE AVALIAÇÃO DE CONTEÚDO:os métodos clássicos de avaliar os alunos, na minha concepção são válidos e devem continuar sendo aplicados, tais como a prova objetiva, os trabalhos em grupos, mas durante as aulas o professor deve interagir com os alunos fazendo perguntas direcionadas a cada um dos alunos, logo após a exposição de uma aula, visando fazer uma avaliação informal da percepção de cada um. Desta forma o professor terá mais capacidade de detectar dificuldades de aprendizagem de algum aluno, direcionado sua atenção em ajudar o menos capaz a conseguir um índice de aprendizado que o possibilite avançar nos estudos. Acredito que a finalidade do professor não é eliminar o incapaz, isso a vida fora da escola tem seus métodos, muitas vezes até injusto, mas que castiga de certa forma dos que não quiseram estudar, mas o professor deve avaliar o grau de aprendizado dos alunos e ao perceber que alguém esta ficando para trás deve criar mecanismo para fazê-lo acompanhar o desenvolvimento dos demais, dando para o deficiente no aprendizado reforço de lição, leituras específicas e meios para que ele se supere.
CRONOGRAMA: Elaborar um plano de aula entre aluno de ensino fundamental, muitas vezes de nível sócio-econômico baixo, requer tempo e despesas que devem ser avaliadas pelo professor, se tal tarefa é viável. Uma vez avaliado as condições dos alunos em termo econômico e disposição de tempo, deve-se calcular quanto tempo será necessário para que o trabalho seja feito fora da sala de aula, quantas aulas serão necessárias para organizar e orientar os grupos e finalmente quantas aulas serão necessárias para expor o trabalho. Assim, a grosso modo, conforme trabalho exposto acima, acredito que seria necessário duas aulas intercalas para tratar das diretrizes do trabalho, mais três aulas para apresentação dos trabalhos e mais uma ou duas para troca de experiência e reflexão sobre os trabalhos expostos.
This blog is being published in order to spread general knowledge about pedagogy and teaching focus on teaching according to the will of God to men, since theories come and go, but the Word of God remains. (By Teacher Valdemir Mota de Menezes)
sexta-feira, 29 de outubro de 2010
sábado, 23 de outubro de 2010
PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA ESCOLA
PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NA ESCOLA
Abaixo trascrevi um artigo publicado pelo promotor de Justiça Murilo José Digiácomo sobre como a Escola deve enfrentar o problema da violência. Concordo com o digno promotor ao sugerir a efetiva participação dos pais na educação dos filhos sob pena de serem enquadrados legalmente em dispositivos constitucionais e legais que obrigam estes a terem permanente participação na educação dos filhos. Contudo acho que a polícia e outros meios repressivos podem ser utilizados na escola para submeter os alunos a monitoramento eletrônico, revista pessoal e punições mais severas.
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Violência nas escolas: sugestões para o enfrentamento do problema.
*Murillo José Digiácomo
Tem sido cada vez mais comum a divulgação, pela mídia, de casos de violência nas escolas, boa parte deles envolvendo adolescentes.
Após o massacre ocorrido em Denver, Estados Unidos, em que dois jovens pesadamente armados invadiram a escola Columbine, onde estudavam, e passaram a atirar contra seus colegas, matando 13 deles e ferindo vários outros antes de cometerem suicídio, a matéria atingiu proporções de uma verdadeira histeria coletiva, dando margem a propostas das mais variadas para o enfrentamento do problema.
A primeira reação, de cunho puramente emocional, foi a de trazer a polícia para dentro da escola, com a sistemática realização de revistas em alunos, na expectativa de impedir a entrada de armas no recinto escolar.
Deixando de lado a questão da legalidade de tais abordagens, que é no mínimo altamente questionável por provocar um indevido e injustificado constrangimento a alunos que são na imensa maioria das vezes as verdadeiras vítimas da mesma violência que se pretende reprimir, reputa-se deveras evidente que não é dessa forma que o problema será solucionado.
Com efeito, o combate à violência deve buscar primordialmente suas raízes, que
obviamente se encontram além dos limites da escola, que acima de tudo precisa assumir sua missão legal e constitucional de promover, junto aos educandos, "o pleno desenvolvimento da pessoa" e "seu preparo para o exercício da cidadania" (art.205, caput da Constituição Federal verbis/omissis), e não se tornar em mais um foco de opressão e desrespeito aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.
Com respaldo nos dispositivos constitucionais que tratam da educação[1], tanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) quanto a e Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/96) trazem a fórmula mais adequada para o combate à violência nas escolas: o envolvimento dos alunos, de suas famílias e da comunidade, com sua integração cada vez maior ao ambiente escolar e participação efetiva no debate acerca dos problemas relacionados à escola e em sua solução.
Nesse sentido, a Constituição Federal, em seus arts.205 e 227, caput, estabelece
claramente a necessidade da integração entre família, sociedade, comunidade e Estado (latu sensu), no processo de educação de crianças e adolescentes, bem como na sua proteção contra toda forma de violência, crueldade ou opressão, sendo que disposições semelhantes são encontradas no Estatuto da Criança e do Adolescente (arts.4º, caput; 5º; 17; 18; 53, caput e par. único e 70), bem como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (arts.2º; 12, inciso VI; 13, inciso VI; 14, caput e inciso II e 29, dentre outras).
Ao invés de se fechar cada vez mais, assumindo uma execrável postura opressora e
intransigente em relação a seus alunos, não raro tratados como "delinqüentes em potencial" e não como pessoas em formação, que assim merecem ser considerados e respeitados, deve a escola cumprir a lei e abrir suas portas à comunidade, que precisa nela encontrar um ambiente saudável, onde se ensina e se pratica a CIDADANIA, que a todos pertence e que por todos precisa ser preservado.
Apenas com o envolvimento das famílias e da comunidade, como desejam a Constituição Federal e legislação ordinária já mencionadas, é que poderá a escola se desincumbir de sua elementar missão de preparar seus educandos para o exercício da cidadania, o que inclui o respeito às leis e ao próximo, lição que se for bem ministrada e assimilada por todos, reduzirá drasticamente o índice de violência não apenas dentro, mas também fora do recinto escolar, beneficiando assim toda a população.
Nesse contexto, como forma de operacionalizar os comandos legal e constitucional suprareferidos, entendemos imprescindível a atuação dos CONSELHOS ESCOLARES, que devem se tornar fóruns permanentes de debate para toda a comunidade escolar, que reunida e cônscia do papel de cada um na solução dos problemas que afligem a escola e seus educandos, por certo dividirá responsabilidades, tarefas e encontrará respostas mais criativas, adequadas e acima de tudo eficazes que a singela revista pessoal dos alunos e a transformação das escolas em verdadeiras "fortalezas", cada vez mais distantes da sociedade que deveriam ajudar a formar e transformar.
Como sugestões, podemos citar a realização periódica de seminários a fim de ministrar lições básicas sobre direitos constitucionais, legislação em geral, ética, cidadania, através das quais serão pais e alunos conscientizados de seus direitos e deveres[2], ficando cada qual ciente de seu papel na sociedade. Importante ainda articular com os alunos, seus pais e a comunidade em geral, a forma como cada um poderá agir para prevenir e combater a violência, a começar dentro de seus lares, na medida em que os pais têm o DEVER de EDUCAR seus filhos (no mais amplo sentido da palavra), e que dentre os DIREITOS fundamentais destes está o de RECEBER LIMITES[3], deixando claro a quem poderão recorrer quando tiverem conhecimento da prática ou ameaça de violência envolvendo crianças ou adolescentes, seja como autores, seja como vítimas.
A forma de atuação da polícia preventiva junto às escolas, ou mesmo a criação de
mecanismos outros de defesa contra agressões externas devem ser articuladas entre o conselho escolar e o CONSELHO COMUNITÁRIO DE SEGURANÇA, que se espera exista ou venha também a ser criado, como mais um espaço onde a comunidade irá discutir e tentar resolver o problema de violência fora do ambiente escolar.
Sabemos que o discurso é mais fácil que a prática, notadamente em função da resistência apresentada por alguns dirigentes de escolas, que não estabelecem um canal de comunicação acessível aos educandos e não permitem o envolvimento de seus pais nos assuntos relacionados à escola, sendo comum o chamamento destes apenas quando seus filhos apresentam graves problemas disciplinares, contribuindo assim para fazer das visitas à escola um "programa" altamente desagradável.
De igual sorte, muitos pais demonstram pouco ou nenhum interesse em participar
ativamente, dentro e fora da escola, do processo de educação de seus filhos, o que
representa grave violação de um dos mais elementares deveres inerentes ao pátrio poder que precisa ser a todo custo corrigida, ainda que necessária a intervenção do Conselho Tutelar e da Justiça da Infância e Juventude[4].
O desafio, portanto, é a mudança da mentalidade que hoje prevalece, a começar pela direção e corpo docente da escola, que devem ser orientados acerca dos ditames legais e constitucionais já mencionados bem como conscientizados de que seu papel na formação de seus alunos vai muito além do puro e simples ensino dos conteúdos das matérias regulamentares, pois como vimos abrange a própria formação da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania, tarefas que devem ser executadas por todos educadores com a obrigatória participação das famílias dos educandos e da comunidade, que precisa ser estimulada, quando não convocada[5], a participar da definição das propostas pedagógicas.
A partir de então, diretores, educadores, pais, alunos e pessoas outras da comunidade interessadas, reunidos num conselho escolar representativo e atuante, poderão discutir abertamente sobre o problema da violência infanto-juvenil dentro e fora da escola, enfrentando-a em suas origens, e não apenas criando mecanismos de defesa paliativos que pouco ou nenhum efeito positivo surtirão.
Em suma, longe de assumir a cômoda, porém inadequada postura de pura e simplesmente reprimir a violência dentro de seus muros, pouco se importando como o que ocorre no mundo lá fora, deve a escola ter a coragem de enfrentar o problema em toda sua amplitude e preparar seus alunos para o convívio em sociedade, respeitando-os e fazendo-os respeitar as leis e o próximo, o que se dará através da mudança da mentalidade e da forma de agir acima de tudo de diretores e educadores, que para tanto deverão contar com a obrigatória e permanente participação dos pais dos educandos e da comunidade local.
Ressalte-se que iniciativas como as acima sugeridas, tomadas no âmbito de determinada escola, não devem permanecer isoladas, mas sim fazer parte de todo um programa de combate à violência infanto-juvenil que deve ser desencadeado em cada município, a ser discutido, aprovado e patrocinado pelo Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, onde deverão ser articuladas ações entre as secretarias municipais da educação, de segurança pública (ou similar), bem como com os demais órgãos públicos municipais e mesmo estaduais afins.
Mais uma vez avulta a importância do efetivo e regular funcionamento do Conselho
Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, que como sabemos tem a indelegável e fundamental missão constitucional de formular a política municipal para a área da infância e juventude, contando para tanto com a imprescindível participação de representantes da sociedade civil organizada.
Uma vez que a escola deixe de ser um ambiente de repressão e finalmente assuma o perfil idealizado pelo legislador constitucional e ordinário, tornando-se uma entidade aberta à comunidade e voltada à formação da pessoa e do cidadão, e que o município, através de uma política elaborada pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, passe a estimular e a dar suporte às iniciativas nesse sentido tomadas pela comunidade escolar[6], se estará caminhando a passos largos rumo à solução do problema, sem que para tanto tenham de ser sequer arranhados quaisquer dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, que tanto têm sofrido com toda espécie de violência nas escolas e fora delas, muitas vezes praticada justamente por aqueles que têm a missão legal e constitucional de impedir sua ocorrência.
Assim, e apenas assim, se estará prevenindo e combatendo a violência infanto-juvenil e dando a esses jovens, pessoas em formação, uma impagável lição de cidadania que se fará sentir para o resto de suas vidas.
* Promotor de Justiça
[1] Título VII, Capítulo III, Seção I, da Constituição Federal;
[2] o que servirá inclusive para acabar com alguns mitos ainda hoje existentes acerca do Estatuto da Criança e do Adolescente, que deverá ser analisado em conjunto com o art.5º da Constituição Federal, a fim de deixar claro que os direitos conferidos à criança e Ao adolescente pela Lei nº 8.069/90 não são outros além dos conferidos a TODOS, independentemente da idade, pela Lei Maior;
[3] sob pena, inclusive, de incorrerem os pais omissos em cumprir esta indelegável tarefa na prática da infração administrativa prevista no art.249 da Lei nº 8.069/90, sem embargo da possibilidade de receberem sanções outras dentre as previstas no art.129 do mesmo Diploma Legal;
[4] mais uma vez através da aplicação de sanções como as previstas nos citados arts.129 e 249, ambos da Lei nº 8.069/90.
[5] inclusive via Conselho Tutelar e/ou Justiça da Infância e Juventude, quando esgotados os recursos escolares, ex vi do disposto no art.56 da Lei nº 8.069/90;
[6] sem perder de vista a necessidade de disponibilizar medidas (notadamente as previstas nos arts.101, 112, incisos III e IV e 129 da Lei nº 8.069/90) que poderão ser aplicadas pela autoridade competente às crianças, adolescentes e famílias que delas necessitem;
Abaixo trascrevi um artigo publicado pelo promotor de Justiça Murilo José Digiácomo sobre como a Escola deve enfrentar o problema da violência. Concordo com o digno promotor ao sugerir a efetiva participação dos pais na educação dos filhos sob pena de serem enquadrados legalmente em dispositivos constitucionais e legais que obrigam estes a terem permanente participação na educação dos filhos. Contudo acho que a polícia e outros meios repressivos podem ser utilizados na escola para submeter os alunos a monitoramento eletrônico, revista pessoal e punições mais severas.
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Violência nas escolas: sugestões para o enfrentamento do problema.
*Murillo José Digiácomo
Tem sido cada vez mais comum a divulgação, pela mídia, de casos de violência nas escolas, boa parte deles envolvendo adolescentes.
Após o massacre ocorrido em Denver, Estados Unidos, em que dois jovens pesadamente armados invadiram a escola Columbine, onde estudavam, e passaram a atirar contra seus colegas, matando 13 deles e ferindo vários outros antes de cometerem suicídio, a matéria atingiu proporções de uma verdadeira histeria coletiva, dando margem a propostas das mais variadas para o enfrentamento do problema.
A primeira reação, de cunho puramente emocional, foi a de trazer a polícia para dentro da escola, com a sistemática realização de revistas em alunos, na expectativa de impedir a entrada de armas no recinto escolar.
Deixando de lado a questão da legalidade de tais abordagens, que é no mínimo altamente questionável por provocar um indevido e injustificado constrangimento a alunos que são na imensa maioria das vezes as verdadeiras vítimas da mesma violência que se pretende reprimir, reputa-se deveras evidente que não é dessa forma que o problema será solucionado.
Com efeito, o combate à violência deve buscar primordialmente suas raízes, que
obviamente se encontram além dos limites da escola, que acima de tudo precisa assumir sua missão legal e constitucional de promover, junto aos educandos, "o pleno desenvolvimento da pessoa" e "seu preparo para o exercício da cidadania" (art.205, caput da Constituição Federal verbis/omissis), e não se tornar em mais um foco de opressão e desrespeito aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes.
Com respaldo nos dispositivos constitucionais que tratam da educação[1], tanto o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90) quanto a e Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394/96) trazem a fórmula mais adequada para o combate à violência nas escolas: o envolvimento dos alunos, de suas famílias e da comunidade, com sua integração cada vez maior ao ambiente escolar e participação efetiva no debate acerca dos problemas relacionados à escola e em sua solução.
Nesse sentido, a Constituição Federal, em seus arts.205 e 227, caput, estabelece
claramente a necessidade da integração entre família, sociedade, comunidade e Estado (latu sensu), no processo de educação de crianças e adolescentes, bem como na sua proteção contra toda forma de violência, crueldade ou opressão, sendo que disposições semelhantes são encontradas no Estatuto da Criança e do Adolescente (arts.4º, caput; 5º; 17; 18; 53, caput e par. único e 70), bem como na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (arts.2º; 12, inciso VI; 13, inciso VI; 14, caput e inciso II e 29, dentre outras).
Ao invés de se fechar cada vez mais, assumindo uma execrável postura opressora e
intransigente em relação a seus alunos, não raro tratados como "delinqüentes em potencial" e não como pessoas em formação, que assim merecem ser considerados e respeitados, deve a escola cumprir a lei e abrir suas portas à comunidade, que precisa nela encontrar um ambiente saudável, onde se ensina e se pratica a CIDADANIA, que a todos pertence e que por todos precisa ser preservado.
Apenas com o envolvimento das famílias e da comunidade, como desejam a Constituição Federal e legislação ordinária já mencionadas, é que poderá a escola se desincumbir de sua elementar missão de preparar seus educandos para o exercício da cidadania, o que inclui o respeito às leis e ao próximo, lição que se for bem ministrada e assimilada por todos, reduzirá drasticamente o índice de violência não apenas dentro, mas também fora do recinto escolar, beneficiando assim toda a população.
Nesse contexto, como forma de operacionalizar os comandos legal e constitucional suprareferidos, entendemos imprescindível a atuação dos CONSELHOS ESCOLARES, que devem se tornar fóruns permanentes de debate para toda a comunidade escolar, que reunida e cônscia do papel de cada um na solução dos problemas que afligem a escola e seus educandos, por certo dividirá responsabilidades, tarefas e encontrará respostas mais criativas, adequadas e acima de tudo eficazes que a singela revista pessoal dos alunos e a transformação das escolas em verdadeiras "fortalezas", cada vez mais distantes da sociedade que deveriam ajudar a formar e transformar.
Como sugestões, podemos citar a realização periódica de seminários a fim de ministrar lições básicas sobre direitos constitucionais, legislação em geral, ética, cidadania, através das quais serão pais e alunos conscientizados de seus direitos e deveres[2], ficando cada qual ciente de seu papel na sociedade. Importante ainda articular com os alunos, seus pais e a comunidade em geral, a forma como cada um poderá agir para prevenir e combater a violência, a começar dentro de seus lares, na medida em que os pais têm o DEVER de EDUCAR seus filhos (no mais amplo sentido da palavra), e que dentre os DIREITOS fundamentais destes está o de RECEBER LIMITES[3], deixando claro a quem poderão recorrer quando tiverem conhecimento da prática ou ameaça de violência envolvendo crianças ou adolescentes, seja como autores, seja como vítimas.
A forma de atuação da polícia preventiva junto às escolas, ou mesmo a criação de
mecanismos outros de defesa contra agressões externas devem ser articuladas entre o conselho escolar e o CONSELHO COMUNITÁRIO DE SEGURANÇA, que se espera exista ou venha também a ser criado, como mais um espaço onde a comunidade irá discutir e tentar resolver o problema de violência fora do ambiente escolar.
Sabemos que o discurso é mais fácil que a prática, notadamente em função da resistência apresentada por alguns dirigentes de escolas, que não estabelecem um canal de comunicação acessível aos educandos e não permitem o envolvimento de seus pais nos assuntos relacionados à escola, sendo comum o chamamento destes apenas quando seus filhos apresentam graves problemas disciplinares, contribuindo assim para fazer das visitas à escola um "programa" altamente desagradável.
De igual sorte, muitos pais demonstram pouco ou nenhum interesse em participar
ativamente, dentro e fora da escola, do processo de educação de seus filhos, o que
representa grave violação de um dos mais elementares deveres inerentes ao pátrio poder que precisa ser a todo custo corrigida, ainda que necessária a intervenção do Conselho Tutelar e da Justiça da Infância e Juventude[4].
O desafio, portanto, é a mudança da mentalidade que hoje prevalece, a começar pela direção e corpo docente da escola, que devem ser orientados acerca dos ditames legais e constitucionais já mencionados bem como conscientizados de que seu papel na formação de seus alunos vai muito além do puro e simples ensino dos conteúdos das matérias regulamentares, pois como vimos abrange a própria formação da pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania, tarefas que devem ser executadas por todos educadores com a obrigatória participação das famílias dos educandos e da comunidade, que precisa ser estimulada, quando não convocada[5], a participar da definição das propostas pedagógicas.
A partir de então, diretores, educadores, pais, alunos e pessoas outras da comunidade interessadas, reunidos num conselho escolar representativo e atuante, poderão discutir abertamente sobre o problema da violência infanto-juvenil dentro e fora da escola, enfrentando-a em suas origens, e não apenas criando mecanismos de defesa paliativos que pouco ou nenhum efeito positivo surtirão.
Em suma, longe de assumir a cômoda, porém inadequada postura de pura e simplesmente reprimir a violência dentro de seus muros, pouco se importando como o que ocorre no mundo lá fora, deve a escola ter a coragem de enfrentar o problema em toda sua amplitude e preparar seus alunos para o convívio em sociedade, respeitando-os e fazendo-os respeitar as leis e o próximo, o que se dará através da mudança da mentalidade e da forma de agir acima de tudo de diretores e educadores, que para tanto deverão contar com a obrigatória e permanente participação dos pais dos educandos e da comunidade local.
Ressalte-se que iniciativas como as acima sugeridas, tomadas no âmbito de determinada escola, não devem permanecer isoladas, mas sim fazer parte de todo um programa de combate à violência infanto-juvenil que deve ser desencadeado em cada município, a ser discutido, aprovado e patrocinado pelo Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, onde deverão ser articuladas ações entre as secretarias municipais da educação, de segurança pública (ou similar), bem como com os demais órgãos públicos municipais e mesmo estaduais afins.
Mais uma vez avulta a importância do efetivo e regular funcionamento do Conselho
Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, que como sabemos tem a indelegável e fundamental missão constitucional de formular a política municipal para a área da infância e juventude, contando para tanto com a imprescindível participação de representantes da sociedade civil organizada.
Uma vez que a escola deixe de ser um ambiente de repressão e finalmente assuma o perfil idealizado pelo legislador constitucional e ordinário, tornando-se uma entidade aberta à comunidade e voltada à formação da pessoa e do cidadão, e que o município, através de uma política elaborada pelo Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente, passe a estimular e a dar suporte às iniciativas nesse sentido tomadas pela comunidade escolar[6], se estará caminhando a passos largos rumo à solução do problema, sem que para tanto tenham de ser sequer arranhados quaisquer dos direitos fundamentais das crianças e adolescentes, que tanto têm sofrido com toda espécie de violência nas escolas e fora delas, muitas vezes praticada justamente por aqueles que têm a missão legal e constitucional de impedir sua ocorrência.
Assim, e apenas assim, se estará prevenindo e combatendo a violência infanto-juvenil e dando a esses jovens, pessoas em formação, uma impagável lição de cidadania que se fará sentir para o resto de suas vidas.
* Promotor de Justiça
[1] Título VII, Capítulo III, Seção I, da Constituição Federal;
[2] o que servirá inclusive para acabar com alguns mitos ainda hoje existentes acerca do Estatuto da Criança e do Adolescente, que deverá ser analisado em conjunto com o art.5º da Constituição Federal, a fim de deixar claro que os direitos conferidos à criança e Ao adolescente pela Lei nº 8.069/90 não são outros além dos conferidos a TODOS, independentemente da idade, pela Lei Maior;
[3] sob pena, inclusive, de incorrerem os pais omissos em cumprir esta indelegável tarefa na prática da infração administrativa prevista no art.249 da Lei nº 8.069/90, sem embargo da possibilidade de receberem sanções outras dentre as previstas no art.129 do mesmo Diploma Legal;
[4] mais uma vez através da aplicação de sanções como as previstas nos citados arts.129 e 249, ambos da Lei nº 8.069/90.
[5] inclusive via Conselho Tutelar e/ou Justiça da Infância e Juventude, quando esgotados os recursos escolares, ex vi do disposto no art.56 da Lei nº 8.069/90;
[6] sem perder de vista a necessidade de disponibilizar medidas (notadamente as previstas nos arts.101, 112, incisos III e IV e 129 da Lei nº 8.069/90) que poderão ser aplicadas pela autoridade competente às crianças, adolescentes e famílias que delas necessitem;
VIOLENCIA ESCOLAR
VIOLENCIA ESCOLAR POR MARIA CECILIA MEDEIROS DE FARIAS
http://www.zemoleza.com.br/noticia/1136758/violencia_nas_escolas...__por_maria_cecilia_medeiros_de_farias_kother*.html
A escola é um dos principais cenários de uma comunidade, pelo seu próprio valor na formação e preservação da educação.
A violência que ataca as escolas fora dos seus muros é consequência da própria sociedade na qual ela está inserida. Por outro lado, a violência dentro da escola não deixa de ser reflexo do que acontece fora dela.
Ser for feita uma pesquisa sobre as causas desse processo de violência que está ameaçando a todos, dentro e fora das escolas, o resultado apontaria como causa primeira, inevitavelmente, a educação.
Cabe, consequentemente, perguntar: de quem é a responsabilidade pela ausência do processo educativo, cuja falta o torna gerador da onda de violência que assusta a todos? A resposta é conhecida e os responsáveis são muitos: família, professores, governos, enfim, todos os cidadãos, isto é, os que convivem em sociedade e que estão sujeitos a direitos e deveres.
É importante lembrar, também, que a ausência de responsabilidade pela parte que cabe a cada um na convivência educada, ou seja, ensinar e preservar preceitos básicos de educação e de respeito, está nos limites do descuido, beirando o insuportável.
Na cadeia de convivência e de relacionamentos que fluem no dia-a-dia da vida das pessoas, nem todos são culpados, nem todos são inocentes. Certamente, dentro desses parâmetros maiores de responsabilidade alojam-se outros, concebidos e assumidos sob a ótica pessoal do que cada um entende como seu compromisso.
Não querendo generalizar, mas, talvez, fazendo-o com o propósito de estimular as pessoas a fazerem uma reflexão individualizada sobre este grande mal que é a violência, e que ataca sem escolher a quem, disseminando o perigo e o medo na direção de todos, peço desculpas.
Se a cadeia que se inicia e que tem continuidade na criança educada, filho educado, aluno educado, cidadão educado, profissional responsável e, assim, sucessivamente, em todas as áreas e níveis da sociedade, precisa ser preservada, ela é, sem dúvida, um compromisso de todos os que têm algum vínculo com esses elos.
A sociedade precisa se dar conta de que muros, cercas, grades e câmeras de TV já não estão sendo suficientes para conter a violência, que, na sua brutal arrogância, vai se instalando nas pessoas, até mesmo naquelas que não eram nem pareciam ser violentas. Zelar pelas pessoas é um compromisso da sociedade. Não se pode esquecer que violência gera violência. Exemplos de pequenas violências, por percepções distorcidas, podem gerar violências maiores.
A perda dos limites do respeito na convivência familiar, escolar, social e profissional diminui nas pessoas o senso de oportunidade, de veracidade e de qualidade nos seus atos, tornando-as exemplos e modelos negativos que a sociedade simplificou como pessoas do bem ou do mal.
*Diretora do Instituto MC Educação Social
fonte: Zero Hora
http://www.zemoleza.com.br/noticia/1136758/violencia_nas_escolas...__por_maria_cecilia_medeiros_de_farias_kother*.html
A escola é um dos principais cenários de uma comunidade, pelo seu próprio valor na formação e preservação da educação.
A violência que ataca as escolas fora dos seus muros é consequência da própria sociedade na qual ela está inserida. Por outro lado, a violência dentro da escola não deixa de ser reflexo do que acontece fora dela.
Ser for feita uma pesquisa sobre as causas desse processo de violência que está ameaçando a todos, dentro e fora das escolas, o resultado apontaria como causa primeira, inevitavelmente, a educação.
Cabe, consequentemente, perguntar: de quem é a responsabilidade pela ausência do processo educativo, cuja falta o torna gerador da onda de violência que assusta a todos? A resposta é conhecida e os responsáveis são muitos: família, professores, governos, enfim, todos os cidadãos, isto é, os que convivem em sociedade e que estão sujeitos a direitos e deveres.
É importante lembrar, também, que a ausência de responsabilidade pela parte que cabe a cada um na convivência educada, ou seja, ensinar e preservar preceitos básicos de educação e de respeito, está nos limites do descuido, beirando o insuportável.
Na cadeia de convivência e de relacionamentos que fluem no dia-a-dia da vida das pessoas, nem todos são culpados, nem todos são inocentes. Certamente, dentro desses parâmetros maiores de responsabilidade alojam-se outros, concebidos e assumidos sob a ótica pessoal do que cada um entende como seu compromisso.
Não querendo generalizar, mas, talvez, fazendo-o com o propósito de estimular as pessoas a fazerem uma reflexão individualizada sobre este grande mal que é a violência, e que ataca sem escolher a quem, disseminando o perigo e o medo na direção de todos, peço desculpas.
Se a cadeia que se inicia e que tem continuidade na criança educada, filho educado, aluno educado, cidadão educado, profissional responsável e, assim, sucessivamente, em todas as áreas e níveis da sociedade, precisa ser preservada, ela é, sem dúvida, um compromisso de todos os que têm algum vínculo com esses elos.
A sociedade precisa se dar conta de que muros, cercas, grades e câmeras de TV já não estão sendo suficientes para conter a violência, que, na sua brutal arrogância, vai se instalando nas pessoas, até mesmo naquelas que não eram nem pareciam ser violentas. Zelar pelas pessoas é um compromisso da sociedade. Não se pode esquecer que violência gera violência. Exemplos de pequenas violências, por percepções distorcidas, podem gerar violências maiores.
A perda dos limites do respeito na convivência familiar, escolar, social e profissional diminui nas pessoas o senso de oportunidade, de veracidade e de qualidade nos seus atos, tornando-as exemplos e modelos negativos que a sociedade simplificou como pessoas do bem ou do mal.
*Diretora do Instituto MC Educação Social
fonte: Zero Hora
A IMPORTÂNCIA DO TEATRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
EXTRAIDO DO TRABALHO PUC-RIO
(PUC-RIO certificado 0212103/CA)
Fundamentação Teórica
Qual a necessidade da arte, em especial o teatro, na Educação Infantil? De que forma a arte sintética do teatro pode assimilar outras linguagens artísticas (Artes Plásticas, Dança, Música, Literatura) para fazer com que a criança se aproprie do patrimônio cultural estabelecido ao longo da história da humanidade? É possível à criança pequena, ainda em processo de construção da linguagem, se apropriar do Teatro e através dele desenvolver sua potencialidade expressiva e cognitiva? Como levá-la a compreender as relações sociais nas quais se encontra inserida, através da dramatização de histórias, contos de fadas, poesias e fazê-la vislumbrar um sentido para a existência humana numa sociedade capitalista, de consumo e extremamente individualista? Como aproveitar a sua natural tendência em acreditar na magia, no encantamento, no misterioso para estabelecer no imaginário infantil o poder da arte como espelho da natureza e do homem, artífice desta construção unicamente humana, a cultura?
Este capítulo tenta responder a estas questões em diálogo com alguns autores cujos conceitos foram organizados em cinco diálogos que tentam fundamentar a prática teatral, exercida cotidianamente na creche Fiocruz, que sedimenta sua prática pedagógica numa visão de criança cidadã
1.
2.1
DIÁLOGO I - Do Primitivo à Criança Contemporânea: O Teatro Como Ponte (Uma Conversa com Ernst Fisher)
Assim que o príncipe montou a cavalo e viajou, a rainha-velha começou a ter vontade de beber sangue e comer carne humana. Ficou mesmo bruta e não podendo passar o desejo, chamou o mordomo e mandou que lhe servisse Belo-Dia, com bom molho, no almoço do dia seguinte.
(Câmara Cascudo).
1 Entendemos por criança cidadã o que fala o Art. 3º do ECA. “A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais, inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral do que trata essa Lei, assegurando-se-lhes por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental e moral, espiritual e social, em condições e de dignidade.” 18
Neste primeiro diálogo, estabelecemos uma conversa com Ernst Fischer a partir de sua obra “A Necessidade da Arte”, tentando delinear o efeito da Arte na Educação Infantil a partir da compreensão de sua natureza, de sua gênese e da ação por ela exercida na construção de uma consciência estética, que faça a criança se apropriar de seus meios criativos para compreender os processos que regem o mundo. A partir dessa compreensão, levá-la a atuar criticamente em relação a esses processos, com uma visão mais social, sensível e procurando integrar o indivíduo à coletividade.
Para tanto, podemos utilizar a visão de Fischer que teoriza sobre a necessidade da arte a partir da idéia de uma raiz comum da qual se originaram a ciência, a religião e a própria arte: a manifestação de uma forma primitiva de magia no cotidiano cultural do homem primitivo com o intuito de tentar dominar o mundo real inexplorado.
Com o progressivo desenvolvimento dessas três formas de conhecimento humano, ocorre a diversificação entre elas para atender as necessidades de sociedades mais complexificadas e que passam a reservar à arte o papel de clarificar o ser humano a respeito das relações sociais que vão sendo estabelecidas, iluminar sensivelmente o seu raciocínio a fim de auxiliá-lo a reconhecer e transformar a realidade social a sua volta. A arte ajuda o ser no processo de identificação com a vida do outro, incorporando em si aquilo que ele ainda não é, mas que pode vir a ser: um ser humano “total”.
Fisher associa a idéia do nascimento da arte com o do trabalho humano coletivo a partir da concepção da ferramenta como utensílio que permitiu ao homem primitivo distanciar-se da natureza, lançar-lhe um olhar crítico, amedrontado, mas que procurava dominá-la magicamente.
A ferramenta tornou o homem um ser que libertou sua razão criadora para auxiliá-lo na tarefa de adquirir consciência de estar no mundo, provocando a sua ação consciente.
Essa visão em que o primitivo, a partir de uma vivência inicial colada à natureza e por necessidade de subsistência, desenvolveu através do corpo, preferencialmente da mão, todo um sistema cultural ao criar o instrumento de trabalho antes mesmo de poder raciocinar sobre a diversidade de seu uso, tenta recolocar a importância da corporeidade, do sentimento face ao pensamento que “não passa de uma forma de experimentação abreviada que se transfere das mãos 19
para o cérebro, de modo que os resultados das experimentações precedentes deixam de ser “memória” e passam a ser “experiência” (Fisher, 1971, p.27)
Para Fischer, o trabalho foi criador do pensamento, do fazer consciente e do ser consciente, gerando a linguagem, fruto de variadas denominações sensoriais que ajudavam o primitivo a diferenciar-se da natureza ao seu redor.
O encantamento proporcionado pela imitação do mundo exterior tornou-se um fator essencial de constituição da linguagem, levando-a a ter “uma dupla natureza como meio de comunicação e expressão, imagem da realidade e signo para ela, percepção “sensorial” do objeto e abstração” (Fischer, 1971, p.34), e que além disso transmitisse as sensações e experiências que a natureza à sua volta lhe proporcionava. Aos poucos, a linguagem vai ocupando um lugar central na concepção de cultura e de arte.
Para o primitivo, natureza, vida, trabalho, linguagem, cultura, arte, comunicavam-se através do ritmo ditado pelas atividades de sua vida cotidiana. Portanto, a necessidade da arte nunca tinha sido questionada até então, pois através de seus produtos: a canção, a poesia, a mimesis, tornava-se a sua própria razão de ser, pela importância em organizar o grupo social em torno do trabalho coletivo adquirindo força, magia e trazendo mais vontade ao grupo para realizar a tarefa a que se obrigava, pois essa magia representa o que mais de verdadeiro se busca na arte (Fischer, 1971).
A gênese do teatro é semelhante. Originou-se das cerimônias religiosas que visavam alegrar aos deuses da natureza, para que enviassem boas colheitas, celebrando o encontro entre a mãe terra e a semente, bebendo o vinho e promovendo o amor. A comunicação entre as pessoas, o ritmo das danças, levaram ao surgimento da poesis e às primeiras formas organizadas de manifestações teatrais de que se têm notícia.
O processo de metamorfose adquiriu caráter mágico, divino, para que o primitivo pudesse agradar aos deuses, encantando a natureza e levando-a à transformação, para que garantisse a retribuição ao esforço do trabalho coletivo. Sendo assim, “a Arte era um instrumento mágico e servia ao homem na dominação da natureza e no desenvolvimento das relações sociais” (Fischer, 1971, p. 44).
A arte passou a conferir poder ao primitivo sobre a natureza e os outros homens, tornando-se um elemento indissociável da realidade cotidiana, 20
derivando-se das manifestações ritualísticas até alcançar formas mais elaboradas de encenação artística.
Qualquer criança, ao nascer, traz em si o passado primitivo do homem, reproduzindo a mesma trajetória pelo qual ele evoluiu até se erguer sob os dois pés. A criança nasce primitiva e ao sofrer o processo de educação no seio de uma sociedade, assimila as regras sociais e culturais nos quais vai se desenvolvendo. O interesse da prática teatral na Educação Infantil é recuperar, junto com a criança pequena, por ela e para ela, o sentimento ancestral de magia e encantamento que a arte apresentou na constituição da noção de humanidade, para que ao adquirir o olhar estético, a criança possa vivenciar o mundo que a rodeia com um profundo sentimento renovador e crítico que, a qualquer época, é imprescindível para a evolução do que conhecemos hoje como uma sociedade humana.
2.2
DIÁLOGO II – A Importância dos Contos de Fadas (Conversando com Bettelheim)
Nesse momento chegou uma escrava negra, cega de um olho, a quem chamavam a Moura Torta. A negra baixou-se para encher o pote com água do rio mas avistou o rosto da moça que se retratava nas águas e pensou que fosse o dela. Ficou assombrada de tanta formosura. (Câmara Cascudo)
O segundo autor que nos ajuda a fundamentar nossa prática teatral, Bruno Bettelheim, trabalha com a narrativa fantasiosa (o conto de fadas, o conto popular), tentando estabelecê-la como uma possibilidade cognitiva concreta (embora fantasiosa) para que a criança possa alcançar um objetivo fundamental na sua constituição: construir significado para a vida que pulsa ao seu redor e dentro dela, através do enriquecimento de nossas capacidades interiores, como a imaginação, as emoções e o intelecto.
Concomitantemente, o conto de fadas ajuda a criança a conhecer a história, muitas vezes oculta, da constituição das relações sociais do mundo, tal como o conhecemos hoje, assim como as diferentes maneiras pelas quais a humanidade age neste mundo na eterna luta pela vida, construindo sociedades e as destruindo, estabelecendo sistemas de governo e estilos de vida. 21
O primeiro grupo social de uma criança2 é, idealmente, a família que possui histórias que a ajudam a se constituir de diferentes maneiras possíveis, transferindo-lhe capital cultural e social estabelecendo um ponto de partida que pode ajudá-la a se desenvolver dentro de um sistema de relações sociais que situa sua família numa classe hierarquicamente estabelecida.
As narrativas fantasiosas, discriminadas pelo mundo adulto pelo epíteto “historinha para criança” (e o diminutivo carinhoso, evidencia todo o demérito que lhe é imposto), ao fazer parte do mundo infantil no meio escolar, colaboram para somar valor ao capital cultural da criança pequena, ajudando-a a explorar suas potencialidades cognitivas e expressivas. São essas histórias, lançando mão de signos poderosos consubstanciados nas imagens da bruxa, madrasta má, gigante poderoso, fada boa, criança frágil, inteligente e corajosa, que revelam a história individual e social do ser humano, explicitando crueldades, injustiças e lutas necessárias para sobreviver nesse mundo. Elas possuem o poder de despertar e atrair a curiosidade infantil, sem abrir mão de seu potencial de entretenimento, ajudando a criança a desenvolver seu intelecto, a compreender suas emoções internas, profundamente conflituosas, a reconhecer suas dificuldades e a sugerir soluções (Bettelheim, 1996).
Outro objetivo da narrativa e da dramatização dos contos de fadas, reside no fato de ele permitir à criança “construir um ligação verdadeiramente satisfatória com outra pessoa” (Bettelheim, 1996, p. 19). Na grande maioria dos contos de fadas o herói precisa sempre encontrar um outro que o ajude a atingir um estágio mais avançado de conhecimento e de amadurecimento. E quando esse objetivo é alcançado na narrativa, constitui-se afinal um exemplo de sentido para a vida individual do herói e, conseqüentemente, para a criança.
Ao longo da história do exercício dessa prática teatral, tornou-se comum a dramatização de uma gama variada de narrativas, desde as mais tradicionais de origem européia, passando por outras de diferentes nacionalidades numa viagem pelo mundo que se mostrou de uma riqueza cultural ímpar, até chegar as variantes nacionais coletadas por Câmara Cascudo no seio do folclore brasileiro. Pôde-se observar que as características fundamentais de uma boa narrativa estão presentes em muitas delas, independente de sua nacionalidade ou especificidade: dilema existencial breve e categórico; simplificação de situações; tipificação dos personagens; onipresença do bem e do mal, com a garantia da vitória do bem através da identificação com o herói (Bettelheim, 1996).
A narrativa fantasiosa está profundamente relacionada com o passado da humanidade que, através delas, revela seu rosto repleto de cicatrizes à criança contemporânea, fazendo uma ponte através do tempo com suas questões internas, assegurando-lhe caminhos possíveis, já trilhados por outros, para solucionar seus problemas complexos, suscitados por uma sociedade orgulhosa de seu poder tecnológico que lhe garante poder, conforto, progresso.
Queremos acreditar que a escolha do conto de fadas como dramaturgia básica de uma prática teatral, que pretende estabelecer o jogo do teatro no cotidiano escolar infantil, insere-se numa perspectiva benjaminiana que concebe a Infância como “historicamente construída”, imaginando-a como a fase da vida capaz de ser crítica da cultura do mundo adulto.
Essa dramatização se torna “experiência”, possibilitando que uma aventura narrada e vivenciada coletivamente na ficção, faça parte do que é vivido pela criança, enraizando-se na realidade, refletindo suas contradições, iluminando a estrada da contemporaneidade e o que pode acontecer com a subjetividade infantil ao se defrontar com ela, revelando a história humana através da Infância, estabelecendo-a como “um modo privilegiado de percepção” (Gagnebin, 1994, p. 86) e fazendo-nos perceber a criança como aquela que pode nos ensinar a criar, sentir, viver melhor (Kramer, 2003).
Outro objetivo da prática teatral em questão, se sustenta na possibilidade de realizar a alfabetização em linguagens artísticas e a iniciação em comportamento estético (Gagliardi, 1992) da criança pequena e de especificar o papel do teatro na educação como um veículo amplificador da experiência cognitiva e emocional, através de um trabalho pedagógico específico (Gagliardi, op. Cit.), auxiliando no processo de constituir a categoria “Cultura da Infância” como contraponto aos pressupostos de uma sociedade fundamentada na primazia da razão, como único meio de soluções de problemas, do trabalho, prioritariamente visto como produtor de bens que sustente a qualquer preço o modo de vida capitalista, e de depredação da natureza em nome do consumo, razão de ser do estilo individualista e competitivo de existência contemporânea.
23
O esgotamento das fontes de recursos naturais do planeta, a superpopulação, a urbanização desenfreada dos grandes centros, o neoliberalismo econômico3 em oposição ao Estado de Bem Estar Social, são alguns dos fatores que tornam inviável a idéia de desenvolvimento infinito capaz de gerar trabalho para todos, sustentado por um conceito de educação formador de mão de obra capacitada que sustente a engrenagem capitalista.
Acreditamos que a prática teatral em questão, visa colaborar com uma concepção de educação que possibilite a criança pequena desenvolver um tipo particular de conhecimento, o sensível, que colabore com sua iniciação no mundo cultural através da apresentação do que de mais significativo possa haver na cultura do país e do mundo, usando “linguagens estéticas” que estimulem a vivência de experiências sensoriais e expressivas, adaptando esse material às necessidades específicas do palco e do entendimento da criança, levando-a a se reconhecer como um vasto campo de possibilidades na interação com o outro.
Para executar essa tarefa, partamos do princípio de que não devemos subestimar a capacidade intelectual e corporal da criança, achando-a incapaz de apreender a Literatura, as Artes Plásticas, a Música, o Teatro que lhe oferecemos. Entretanto, tudo precisa ser analisado e às vezes adaptado para atender às necessidades cognitivas em construção.
O educador precisa desenvolver e aprimorar seu conhecimento estético nos mais variados campos da arte, além de sua capacidade expressiva, para que possa enriquecer seu poder de comunicação através de efeitos dramáticos transmitidos pelo uso adequado da voz, do corpo, visando levar a criança a vivenciar as possibilidades expressivas e dramáticas do seu próprio corpo, sua voz, sua imaginação, atraindo sua atenção pelo sensível, pelo encantamento.
A interação e o diálogo entre o adulto e a criança são fundamentais, pois é através deles que ela vai se apropriando do conhecimento estético. Sentindo-se acolhida e respeitada a partir dessa relação, a criança responde agindo de forma mais expressiva, amorosa e integral, em consonância com o outro, aprendendo através do jogo teatral a descobrir uma possibilidade de sentido para a vida.
Pela comunhão estabelecida entre o educador e as crianças, e entre elas próprias, o teatro pode se transformar num brinquedo cultural que ultrapasse o faz-de-conta do cotidiano infantil para se transformar num instrumento de trabalho coletivo para a criança que “assim aprende a agir como “ser social”e cresce. Os grupos infantis são grupos de iniciação para a vida por intermédio da experiência e em contato direto com o meio social em que vivem. Mesmo sendo situações vividas de forma elementar, elas antecipam e preparam, passando pelos diversos estágios culturais, para a vida adulta.” (Altman, 1999, p. 240).
Dramatizar contos de fadas, poesias de Cecília Meirelles, Drummond, adaptar peças de Maria Clara Machado para que as próprias crianças possam ser os atores-autores de seu jogo teatral, são atitudes de uma prática que se pretende inclusiva, pois rompe as fronteiras entre os diferentes: o adulto e a criança, o pobre e o rico, o negro e o branco, a menina e o menino. Esse jogo permite a transgressão de códigos sociais e a conseqüente quebra de barreiras intelectuais e sentimentais que limitam a liberdade e o prazer que a criança pode experimentar ao dar vazão às suas fantasias e reflexões:
Menina pode brincar de ser o rei? Menino pode ser bruxa? Como vai pintar a boca de palhaço sem usar batom? Posso ser a madrasta ou a bruxa toda vez que eu quiser? Por que a Cinderela, que é bela, sofre muito? Por que o trabalho é chato? Por que pobre passa fome e não pode casar com o príncipe? Por que a bruxa quer matar sua filha? Por que a criança é abandonada na floresta pelos pais para morrer de fome e sede? Por que o príncipe é sapo? Tenho que beijar esse sapo nojento pra que ele vire um belo príncipe? Por que a Moura Torta é má, se é pobre e sofre também? Por que Chapeuzinho vai sozinha pra floresta? Por que arrepio de medo e prazer quando o Lobo fala que quer me olhar melhor, me ouvir melhor, me cheirar melhor?
Ao dramatizar em grupo a história fantasiosa, a criança vivencia questões complexas para as quais talvez só obtenha respostas ao amadurecer. Mas, no presente da infância pequena, vai se aparelhando para compreender com alegria as respostas que o mundo dá e lhe responder de volta, pois aprendeu pelo lúdico jogo do teatro a argumentar.
A dinâmica da prática teatral faz com que a riqueza das idéias embutidas nos contos de fada ganhe vida através do exercício lúdico da teatralidade. A magia traz o passado para o presente e a criança vai recolhendo fragmentos desse passado, colecionando-os e preparando-se para compreender a noção benjaminiana do despertar, isto é, “juntar energia suficiente para confrontar o sonho e a vigília e agir, em conseqüência, sobre o real não só pela força da imaginação pessoal, mas também pela força da ação coletiva” (Gagnebim, 1994, p. 90). A prática de teatro na Educação Infantil prepara a criança para compreender o mundo, unindo-a ao primitivo. O teatro pode ser a ponte.
2.3
DIÁLOGO III - Uma Conversa com Benjamin sobre o Teatro Infantil Proletário
Benjamin acreditava que a educação partidariamente planejada, seja ela burguesa ou proletária, não obtém nenhum efeito realmente substancial sob a criança, que pode apenas repetir frases que lhe são impostas a respeito dos mais variados assuntos, sem com elas realmente formar sua subjetividade.
Mas a criança pequena deveria ser educada proletariamente, isto é, adquirindo desde cedo consciência de classe através de uma pedagogia que atuasse através daquilo que é verdadeiro para a infância.
A verdade poderia ser encontrada no contexto que envolve a criança, expresso no campo do teatro, porque para Benjamin (1984), este é o lugar onde a vida pode ser expressa em sua totalidade, embora delimitada e emoldurada pelos limites do palco. Como a educação da criança exige uma abrangência que envolve toda a sua existência e, no caso da educação proletária, um terreno delimitado, é nos limites do teatro infantil proletário que pode ocorrer uma educação dialeticamente determinada.
Em oposição ao sentimento de medo nutrido pela burguesia em relação ao teatro, principalmente sobre os seus efeitos na educação das crianças, Benjamin (1984) considerava que o teatro infantil proletário poderia ser uma forma de organizá-las para “a possibilidade de ver a força mais poderosa do futuro ser despertada nas crianças através do teatro” (p.85).
Na contemporaneidade torna-se um tanto obsoleto ouvir-se falar de “teatro infantil proletário” diante dos fatos históricos recentes, como a falência da União Soviética e seus satélites, a adesão dos antigos regimes comunistas europeus ao sistema capitalista, a globalização e o neoliberalismo que ocupam de forma quase hegemônica corações e mentes de muitas sociedades, a perene injustiça social que
assola em especial o Terceiro Mundo, consubstanciada na miséria, no racismo e na violência.
Portanto, é preciso contextualizar as afirmações de Benjamin como uma reação a ascensão nazista ao poder em 1933 e seu conseqüente exílio; como uma forma de lutar contra a destruição da memória coletiva e de preservar a maneira própria da criança ver o mundo, sua sensibilidade e valores; como uma forma de estabelecer a cultura da criança face à cultura do adulto, preservando a plenitude e a integridade da infância diante do assédio da ideologia burguesa.
A luta de Benjamin pela infância continua a fazer sentido nos dias de hoje, principalmente para uma educação que se preocupa com a formação do sentimento de cidadania a partir do nascimento e que se organiza para oferecer os meios pelos quais a criança pequena pode tomar posse da cultura que pulsa ao seu redor.
Mas não podemos esquecer que, mesmo uma educação de vanguarda, é exercida num meio burguês sujeito a todas as influências neoliberais que predominam no mundo de hoje. Portanto, dialogar com Benjamin tentando iluminar o caminho tendo como lanterna os conhecimentos desenvolvidos por este pensador, é oportuno.
Mas como Benjamin (1984) organiza o “teatro infantil proletário”, que para ele é “fogo no qual realidade e jogo fundem-se para as crianças, imbricam-se tão profundamente que sofrimentos simulados podem converter-se em autênticos, surras simuladas em reais”? Em primeiro lugar, a encenação final de uma peça infantil não possui tanto valor quanto às tensões que surgem durante a execução do trabalho teatral coletivo, sendo elas que possuem o caráter educativo.
O papel do educador no teatro infantil proletário não é o de promover a educação moral das crianças ou prepará-las para exercer um papel na sociedade burguesa, mas sim de incentivá-las a se exercitarem coletivamente, de se envolverem pelos conteúdos propostos pelo educador, mas deixando que elas mesmas descubram as diversas tarefas e associações possíveis decorrentes dessa atividade lúdica coletiva. Para Benjamin (1984), é na coletividade infantil que podemos encontrar a “atualidade da criação” e a irradiação das mais poderosas forças.
O educador de teatro deve dar especial atenção à observação, ponto de onde começa a educação, e a partir do qual, ele pode capturar o “gesto infantil”, 27
percebido como sinal emitido da infância e que traduz esse mundo ao adulto, emitindo o revolucionário “sinal secreto” do vindouro. Para Benjamin (1984), o gesto infantil é “uma inervação criadora em correspondência precisa com a receptiva” (p.86). A tarefa do educador é “libertar os sinais infantis do perigoso reino mágico da mera fantasia e conduzi-los à sua execução nos conteúdos” (p. 86).
Um papel especial é reservado à improvisação das crianças, de onde surge o gesto infantil, sendo o teatro o sintetizador desse gesto, que aparece de repente, uma única vez. Para Benjamin, “todo desempenho infantil orienta-se não pela ‘eternidade’ dos produtos, mas sim pelo ‘instante’ do gesto. O teatro, enquanto arte efêmera, é infantil” (p.87).
É pela improvisação que a criança pode exercitar sua criatividade durante a encenação libertando-se do jugo pedagógico através do jogo. Mas isso não quer dizer que a criança não possa ter contato com os conflitos que ocorrem no mundo real, sendo necessário apenas que sejam apresentados de forma lúdica, garantindo assim a adesão da criança ao jogo teatral, até porque para Benjamin (1984), “a encenação é a grande pausa criativa no trabalho de educação”.
A nossa prática teatral apresenta algumas características que se aproximam do “teatro infantil proletário”. Nossa preocupação não é formar indivíduos para a sociedade burguesa através da inculcação de valores morais, ou valorizar a racionalidade em detrimento do sentimento, ou apenas aculturar as crianças concebendo-as como tábula rasa que precisam aprender a se comportar apropriada e educadamente.
Através da dramatização de contos de fadas, queremos propiciar a livre expressão da criança, favorecendo o aparecimento do gesto infantil benjaminiano, quando ela improvisa a história assimilada coletivamente depois da apresentação da narrativa do conto, que é uma forma literária muito valorizada por Benjamin, pois contém em si as reminiscências da construção da realidade atual.
O universo do conto revela o cotidiano cruel do mundo numa perspectiva oposta à romantização burguesa, apresentando ludicamente tanto a beleza quanto a perversidade do mundo, sem fantasias que sepultem sob uma camada de hipocrisia e moralismo, a história da construção da sociedade, de suas relações, e a possibilidade de modificá-la. O conto e a prática teatral infantil valorizam a magia na constituição da cultura da criança.
2.4
DIÁLOGO IV - O Círculo Encantado de Bakhtin: Teatro, Educação e Vida
O ato estético engendra a existência num novo plano de valores do mundo; nasce um novo homem e um novo contexto de valores - um novo plano do pensamento do homem sobre o mundo.
(Mikhail Bakhtin)
O teatro é uma forma de arte que se constituiu ao longo da história refletindo o que diz respeito à forma das sociedades se organizarem e à constituição dos diferentes tipos de sujeito, explicitando conflitos, ideologias, formas de pensar e sentir, costumes, hábitos, mitologias. Pode ser definido como o local da apresentação da condição humana em forma de ação, um elemento eminentemente teatral, ou como “uma pluralidade de códigos, de semióticas (a gestualidade, a cenografia, a música, etc)” (Coelho Netto, 1980, p.12).
Como toda forma artística pressupõe uma linguagem, o teatro procura fazer sentido através de um elemento específico de sua natureza, a teatralidade, isto é, “a produção de forma, de significantes que surgem como um conjunto em cena” (Coelho Netto, 1980, p.21) Portanto, a teatralidade é tudo aquilo que pode se tornar signo, sensação, percepção no momento em que se usufrui da arte teatral.
É justamente essa linguagem específica expressa pela teatralidade que se pretende que a criança pequena se apodere, com o intuito de prover seu desenvolvimento global através da aquisição de conhecimento sensível, capaz de fazê-la criar sentido, elemento imprescindível na união entre arte e vida.
O sentido se forma no encontro de uma subjetividade com outra, gerando uma gama variada de perspectivas de se representar a realidade do mundo, dentro de um contexto coletivo.
O ato de fazer teatro implica disposição para o diálogo: entre o autor e o herói, os atores e os personagens e destes com o público (ouvinte/espectador). Estas relações triangulares estão na base da constituição do teatro como uma arte coletiva capaz de falar ao espírito e ao sentimento humanos.
A importância de se compreender os vários elementos de uma encenação (teatralidade, dramaturgia, expressividade, sentimento, corporeidade) como elos que se interpenetram, influenciando uns aos outros e constituindo a linguagem teatral, nos aproxima do pensamento de Bakhtin para quem “a linguagem nunca está completa, ela é uma tarefa, um projeto sempre caminhando e sempre inacabado” (Jobim e Sousa, 1994, p.100).
A condição de ser inacabado é da natureza da existência humana. Por isso é importante irmos em busca do outro, aquele que pode nos ajudar na tarefa de nos completarmos mutuamente. É pela emoção interior, compartilhada nas vivências sociais, que podemos tentar executar o acabamento.
Para Bakhtin, a atividade estética existe na vida, nas relações sociais, definindo-se como uma atitude ética que funda e revê valores em constante movimento de transformação e acabamento. Ela se completa quando voltamo-nos para nós mesmos, elaboramos o material recolhido dando-lhe forma. “Uma obra de criação verbal (...): guia o processo de identificação e proporciona o princípio de acabamento ao outro” (Bakhtin, 1992, p.47).
O diálogo com Bakhtin se torna importante quando se deseja fundamentar uma prática teatral na Educação Infantil, que tem como características principais o fato de ser organizada e freqüente no currículo da creche Fiocruz e o de unir o conto maravilhoso, utilizado como texto dramatúrgico ao exercício da teatralidade por crianças pequenas, com o objetivo de fazê-las compreender a vida que as cerca, as implicações sociais a que são submetidas desde o nascimento e as diversas culturas e identidades que perpassam o tipo burguês.
Através da atividade estética proposta por esta prática teatral, acreditamos que a criança pode conhecer as relações existentes no mundo, expressas nas aventuras dos heróis dos contos de fadas, conduzindo seu corpo em busca do encontro com a alteridade e constituindo seu imaginário através de imagens estéticas propostas pela narrativa fantasiosa, pelo contato corporal e pela interpretação de ações dramatúrgicas concretas implícitas no fazer teatral.
No texto Arte Y Responsabilidad, Bakhtin defende a idéia de que “Yo debo responder con mi vida por aquello que he vivido y comprendido en el arte, para que todo lo vivido y comprendido no permanezca sin acción en la vida”. Podemos entrever aqui uma questão que é fundamental no pensamento de Bakhtin: “El arte y la vida no son lo mismo, pero deben convertirse en algo unitario, dentro de la unidad de mi responsabilidad”.
A partir dessa idéia seminal, acreditamos que Bakhtin estabelece um papel fundamental para a arte na vida de um indivíduo, como o elemento que pode
ajudá-lo a se constituir como um sujeito responsável tanto consigo mesmo, como com aqueles com os quais convive no meio social. O outro torna-se um elemento constitutivo desse indivíduo e vice-versa.
Mas de que arte estamos falando aqui? Da arte que se responsabiliza pela ação humana na vida e que reflete essa ação em seus elementos constitutivos, colaborando na formação da subjetividade humana e na criação de um sentido para a vida cotidiana.
Podemos supor então que usufruir da arte ou mesmo vivenciá-la, pode se constituir num ato ético, de comprometimento com a melhoria das condições de existência no mundo, levando o ser humano, pela sensibilização, pela reflexão e pela linguagem a se relacionar com a alteridade, estabelecendo uma relação dialógica, que é uma categoria fundamental no pensamento de Bakhtin.
A atividade estética cumpre a tarefa de reunir no interior do indivíduo a dispersão do sentido e do efêmero do mundo, construindo através da emoção e da razão um significado para o acontecimento existencial, o que conduz o indivíduo, em comunhão com o outro diferente dele, na direção de um acabamento, de um completar-se no espaço, no tempo e no sentido. Tarefa essa que, embora construída na relação, só pode ser finalizada quando esse indivíduo retorna ao seu interior e elabora todo o sentido captado no mundo (Bakhtin, 1992, pp. 204-205).
A convivência de sujeitos singulares que se relacionam, provocando uma interdependência de pontos de vista e a construção de uma consciência compartilhada a respeito do mundo, pode auxiliar o indivíduo a alcançar um modo de existência mais solidário, em que a aventura árdua de adquirir conhecimento, possa ser uma experiência única e ao mesmo tempo comunitária e no qual a arte exerça um papel realmente importante na constituição da subjetividade desse indivíduo e não seja mais um mero adorno divertido, um passatempo pequeno-burguês.
Bakhtin (op. Cit.) construiu grande parte de sua teoria esmiuçando a relação do sujeito com a obra de criação verbal (a estética). Mas o que ele nos fala a respeito da representação teatral, que aqui nesse trabalho constitui-se em nosso objeto de investigação?
Para Bakhtin (op. Cit.), apenas quando o espectador está presente é que o teatro se torna uma atividade artística relevante e a representação se torna arte, valorizando mais uma vez a categoria de uma consciência externa que dá acabamento e sentido à atividade estética.
A representação infantil, que a princípio não tem preocupação com a construção interior do personagem, é comparada por Bakhtin (op. Cit.) com o devaneio, com o sonho, com o desejo de participar de uma atividade prazerosa provocada pelo interesse lúdico de viver diferentes vidas.
Neste ponto é importante definirmos melhor a diferença entre a dramatização espontânea vivida pela criança durante suas brincadeiras imaginativas e a representação teatral.
Considera-se que a criança ainda não possui maturidade psicológica suficiente para compreender a vida interior de um personagem. Ela imita as ações exteriores, interessando-se pelas narrativas aventurosas, embora o faça com uma verdade muitas vezes invejada pelos profissionais do teatro. Diferentemente do ator, que compreende a distância significativa entre a sua própria vida e a do personagem, o que provoca a criação de uma aparência de realidade através de seu físico e de sua subjetividade.
Ambos, o ator e a criança, querem recriar o mundo e as relações humanas nele estabelecidas, embora com propósitos diversos. O ator quer metamorfosear-se, transformar seu corpo e emprestar suas emoções ao personagem para poder tornar verdadeira sua representação, tentando afetar o espectador pela ilusão criada no palco.
Bakhtin (op. Cit.) se pergunta se essa atividade é um verdadeiro ato de criação estética. Não é enquanto o ator procura encarnar o personagem, mas torna-se um, quando procura distanciar-se dele (herói) exercendo, junto com todos os envolvidos na atividade teatral, o papel de autor, sempre levando em conta o todo artístico criado para a peça, procurando provocar a consciência do espectador para que este possa agir no mundo e modificá-lo.
A criança procura mimetizar-se com o mundo ao redor. Ela não tem pudor em se transformar em animais, plantas, personagens fantásticos. Mas ao mesmo tempo existe algo na representação infantil do mundo que implica um certo distanciamento. Ela se envolve totalmente com seu gesto dramático no momento mesmo que o cria, mas também é capaz de interrompê-lo com rapidez no instante em que é perturbada, demonstrando profunda consciência de que apenas brinca de ser aquilo que efetivamente não é.
Entretanto, por ser ainda imatura, ela não desenvolveu a consciência (exotopia) necessária para poder valorizar a alteridade e poder distanciar-se da realidade do mundo, acabando por, muitas vezes, confundir-se com ela. A criança não está preocupada em modificar essa realidade, que às vezes sequer chega a compreender, embora deseje profundamente alcançar essa compreensão, para poder enfim chegar à maturidade sonhada.
A dramatização espontânea pode ser seu jogo preferido, pelo qual ela vai apoderar-se de alguns mecanismos para desenvolver suas habilidades expressivas e estabelecer suas relações sociais, aprendendo a agir no mundo em constante convívio com o outro, ao mesmo tempo que amadurece e vai adquirindo conhecimento através de um mecanismo lúdico e poderoso como a dramaticidade que lhe permite viver várias vidas numa só, a sua. Para Bakhtin “a arte possibilita-me viver várias vidas em vez de uma só, e com isso enriquecer minha experiência pessoal, possibilita-me participar internamente de outra vida, em nome do significado que ela comporta” (1992, p.96).
Em nossa prática teatral na Educação Infantil, queremos aproveitar essa aptidão da criança pela dramatização espontânea para provocar seu interesse pelo jogo dramático que, acreditamos, pode ajudá-la a constituir sua linguagem, pela exposição à diversas narrativas fantasiosas que podem ser dramatizadas.
Concomitantemente, a criança poderá desenvolver o gosto pela exploração de sua expressão corporal (gestual e vocal) e vivenciar uma experiência criativa e lúdica no seio de uma turma. Ela poderá descobrir que sua expressividade pode ir além da linguagem verbal, enriquecendo sua experiência pessoal através de uma atividade teatral organizada.
Outro ponto de contato entre a teoria de Bakhtin e a prática teatral passível de ser exercida na Educação Infantil é quando ele define o caráter sociológico da arte. Originada na vida, a ela retorna, propondo alternativas, numa perspectiva estética, crítica e social, já que “todos os produtos da criatividade humana nascem na e para a sociedade humana” (Bakhtin, s/d, p.2) Podemos esmiuçar mais esta questão, ao ouvirmos Bakhtin a respeito da “fala da vida e das ações cotidianas” (Bakhtin, s/d, p.4) que aparece enunciada no discurso artístico e vice-versa, pois também a fala artística se encontra enunciada na vida social.
Para a criança, que ainda está se apoderando do discurso verbal, pode ser interessante o exercício de modos de enunciação através do fazer artístico
(teatral), pois o discurso poético, carregado de poder semiótico, pode iluminar sua fala, acostumando-a a fazer constantes trocas simbólicas entre a arte (narrativa fantasiosa + teatralidade) e a vida, tão cheia de mistérios e recantos escuros, discursos ininteligíveis, fatos inexplicáveis, que a arte pode ajudar a criança a compreender.
O presumido, o horizonte extra-verbal, aquilo que a criança vive nos atos sociais, no seio da família, o que ela deseja, ama, quer (Bakhtin, s/d, p.6), pode ser perfeitamente afetado pela ação estética, vivida no contexto da Educação Infantil, ou mesmo em sua vida cotidiana fora do âmbito escolar.
Quando no ambiente educacional lhe é oferecida a oportunidade de vivenciar o ato estético e de aprender pela arte que seus atos são objeto de crítica (o outro, na relação, completa os vários sentidos possíveis de seus atos, exigindo reflexão e auto-reconhecimento) e que suas atitudes possuem uma história comum expressa tanto na narrativa fantasiosa quanto na realidade cotidiana, formando uma espécie de coletividade compartilhada de significados, então a criança pode começar a formar o que Bakhtin (1992) chamou de exotopia, isto é, a consciência da alteridade na vida.
Devemos levar em conta aqui a possibilidade da criança acostumar-se com a figura do espectador, que pode ser um educador e, principalmente, as outras crianças com as quais compartilha a atividade teatral e que podem lhe dar suporte emocional e afetivo e providenciar a oportunidade de acabamento, pois podem ver aquilo que ela não vê, construindo um conjunto de significados comuns. Isso pode ser considerado um ato ético (uma categoria bakhtiniana) pela oportunidade de construção coletiva de um conhecimento sensível que implica a atuação de um outro que compartilha um acontecimento da existência da criança.
A relação triangular eu-herói-ouvinte é constantemente exercitada durante a atividade, pois a criança se lança em busca da fantasia, do encantamento, da emoção, da cultura proposta pelo gesto teatral. Ela gosta de se metamorfosear nos heróis querendo “revestir de carne externa essa personagem principal da vida e do devaneio” (Bakhtin, 1994, p.49), cumprindo no cotidiano escolar a principal tarefa do artista: recriar a vida, através do corpo e do sentimento, propondo uma nova visão, ou melhor, uma revisão crítica e emocionada dos erros e acertos cometidos pelas sociedades no já vivido.
A relação criada pelo exercício do ato teatral é eminentemente dialógica, pois ao dramatizarmos precisamos do olhar do outro, de sua visão, de seu saber, de sua ação estética, de uma constante troca emocional que cria um ambiente em que compreender implica responder ao outro e completar sua visão de mundo.
Mas ao estabelecermos essa prática teatral organizada, estamos indo um pouco além das fronteiras do jogo dramático, que pertence exclusivamente à livre imaginação infantil. Ela é sustentada na livre dramatização de contos de fadas, usados como textos através dos quais a criança poderá exercitar a teatralidade.
Alguns autores consideram esses contos uma literatura enganadora pois mistificam as relações sociais, embora utilizem uma linguagem apropriada para o entendimento da criança, que necessita deles para tentar compreender o mundo que a cerca. Os contos possuem uma profunda riqueza antropológica, traduzindo para a criança modos de existência que se constituíram no passado, mas que estão presentes na atualidade.
A partir da fruição da narrativa dos contos de fadas, a criança pode começar a construir no presente da sua existência, pelo encantamento e pela fantasia, a memória do futuro.
Em nosso ponto de vista, os contos de fadas constituem-se como obra de arte, literatura da mais alta qualidade, ciência que “possui maior espaço de pesquisa e de aproximação humana. Ciência da psicologia coletiva, cultura do geral no Homem, da tradição e do milênio na atualidade, do heróico no cotidiano, é uma verdadeira História Normal do Povo.” (Cascudo, 2001, p.11).
Para Bakhtin (1992), a visão artística se organiza ao redor da vida do ser humano, constituindo seu ambiente de valores através das relações estabelecidas por ele no tempo, no espaço e no sentido, criando sua realidade estética. Portanto, concebemos o herói do conto de fadas como o outro artístico, que diferenciando-se do outro-criança, pode lhe conferir acabamento, quando a criança, através do exercício do jogo dramático, (sendo sua natureza aleatória alterada pela indução do educador ao exercício da prática teatral organizada) aproxima-se do artista (o ator) que “sabe situar sua atividade fora da vida cotidiana... e encontrar o meio de aproximar-se da vida pelo lado de fora...O ato estético engendra a existência num novo plano de valores do mundo; nasce um novo homem e um novo contexto de valores – um novo plano do pensamento do homem sobre o mundo” (Bakhtin, 1992, p. 205).
Não é nosso objetivo induzir a criança a “encarnar” o herói do conto de fadas, mas através do jogo dramático exercitado em conjunto, em que podemos ter um grupo de crianças representando um único personagem ao mesmo tempo, queremos que a criança possa adquirir conhecimento, ao mesmo tempo em que constrói referências dos valores que ajudaram a estabelecer a sociedade humana da forma que conhecemos.
No interior dos contos de fadas encontramos valores que se referem ao acontecimento da vida, mesmo que ao analisarmos sua linguagem fantasiosa possamos considerá-la inverossímil, mistificadora, como defendem alguns. A linguagem do conto é encantadora, construída apropriadamente para falar ao interior da alma infantil, obedecendo apenas às leis da verossimilhança da ficção. Contudo, está ligada ao que realmente acontece no mundo.
Quando João e Maria são abandonados à sua própria sorte, porque os pais não mais suportam a vida de necessidades que levam, podemos nos lembrar das milhares de crianças abandonadas que vivem pelas ruas de uma cidade como o Rio de Janeiro. Quando através de estratagemas elaborados pelas próprias crianças, utilizando sua sabedoria forjada na luta pela sobrevivência, João e Maria retornam para casa uma vez ou enganam a bruxa que deseja devorá-los, podemos nos lembrar das mesmas crianças de rua cariocas que fazem malabarismos nos sinais para sobreviver. Sentimos então nos contos de fadas “a resistência da realidade do acontecer da existência” (Bakhtin, 1992, p. 213).
Ao dramatizarmos os contos de fadas no exercício dessa prática teatral organizada na Educação Infantil, observamos algo da técnica de teatro épico. O estímulo à presença de muitos narradores (crianças e educador), que exploram diferentes pontos de vista a respeito da mesma narrativa, quebra a sensação de “ilusão”, própria do teatro aristotélico, aproximando o efeito obtido da técnica de “distanciamento brechtiano”.
Neste ponto é possível encontrarmos pontos de contato entre o teatro de Brecht e o que falava Bakhtin a respeito da arte dramática, principalmente no objetivo comum expresso por ambos de estimular a formação de uma consciência que seja modificadora do presente e que, ao compartilhar a construção de significados através da estética, possa tanto constituir um novo ser humano, como realizar a tarefa de reformar a sociedade pela crítica a valores arcaicos e à atitudes autoritárias, através do reconhecimento do valor dos sentidos compartilhados em sociedade e principalmente na vida.
Acreditamos que aqui reside o poder pedagógico do Teatro: na possibilidade de afetar comportamentos, atitudes, modos de pensar, através de uma atividade estética coletiva que obriga, por sua própria natureza, a constante troca de sentidos entre seus participantes. Talvez resida aí também a contribuição da arte na possibilidade de mudar o mundo que conhecemos: possibilitar acesso a formas de conhecimento sensível, realizando uma espécie de alfabetização sentimental, que permita a criança se dar conta de que ela se constitui nas relações sociais, que não está isolada num mundo de indivíduos isolados, que o que ela pensa, sente, já foi pensado, sentido por outros da comunidade humana.
Pelo contato com a diversidade contida nas narrativas fantasiosas (compilação de narrativas das relações humanas, expressas em linguagem encantada, produto da oralidade popular e da história de lutas sociais), aliada ao exercício da teatralidade que também pressupõe a troca afetiva, a ressignificação de modos de agir, a reflexão através do sensível, talvez a criança possa compreender que a arte não é um bem inacessível, mas um elemento comum da vida, que está bem aqui, ao alcance de sua mão e do qual ela pode se utilizar, recuperando a centralidade e o valor da palavra afetada pelo sensível, existente no fluxo da relação com a diversidade.
A criança pode rever a contrapelo a história na qual é lançada desde o nascimento, mas na qual pode influir ao se apossar do conhecimento, do signo lingüístico. Pode compreender (esse movimento mágico e intelectual, que implica algo de pedagógico) que não é possível viver na selva da vida, sem se comprometer em “ser para o outro”, esse que pode nos dar o acabamento, que nos completa, colaborando na tarefa do nosso próprio auto-conhecimento e em nossa consciência social.
Pelo gesto e pela entoação, provocados pelo interesse em interpretar teatralmente os personagens da narrativa fantasiosa dramatizada, a criança se aproxima do que Bakhtin dizia sobre estar esses dois elementos (gesto/entoação) impregnados “de uma relação forte e viva com o mundo externo e com o meio social” (Bakhtin, s/d, p. 9) já que “residem aqui as forças da Arte responsáveis pela criatividade estética e que criam e organizam a forma artística.”( Bakhtin, s/d, p.9)
O que afinal podemos desejar com o teatro aliado à dramatização dos contos de fada na Educação Infantil?
Talvez o que mais queiramos seja afetar a fala interior infantil para que, ao comunicar o que pensa e sente, ao procurar o contato com o outro, com o diferente, a criança crie consciência de si e deste outro e, mesmo estando ainda imatura para compreender em toda a sua extensão e profundidade o valor social e ideológico da arte, ela possa cantar, dançar, criar, teatralizar, sabendo que em seu poder está o mundo novo revigorado, renascido, na consciência de cada uma das crianças.
(PUC-RIO certificado 0212103/CA)
Fundamentação Teórica
Qual a necessidade da arte, em especial o teatro, na Educação Infantil? De que forma a arte sintética do teatro pode assimilar outras linguagens artísticas (Artes Plásticas, Dança, Música, Literatura) para fazer com que a criança se aproprie do patrimônio cultural estabelecido ao longo da história da humanidade? É possível à criança pequena, ainda em processo de construção da linguagem, se apropriar do Teatro e através dele desenvolver sua potencialidade expressiva e cognitiva? Como levá-la a compreender as relações sociais nas quais se encontra inserida, através da dramatização de histórias, contos de fadas, poesias e fazê-la vislumbrar um sentido para a existência humana numa sociedade capitalista, de consumo e extremamente individualista? Como aproveitar a sua natural tendência em acreditar na magia, no encantamento, no misterioso para estabelecer no imaginário infantil o poder da arte como espelho da natureza e do homem, artífice desta construção unicamente humana, a cultura?
Este capítulo tenta responder a estas questões em diálogo com alguns autores cujos conceitos foram organizados em cinco diálogos que tentam fundamentar a prática teatral, exercida cotidianamente na creche Fiocruz, que sedimenta sua prática pedagógica numa visão de criança cidadã
1.
2.1
DIÁLOGO I - Do Primitivo à Criança Contemporânea: O Teatro Como Ponte (Uma Conversa com Ernst Fisher)
Assim que o príncipe montou a cavalo e viajou, a rainha-velha começou a ter vontade de beber sangue e comer carne humana. Ficou mesmo bruta e não podendo passar o desejo, chamou o mordomo e mandou que lhe servisse Belo-Dia, com bom molho, no almoço do dia seguinte.
(Câmara Cascudo).
1 Entendemos por criança cidadã o que fala o Art. 3º do ECA. “A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais, inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral do que trata essa Lei, assegurando-se-lhes por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental e moral, espiritual e social, em condições e de dignidade.” 18
Neste primeiro diálogo, estabelecemos uma conversa com Ernst Fischer a partir de sua obra “A Necessidade da Arte”, tentando delinear o efeito da Arte na Educação Infantil a partir da compreensão de sua natureza, de sua gênese e da ação por ela exercida na construção de uma consciência estética, que faça a criança se apropriar de seus meios criativos para compreender os processos que regem o mundo. A partir dessa compreensão, levá-la a atuar criticamente em relação a esses processos, com uma visão mais social, sensível e procurando integrar o indivíduo à coletividade.
Para tanto, podemos utilizar a visão de Fischer que teoriza sobre a necessidade da arte a partir da idéia de uma raiz comum da qual se originaram a ciência, a religião e a própria arte: a manifestação de uma forma primitiva de magia no cotidiano cultural do homem primitivo com o intuito de tentar dominar o mundo real inexplorado.
Com o progressivo desenvolvimento dessas três formas de conhecimento humano, ocorre a diversificação entre elas para atender as necessidades de sociedades mais complexificadas e que passam a reservar à arte o papel de clarificar o ser humano a respeito das relações sociais que vão sendo estabelecidas, iluminar sensivelmente o seu raciocínio a fim de auxiliá-lo a reconhecer e transformar a realidade social a sua volta. A arte ajuda o ser no processo de identificação com a vida do outro, incorporando em si aquilo que ele ainda não é, mas que pode vir a ser: um ser humano “total”.
Fisher associa a idéia do nascimento da arte com o do trabalho humano coletivo a partir da concepção da ferramenta como utensílio que permitiu ao homem primitivo distanciar-se da natureza, lançar-lhe um olhar crítico, amedrontado, mas que procurava dominá-la magicamente.
A ferramenta tornou o homem um ser que libertou sua razão criadora para auxiliá-lo na tarefa de adquirir consciência de estar no mundo, provocando a sua ação consciente.
Essa visão em que o primitivo, a partir de uma vivência inicial colada à natureza e por necessidade de subsistência, desenvolveu através do corpo, preferencialmente da mão, todo um sistema cultural ao criar o instrumento de trabalho antes mesmo de poder raciocinar sobre a diversidade de seu uso, tenta recolocar a importância da corporeidade, do sentimento face ao pensamento que “não passa de uma forma de experimentação abreviada que se transfere das mãos 19
para o cérebro, de modo que os resultados das experimentações precedentes deixam de ser “memória” e passam a ser “experiência” (Fisher, 1971, p.27)
Para Fischer, o trabalho foi criador do pensamento, do fazer consciente e do ser consciente, gerando a linguagem, fruto de variadas denominações sensoriais que ajudavam o primitivo a diferenciar-se da natureza ao seu redor.
O encantamento proporcionado pela imitação do mundo exterior tornou-se um fator essencial de constituição da linguagem, levando-a a ter “uma dupla natureza como meio de comunicação e expressão, imagem da realidade e signo para ela, percepção “sensorial” do objeto e abstração” (Fischer, 1971, p.34), e que além disso transmitisse as sensações e experiências que a natureza à sua volta lhe proporcionava. Aos poucos, a linguagem vai ocupando um lugar central na concepção de cultura e de arte.
Para o primitivo, natureza, vida, trabalho, linguagem, cultura, arte, comunicavam-se através do ritmo ditado pelas atividades de sua vida cotidiana. Portanto, a necessidade da arte nunca tinha sido questionada até então, pois através de seus produtos: a canção, a poesia, a mimesis, tornava-se a sua própria razão de ser, pela importância em organizar o grupo social em torno do trabalho coletivo adquirindo força, magia e trazendo mais vontade ao grupo para realizar a tarefa a que se obrigava, pois essa magia representa o que mais de verdadeiro se busca na arte (Fischer, 1971).
A gênese do teatro é semelhante. Originou-se das cerimônias religiosas que visavam alegrar aos deuses da natureza, para que enviassem boas colheitas, celebrando o encontro entre a mãe terra e a semente, bebendo o vinho e promovendo o amor. A comunicação entre as pessoas, o ritmo das danças, levaram ao surgimento da poesis e às primeiras formas organizadas de manifestações teatrais de que se têm notícia.
O processo de metamorfose adquiriu caráter mágico, divino, para que o primitivo pudesse agradar aos deuses, encantando a natureza e levando-a à transformação, para que garantisse a retribuição ao esforço do trabalho coletivo. Sendo assim, “a Arte era um instrumento mágico e servia ao homem na dominação da natureza e no desenvolvimento das relações sociais” (Fischer, 1971, p. 44).
A arte passou a conferir poder ao primitivo sobre a natureza e os outros homens, tornando-se um elemento indissociável da realidade cotidiana, 20
derivando-se das manifestações ritualísticas até alcançar formas mais elaboradas de encenação artística.
Qualquer criança, ao nascer, traz em si o passado primitivo do homem, reproduzindo a mesma trajetória pelo qual ele evoluiu até se erguer sob os dois pés. A criança nasce primitiva e ao sofrer o processo de educação no seio de uma sociedade, assimila as regras sociais e culturais nos quais vai se desenvolvendo. O interesse da prática teatral na Educação Infantil é recuperar, junto com a criança pequena, por ela e para ela, o sentimento ancestral de magia e encantamento que a arte apresentou na constituição da noção de humanidade, para que ao adquirir o olhar estético, a criança possa vivenciar o mundo que a rodeia com um profundo sentimento renovador e crítico que, a qualquer época, é imprescindível para a evolução do que conhecemos hoje como uma sociedade humana.
2.2
DIÁLOGO II – A Importância dos Contos de Fadas (Conversando com Bettelheim)
Nesse momento chegou uma escrava negra, cega de um olho, a quem chamavam a Moura Torta. A negra baixou-se para encher o pote com água do rio mas avistou o rosto da moça que se retratava nas águas e pensou que fosse o dela. Ficou assombrada de tanta formosura. (Câmara Cascudo)
O segundo autor que nos ajuda a fundamentar nossa prática teatral, Bruno Bettelheim, trabalha com a narrativa fantasiosa (o conto de fadas, o conto popular), tentando estabelecê-la como uma possibilidade cognitiva concreta (embora fantasiosa) para que a criança possa alcançar um objetivo fundamental na sua constituição: construir significado para a vida que pulsa ao seu redor e dentro dela, através do enriquecimento de nossas capacidades interiores, como a imaginação, as emoções e o intelecto.
Concomitantemente, o conto de fadas ajuda a criança a conhecer a história, muitas vezes oculta, da constituição das relações sociais do mundo, tal como o conhecemos hoje, assim como as diferentes maneiras pelas quais a humanidade age neste mundo na eterna luta pela vida, construindo sociedades e as destruindo, estabelecendo sistemas de governo e estilos de vida. 21
O primeiro grupo social de uma criança2 é, idealmente, a família que possui histórias que a ajudam a se constituir de diferentes maneiras possíveis, transferindo-lhe capital cultural e social estabelecendo um ponto de partida que pode ajudá-la a se desenvolver dentro de um sistema de relações sociais que situa sua família numa classe hierarquicamente estabelecida.
As narrativas fantasiosas, discriminadas pelo mundo adulto pelo epíteto “historinha para criança” (e o diminutivo carinhoso, evidencia todo o demérito que lhe é imposto), ao fazer parte do mundo infantil no meio escolar, colaboram para somar valor ao capital cultural da criança pequena, ajudando-a a explorar suas potencialidades cognitivas e expressivas. São essas histórias, lançando mão de signos poderosos consubstanciados nas imagens da bruxa, madrasta má, gigante poderoso, fada boa, criança frágil, inteligente e corajosa, que revelam a história individual e social do ser humano, explicitando crueldades, injustiças e lutas necessárias para sobreviver nesse mundo. Elas possuem o poder de despertar e atrair a curiosidade infantil, sem abrir mão de seu potencial de entretenimento, ajudando a criança a desenvolver seu intelecto, a compreender suas emoções internas, profundamente conflituosas, a reconhecer suas dificuldades e a sugerir soluções (Bettelheim, 1996).
Outro objetivo da narrativa e da dramatização dos contos de fadas, reside no fato de ele permitir à criança “construir um ligação verdadeiramente satisfatória com outra pessoa” (Bettelheim, 1996, p. 19). Na grande maioria dos contos de fadas o herói precisa sempre encontrar um outro que o ajude a atingir um estágio mais avançado de conhecimento e de amadurecimento. E quando esse objetivo é alcançado na narrativa, constitui-se afinal um exemplo de sentido para a vida individual do herói e, conseqüentemente, para a criança.
Ao longo da história do exercício dessa prática teatral, tornou-se comum a dramatização de uma gama variada de narrativas, desde as mais tradicionais de origem européia, passando por outras de diferentes nacionalidades numa viagem pelo mundo que se mostrou de uma riqueza cultural ímpar, até chegar as variantes nacionais coletadas por Câmara Cascudo no seio do folclore brasileiro. Pôde-se observar que as características fundamentais de uma boa narrativa estão presentes em muitas delas, independente de sua nacionalidade ou especificidade: dilema existencial breve e categórico; simplificação de situações; tipificação dos personagens; onipresença do bem e do mal, com a garantia da vitória do bem através da identificação com o herói (Bettelheim, 1996).
A narrativa fantasiosa está profundamente relacionada com o passado da humanidade que, através delas, revela seu rosto repleto de cicatrizes à criança contemporânea, fazendo uma ponte através do tempo com suas questões internas, assegurando-lhe caminhos possíveis, já trilhados por outros, para solucionar seus problemas complexos, suscitados por uma sociedade orgulhosa de seu poder tecnológico que lhe garante poder, conforto, progresso.
Queremos acreditar que a escolha do conto de fadas como dramaturgia básica de uma prática teatral, que pretende estabelecer o jogo do teatro no cotidiano escolar infantil, insere-se numa perspectiva benjaminiana que concebe a Infância como “historicamente construída”, imaginando-a como a fase da vida capaz de ser crítica da cultura do mundo adulto.
Essa dramatização se torna “experiência”, possibilitando que uma aventura narrada e vivenciada coletivamente na ficção, faça parte do que é vivido pela criança, enraizando-se na realidade, refletindo suas contradições, iluminando a estrada da contemporaneidade e o que pode acontecer com a subjetividade infantil ao se defrontar com ela, revelando a história humana através da Infância, estabelecendo-a como “um modo privilegiado de percepção” (Gagnebin, 1994, p. 86) e fazendo-nos perceber a criança como aquela que pode nos ensinar a criar, sentir, viver melhor (Kramer, 2003).
Outro objetivo da prática teatral em questão, se sustenta na possibilidade de realizar a alfabetização em linguagens artísticas e a iniciação em comportamento estético (Gagliardi, 1992) da criança pequena e de especificar o papel do teatro na educação como um veículo amplificador da experiência cognitiva e emocional, através de um trabalho pedagógico específico (Gagliardi, op. Cit.), auxiliando no processo de constituir a categoria “Cultura da Infância” como contraponto aos pressupostos de uma sociedade fundamentada na primazia da razão, como único meio de soluções de problemas, do trabalho, prioritariamente visto como produtor de bens que sustente a qualquer preço o modo de vida capitalista, e de depredação da natureza em nome do consumo, razão de ser do estilo individualista e competitivo de existência contemporânea.
23
O esgotamento das fontes de recursos naturais do planeta, a superpopulação, a urbanização desenfreada dos grandes centros, o neoliberalismo econômico3 em oposição ao Estado de Bem Estar Social, são alguns dos fatores que tornam inviável a idéia de desenvolvimento infinito capaz de gerar trabalho para todos, sustentado por um conceito de educação formador de mão de obra capacitada que sustente a engrenagem capitalista.
Acreditamos que a prática teatral em questão, visa colaborar com uma concepção de educação que possibilite a criança pequena desenvolver um tipo particular de conhecimento, o sensível, que colabore com sua iniciação no mundo cultural através da apresentação do que de mais significativo possa haver na cultura do país e do mundo, usando “linguagens estéticas” que estimulem a vivência de experiências sensoriais e expressivas, adaptando esse material às necessidades específicas do palco e do entendimento da criança, levando-a a se reconhecer como um vasto campo de possibilidades na interação com o outro.
Para executar essa tarefa, partamos do princípio de que não devemos subestimar a capacidade intelectual e corporal da criança, achando-a incapaz de apreender a Literatura, as Artes Plásticas, a Música, o Teatro que lhe oferecemos. Entretanto, tudo precisa ser analisado e às vezes adaptado para atender às necessidades cognitivas em construção.
O educador precisa desenvolver e aprimorar seu conhecimento estético nos mais variados campos da arte, além de sua capacidade expressiva, para que possa enriquecer seu poder de comunicação através de efeitos dramáticos transmitidos pelo uso adequado da voz, do corpo, visando levar a criança a vivenciar as possibilidades expressivas e dramáticas do seu próprio corpo, sua voz, sua imaginação, atraindo sua atenção pelo sensível, pelo encantamento.
A interação e o diálogo entre o adulto e a criança são fundamentais, pois é através deles que ela vai se apropriando do conhecimento estético. Sentindo-se acolhida e respeitada a partir dessa relação, a criança responde agindo de forma mais expressiva, amorosa e integral, em consonância com o outro, aprendendo através do jogo teatral a descobrir uma possibilidade de sentido para a vida.
Pela comunhão estabelecida entre o educador e as crianças, e entre elas próprias, o teatro pode se transformar num brinquedo cultural que ultrapasse o faz-de-conta do cotidiano infantil para se transformar num instrumento de trabalho coletivo para a criança que “assim aprende a agir como “ser social”e cresce. Os grupos infantis são grupos de iniciação para a vida por intermédio da experiência e em contato direto com o meio social em que vivem. Mesmo sendo situações vividas de forma elementar, elas antecipam e preparam, passando pelos diversos estágios culturais, para a vida adulta.” (Altman, 1999, p. 240).
Dramatizar contos de fadas, poesias de Cecília Meirelles, Drummond, adaptar peças de Maria Clara Machado para que as próprias crianças possam ser os atores-autores de seu jogo teatral, são atitudes de uma prática que se pretende inclusiva, pois rompe as fronteiras entre os diferentes: o adulto e a criança, o pobre e o rico, o negro e o branco, a menina e o menino. Esse jogo permite a transgressão de códigos sociais e a conseqüente quebra de barreiras intelectuais e sentimentais que limitam a liberdade e o prazer que a criança pode experimentar ao dar vazão às suas fantasias e reflexões:
Menina pode brincar de ser o rei? Menino pode ser bruxa? Como vai pintar a boca de palhaço sem usar batom? Posso ser a madrasta ou a bruxa toda vez que eu quiser? Por que a Cinderela, que é bela, sofre muito? Por que o trabalho é chato? Por que pobre passa fome e não pode casar com o príncipe? Por que a bruxa quer matar sua filha? Por que a criança é abandonada na floresta pelos pais para morrer de fome e sede? Por que o príncipe é sapo? Tenho que beijar esse sapo nojento pra que ele vire um belo príncipe? Por que a Moura Torta é má, se é pobre e sofre também? Por que Chapeuzinho vai sozinha pra floresta? Por que arrepio de medo e prazer quando o Lobo fala que quer me olhar melhor, me ouvir melhor, me cheirar melhor?
Ao dramatizar em grupo a história fantasiosa, a criança vivencia questões complexas para as quais talvez só obtenha respostas ao amadurecer. Mas, no presente da infância pequena, vai se aparelhando para compreender com alegria as respostas que o mundo dá e lhe responder de volta, pois aprendeu pelo lúdico jogo do teatro a argumentar.
A dinâmica da prática teatral faz com que a riqueza das idéias embutidas nos contos de fada ganhe vida através do exercício lúdico da teatralidade. A magia traz o passado para o presente e a criança vai recolhendo fragmentos desse passado, colecionando-os e preparando-se para compreender a noção benjaminiana do despertar, isto é, “juntar energia suficiente para confrontar o sonho e a vigília e agir, em conseqüência, sobre o real não só pela força da imaginação pessoal, mas também pela força da ação coletiva” (Gagnebim, 1994, p. 90). A prática de teatro na Educação Infantil prepara a criança para compreender o mundo, unindo-a ao primitivo. O teatro pode ser a ponte.
2.3
DIÁLOGO III - Uma Conversa com Benjamin sobre o Teatro Infantil Proletário
Benjamin acreditava que a educação partidariamente planejada, seja ela burguesa ou proletária, não obtém nenhum efeito realmente substancial sob a criança, que pode apenas repetir frases que lhe são impostas a respeito dos mais variados assuntos, sem com elas realmente formar sua subjetividade.
Mas a criança pequena deveria ser educada proletariamente, isto é, adquirindo desde cedo consciência de classe através de uma pedagogia que atuasse através daquilo que é verdadeiro para a infância.
A verdade poderia ser encontrada no contexto que envolve a criança, expresso no campo do teatro, porque para Benjamin (1984), este é o lugar onde a vida pode ser expressa em sua totalidade, embora delimitada e emoldurada pelos limites do palco. Como a educação da criança exige uma abrangência que envolve toda a sua existência e, no caso da educação proletária, um terreno delimitado, é nos limites do teatro infantil proletário que pode ocorrer uma educação dialeticamente determinada.
Em oposição ao sentimento de medo nutrido pela burguesia em relação ao teatro, principalmente sobre os seus efeitos na educação das crianças, Benjamin (1984) considerava que o teatro infantil proletário poderia ser uma forma de organizá-las para “a possibilidade de ver a força mais poderosa do futuro ser despertada nas crianças através do teatro” (p.85).
Na contemporaneidade torna-se um tanto obsoleto ouvir-se falar de “teatro infantil proletário” diante dos fatos históricos recentes, como a falência da União Soviética e seus satélites, a adesão dos antigos regimes comunistas europeus ao sistema capitalista, a globalização e o neoliberalismo que ocupam de forma quase hegemônica corações e mentes de muitas sociedades, a perene injustiça social que
assola em especial o Terceiro Mundo, consubstanciada na miséria, no racismo e na violência.
Portanto, é preciso contextualizar as afirmações de Benjamin como uma reação a ascensão nazista ao poder em 1933 e seu conseqüente exílio; como uma forma de lutar contra a destruição da memória coletiva e de preservar a maneira própria da criança ver o mundo, sua sensibilidade e valores; como uma forma de estabelecer a cultura da criança face à cultura do adulto, preservando a plenitude e a integridade da infância diante do assédio da ideologia burguesa.
A luta de Benjamin pela infância continua a fazer sentido nos dias de hoje, principalmente para uma educação que se preocupa com a formação do sentimento de cidadania a partir do nascimento e que se organiza para oferecer os meios pelos quais a criança pequena pode tomar posse da cultura que pulsa ao seu redor.
Mas não podemos esquecer que, mesmo uma educação de vanguarda, é exercida num meio burguês sujeito a todas as influências neoliberais que predominam no mundo de hoje. Portanto, dialogar com Benjamin tentando iluminar o caminho tendo como lanterna os conhecimentos desenvolvidos por este pensador, é oportuno.
Mas como Benjamin (1984) organiza o “teatro infantil proletário”, que para ele é “fogo no qual realidade e jogo fundem-se para as crianças, imbricam-se tão profundamente que sofrimentos simulados podem converter-se em autênticos, surras simuladas em reais”? Em primeiro lugar, a encenação final de uma peça infantil não possui tanto valor quanto às tensões que surgem durante a execução do trabalho teatral coletivo, sendo elas que possuem o caráter educativo.
O papel do educador no teatro infantil proletário não é o de promover a educação moral das crianças ou prepará-las para exercer um papel na sociedade burguesa, mas sim de incentivá-las a se exercitarem coletivamente, de se envolverem pelos conteúdos propostos pelo educador, mas deixando que elas mesmas descubram as diversas tarefas e associações possíveis decorrentes dessa atividade lúdica coletiva. Para Benjamin (1984), é na coletividade infantil que podemos encontrar a “atualidade da criação” e a irradiação das mais poderosas forças.
O educador de teatro deve dar especial atenção à observação, ponto de onde começa a educação, e a partir do qual, ele pode capturar o “gesto infantil”, 27
percebido como sinal emitido da infância e que traduz esse mundo ao adulto, emitindo o revolucionário “sinal secreto” do vindouro. Para Benjamin (1984), o gesto infantil é “uma inervação criadora em correspondência precisa com a receptiva” (p.86). A tarefa do educador é “libertar os sinais infantis do perigoso reino mágico da mera fantasia e conduzi-los à sua execução nos conteúdos” (p. 86).
Um papel especial é reservado à improvisação das crianças, de onde surge o gesto infantil, sendo o teatro o sintetizador desse gesto, que aparece de repente, uma única vez. Para Benjamin, “todo desempenho infantil orienta-se não pela ‘eternidade’ dos produtos, mas sim pelo ‘instante’ do gesto. O teatro, enquanto arte efêmera, é infantil” (p.87).
É pela improvisação que a criança pode exercitar sua criatividade durante a encenação libertando-se do jugo pedagógico através do jogo. Mas isso não quer dizer que a criança não possa ter contato com os conflitos que ocorrem no mundo real, sendo necessário apenas que sejam apresentados de forma lúdica, garantindo assim a adesão da criança ao jogo teatral, até porque para Benjamin (1984), “a encenação é a grande pausa criativa no trabalho de educação”.
A nossa prática teatral apresenta algumas características que se aproximam do “teatro infantil proletário”. Nossa preocupação não é formar indivíduos para a sociedade burguesa através da inculcação de valores morais, ou valorizar a racionalidade em detrimento do sentimento, ou apenas aculturar as crianças concebendo-as como tábula rasa que precisam aprender a se comportar apropriada e educadamente.
Através da dramatização de contos de fadas, queremos propiciar a livre expressão da criança, favorecendo o aparecimento do gesto infantil benjaminiano, quando ela improvisa a história assimilada coletivamente depois da apresentação da narrativa do conto, que é uma forma literária muito valorizada por Benjamin, pois contém em si as reminiscências da construção da realidade atual.
O universo do conto revela o cotidiano cruel do mundo numa perspectiva oposta à romantização burguesa, apresentando ludicamente tanto a beleza quanto a perversidade do mundo, sem fantasias que sepultem sob uma camada de hipocrisia e moralismo, a história da construção da sociedade, de suas relações, e a possibilidade de modificá-la. O conto e a prática teatral infantil valorizam a magia na constituição da cultura da criança.
2.4
DIÁLOGO IV - O Círculo Encantado de Bakhtin: Teatro, Educação e Vida
O ato estético engendra a existência num novo plano de valores do mundo; nasce um novo homem e um novo contexto de valores - um novo plano do pensamento do homem sobre o mundo.
(Mikhail Bakhtin)
O teatro é uma forma de arte que se constituiu ao longo da história refletindo o que diz respeito à forma das sociedades se organizarem e à constituição dos diferentes tipos de sujeito, explicitando conflitos, ideologias, formas de pensar e sentir, costumes, hábitos, mitologias. Pode ser definido como o local da apresentação da condição humana em forma de ação, um elemento eminentemente teatral, ou como “uma pluralidade de códigos, de semióticas (a gestualidade, a cenografia, a música, etc)” (Coelho Netto, 1980, p.12).
Como toda forma artística pressupõe uma linguagem, o teatro procura fazer sentido através de um elemento específico de sua natureza, a teatralidade, isto é, “a produção de forma, de significantes que surgem como um conjunto em cena” (Coelho Netto, 1980, p.21) Portanto, a teatralidade é tudo aquilo que pode se tornar signo, sensação, percepção no momento em que se usufrui da arte teatral.
É justamente essa linguagem específica expressa pela teatralidade que se pretende que a criança pequena se apodere, com o intuito de prover seu desenvolvimento global através da aquisição de conhecimento sensível, capaz de fazê-la criar sentido, elemento imprescindível na união entre arte e vida.
O sentido se forma no encontro de uma subjetividade com outra, gerando uma gama variada de perspectivas de se representar a realidade do mundo, dentro de um contexto coletivo.
O ato de fazer teatro implica disposição para o diálogo: entre o autor e o herói, os atores e os personagens e destes com o público (ouvinte/espectador). Estas relações triangulares estão na base da constituição do teatro como uma arte coletiva capaz de falar ao espírito e ao sentimento humanos.
A importância de se compreender os vários elementos de uma encenação (teatralidade, dramaturgia, expressividade, sentimento, corporeidade) como elos que se interpenetram, influenciando uns aos outros e constituindo a linguagem teatral, nos aproxima do pensamento de Bakhtin para quem “a linguagem nunca está completa, ela é uma tarefa, um projeto sempre caminhando e sempre inacabado” (Jobim e Sousa, 1994, p.100).
A condição de ser inacabado é da natureza da existência humana. Por isso é importante irmos em busca do outro, aquele que pode nos ajudar na tarefa de nos completarmos mutuamente. É pela emoção interior, compartilhada nas vivências sociais, que podemos tentar executar o acabamento.
Para Bakhtin, a atividade estética existe na vida, nas relações sociais, definindo-se como uma atitude ética que funda e revê valores em constante movimento de transformação e acabamento. Ela se completa quando voltamo-nos para nós mesmos, elaboramos o material recolhido dando-lhe forma. “Uma obra de criação verbal (...): guia o processo de identificação e proporciona o princípio de acabamento ao outro” (Bakhtin, 1992, p.47).
O diálogo com Bakhtin se torna importante quando se deseja fundamentar uma prática teatral na Educação Infantil, que tem como características principais o fato de ser organizada e freqüente no currículo da creche Fiocruz e o de unir o conto maravilhoso, utilizado como texto dramatúrgico ao exercício da teatralidade por crianças pequenas, com o objetivo de fazê-las compreender a vida que as cerca, as implicações sociais a que são submetidas desde o nascimento e as diversas culturas e identidades que perpassam o tipo burguês.
Através da atividade estética proposta por esta prática teatral, acreditamos que a criança pode conhecer as relações existentes no mundo, expressas nas aventuras dos heróis dos contos de fadas, conduzindo seu corpo em busca do encontro com a alteridade e constituindo seu imaginário através de imagens estéticas propostas pela narrativa fantasiosa, pelo contato corporal e pela interpretação de ações dramatúrgicas concretas implícitas no fazer teatral.
No texto Arte Y Responsabilidad, Bakhtin defende a idéia de que “Yo debo responder con mi vida por aquello que he vivido y comprendido en el arte, para que todo lo vivido y comprendido no permanezca sin acción en la vida”. Podemos entrever aqui uma questão que é fundamental no pensamento de Bakhtin: “El arte y la vida no son lo mismo, pero deben convertirse en algo unitario, dentro de la unidad de mi responsabilidad”.
A partir dessa idéia seminal, acreditamos que Bakhtin estabelece um papel fundamental para a arte na vida de um indivíduo, como o elemento que pode
ajudá-lo a se constituir como um sujeito responsável tanto consigo mesmo, como com aqueles com os quais convive no meio social. O outro torna-se um elemento constitutivo desse indivíduo e vice-versa.
Mas de que arte estamos falando aqui? Da arte que se responsabiliza pela ação humana na vida e que reflete essa ação em seus elementos constitutivos, colaborando na formação da subjetividade humana e na criação de um sentido para a vida cotidiana.
Podemos supor então que usufruir da arte ou mesmo vivenciá-la, pode se constituir num ato ético, de comprometimento com a melhoria das condições de existência no mundo, levando o ser humano, pela sensibilização, pela reflexão e pela linguagem a se relacionar com a alteridade, estabelecendo uma relação dialógica, que é uma categoria fundamental no pensamento de Bakhtin.
A atividade estética cumpre a tarefa de reunir no interior do indivíduo a dispersão do sentido e do efêmero do mundo, construindo através da emoção e da razão um significado para o acontecimento existencial, o que conduz o indivíduo, em comunhão com o outro diferente dele, na direção de um acabamento, de um completar-se no espaço, no tempo e no sentido. Tarefa essa que, embora construída na relação, só pode ser finalizada quando esse indivíduo retorna ao seu interior e elabora todo o sentido captado no mundo (Bakhtin, 1992, pp. 204-205).
A convivência de sujeitos singulares que se relacionam, provocando uma interdependência de pontos de vista e a construção de uma consciência compartilhada a respeito do mundo, pode auxiliar o indivíduo a alcançar um modo de existência mais solidário, em que a aventura árdua de adquirir conhecimento, possa ser uma experiência única e ao mesmo tempo comunitária e no qual a arte exerça um papel realmente importante na constituição da subjetividade desse indivíduo e não seja mais um mero adorno divertido, um passatempo pequeno-burguês.
Bakhtin (op. Cit.) construiu grande parte de sua teoria esmiuçando a relação do sujeito com a obra de criação verbal (a estética). Mas o que ele nos fala a respeito da representação teatral, que aqui nesse trabalho constitui-se em nosso objeto de investigação?
Para Bakhtin (op. Cit.), apenas quando o espectador está presente é que o teatro se torna uma atividade artística relevante e a representação se torna arte, valorizando mais uma vez a categoria de uma consciência externa que dá acabamento e sentido à atividade estética.
A representação infantil, que a princípio não tem preocupação com a construção interior do personagem, é comparada por Bakhtin (op. Cit.) com o devaneio, com o sonho, com o desejo de participar de uma atividade prazerosa provocada pelo interesse lúdico de viver diferentes vidas.
Neste ponto é importante definirmos melhor a diferença entre a dramatização espontânea vivida pela criança durante suas brincadeiras imaginativas e a representação teatral.
Considera-se que a criança ainda não possui maturidade psicológica suficiente para compreender a vida interior de um personagem. Ela imita as ações exteriores, interessando-se pelas narrativas aventurosas, embora o faça com uma verdade muitas vezes invejada pelos profissionais do teatro. Diferentemente do ator, que compreende a distância significativa entre a sua própria vida e a do personagem, o que provoca a criação de uma aparência de realidade através de seu físico e de sua subjetividade.
Ambos, o ator e a criança, querem recriar o mundo e as relações humanas nele estabelecidas, embora com propósitos diversos. O ator quer metamorfosear-se, transformar seu corpo e emprestar suas emoções ao personagem para poder tornar verdadeira sua representação, tentando afetar o espectador pela ilusão criada no palco.
Bakhtin (op. Cit.) se pergunta se essa atividade é um verdadeiro ato de criação estética. Não é enquanto o ator procura encarnar o personagem, mas torna-se um, quando procura distanciar-se dele (herói) exercendo, junto com todos os envolvidos na atividade teatral, o papel de autor, sempre levando em conta o todo artístico criado para a peça, procurando provocar a consciência do espectador para que este possa agir no mundo e modificá-lo.
A criança procura mimetizar-se com o mundo ao redor. Ela não tem pudor em se transformar em animais, plantas, personagens fantásticos. Mas ao mesmo tempo existe algo na representação infantil do mundo que implica um certo distanciamento. Ela se envolve totalmente com seu gesto dramático no momento mesmo que o cria, mas também é capaz de interrompê-lo com rapidez no instante em que é perturbada, demonstrando profunda consciência de que apenas brinca de ser aquilo que efetivamente não é.
Entretanto, por ser ainda imatura, ela não desenvolveu a consciência (exotopia) necessária para poder valorizar a alteridade e poder distanciar-se da realidade do mundo, acabando por, muitas vezes, confundir-se com ela. A criança não está preocupada em modificar essa realidade, que às vezes sequer chega a compreender, embora deseje profundamente alcançar essa compreensão, para poder enfim chegar à maturidade sonhada.
A dramatização espontânea pode ser seu jogo preferido, pelo qual ela vai apoderar-se de alguns mecanismos para desenvolver suas habilidades expressivas e estabelecer suas relações sociais, aprendendo a agir no mundo em constante convívio com o outro, ao mesmo tempo que amadurece e vai adquirindo conhecimento através de um mecanismo lúdico e poderoso como a dramaticidade que lhe permite viver várias vidas numa só, a sua. Para Bakhtin “a arte possibilita-me viver várias vidas em vez de uma só, e com isso enriquecer minha experiência pessoal, possibilita-me participar internamente de outra vida, em nome do significado que ela comporta” (1992, p.96).
Em nossa prática teatral na Educação Infantil, queremos aproveitar essa aptidão da criança pela dramatização espontânea para provocar seu interesse pelo jogo dramático que, acreditamos, pode ajudá-la a constituir sua linguagem, pela exposição à diversas narrativas fantasiosas que podem ser dramatizadas.
Concomitantemente, a criança poderá desenvolver o gosto pela exploração de sua expressão corporal (gestual e vocal) e vivenciar uma experiência criativa e lúdica no seio de uma turma. Ela poderá descobrir que sua expressividade pode ir além da linguagem verbal, enriquecendo sua experiência pessoal através de uma atividade teatral organizada.
Outro ponto de contato entre a teoria de Bakhtin e a prática teatral passível de ser exercida na Educação Infantil é quando ele define o caráter sociológico da arte. Originada na vida, a ela retorna, propondo alternativas, numa perspectiva estética, crítica e social, já que “todos os produtos da criatividade humana nascem na e para a sociedade humana” (Bakhtin, s/d, p.2) Podemos esmiuçar mais esta questão, ao ouvirmos Bakhtin a respeito da “fala da vida e das ações cotidianas” (Bakhtin, s/d, p.4) que aparece enunciada no discurso artístico e vice-versa, pois também a fala artística se encontra enunciada na vida social.
Para a criança, que ainda está se apoderando do discurso verbal, pode ser interessante o exercício de modos de enunciação através do fazer artístico
(teatral), pois o discurso poético, carregado de poder semiótico, pode iluminar sua fala, acostumando-a a fazer constantes trocas simbólicas entre a arte (narrativa fantasiosa + teatralidade) e a vida, tão cheia de mistérios e recantos escuros, discursos ininteligíveis, fatos inexplicáveis, que a arte pode ajudar a criança a compreender.
O presumido, o horizonte extra-verbal, aquilo que a criança vive nos atos sociais, no seio da família, o que ela deseja, ama, quer (Bakhtin, s/d, p.6), pode ser perfeitamente afetado pela ação estética, vivida no contexto da Educação Infantil, ou mesmo em sua vida cotidiana fora do âmbito escolar.
Quando no ambiente educacional lhe é oferecida a oportunidade de vivenciar o ato estético e de aprender pela arte que seus atos são objeto de crítica (o outro, na relação, completa os vários sentidos possíveis de seus atos, exigindo reflexão e auto-reconhecimento) e que suas atitudes possuem uma história comum expressa tanto na narrativa fantasiosa quanto na realidade cotidiana, formando uma espécie de coletividade compartilhada de significados, então a criança pode começar a formar o que Bakhtin (1992) chamou de exotopia, isto é, a consciência da alteridade na vida.
Devemos levar em conta aqui a possibilidade da criança acostumar-se com a figura do espectador, que pode ser um educador e, principalmente, as outras crianças com as quais compartilha a atividade teatral e que podem lhe dar suporte emocional e afetivo e providenciar a oportunidade de acabamento, pois podem ver aquilo que ela não vê, construindo um conjunto de significados comuns. Isso pode ser considerado um ato ético (uma categoria bakhtiniana) pela oportunidade de construção coletiva de um conhecimento sensível que implica a atuação de um outro que compartilha um acontecimento da existência da criança.
A relação triangular eu-herói-ouvinte é constantemente exercitada durante a atividade, pois a criança se lança em busca da fantasia, do encantamento, da emoção, da cultura proposta pelo gesto teatral. Ela gosta de se metamorfosear nos heróis querendo “revestir de carne externa essa personagem principal da vida e do devaneio” (Bakhtin, 1994, p.49), cumprindo no cotidiano escolar a principal tarefa do artista: recriar a vida, através do corpo e do sentimento, propondo uma nova visão, ou melhor, uma revisão crítica e emocionada dos erros e acertos cometidos pelas sociedades no já vivido.
A relação criada pelo exercício do ato teatral é eminentemente dialógica, pois ao dramatizarmos precisamos do olhar do outro, de sua visão, de seu saber, de sua ação estética, de uma constante troca emocional que cria um ambiente em que compreender implica responder ao outro e completar sua visão de mundo.
Mas ao estabelecermos essa prática teatral organizada, estamos indo um pouco além das fronteiras do jogo dramático, que pertence exclusivamente à livre imaginação infantil. Ela é sustentada na livre dramatização de contos de fadas, usados como textos através dos quais a criança poderá exercitar a teatralidade.
Alguns autores consideram esses contos uma literatura enganadora pois mistificam as relações sociais, embora utilizem uma linguagem apropriada para o entendimento da criança, que necessita deles para tentar compreender o mundo que a cerca. Os contos possuem uma profunda riqueza antropológica, traduzindo para a criança modos de existência que se constituíram no passado, mas que estão presentes na atualidade.
A partir da fruição da narrativa dos contos de fadas, a criança pode começar a construir no presente da sua existência, pelo encantamento e pela fantasia, a memória do futuro.
Em nosso ponto de vista, os contos de fadas constituem-se como obra de arte, literatura da mais alta qualidade, ciência que “possui maior espaço de pesquisa e de aproximação humana. Ciência da psicologia coletiva, cultura do geral no Homem, da tradição e do milênio na atualidade, do heróico no cotidiano, é uma verdadeira História Normal do Povo.” (Cascudo, 2001, p.11).
Para Bakhtin (1992), a visão artística se organiza ao redor da vida do ser humano, constituindo seu ambiente de valores através das relações estabelecidas por ele no tempo, no espaço e no sentido, criando sua realidade estética. Portanto, concebemos o herói do conto de fadas como o outro artístico, que diferenciando-se do outro-criança, pode lhe conferir acabamento, quando a criança, através do exercício do jogo dramático, (sendo sua natureza aleatória alterada pela indução do educador ao exercício da prática teatral organizada) aproxima-se do artista (o ator) que “sabe situar sua atividade fora da vida cotidiana... e encontrar o meio de aproximar-se da vida pelo lado de fora...O ato estético engendra a existência num novo plano de valores do mundo; nasce um novo homem e um novo contexto de valores – um novo plano do pensamento do homem sobre o mundo” (Bakhtin, 1992, p. 205).
Não é nosso objetivo induzir a criança a “encarnar” o herói do conto de fadas, mas através do jogo dramático exercitado em conjunto, em que podemos ter um grupo de crianças representando um único personagem ao mesmo tempo, queremos que a criança possa adquirir conhecimento, ao mesmo tempo em que constrói referências dos valores que ajudaram a estabelecer a sociedade humana da forma que conhecemos.
No interior dos contos de fadas encontramos valores que se referem ao acontecimento da vida, mesmo que ao analisarmos sua linguagem fantasiosa possamos considerá-la inverossímil, mistificadora, como defendem alguns. A linguagem do conto é encantadora, construída apropriadamente para falar ao interior da alma infantil, obedecendo apenas às leis da verossimilhança da ficção. Contudo, está ligada ao que realmente acontece no mundo.
Quando João e Maria são abandonados à sua própria sorte, porque os pais não mais suportam a vida de necessidades que levam, podemos nos lembrar das milhares de crianças abandonadas que vivem pelas ruas de uma cidade como o Rio de Janeiro. Quando através de estratagemas elaborados pelas próprias crianças, utilizando sua sabedoria forjada na luta pela sobrevivência, João e Maria retornam para casa uma vez ou enganam a bruxa que deseja devorá-los, podemos nos lembrar das mesmas crianças de rua cariocas que fazem malabarismos nos sinais para sobreviver. Sentimos então nos contos de fadas “a resistência da realidade do acontecer da existência” (Bakhtin, 1992, p. 213).
Ao dramatizarmos os contos de fadas no exercício dessa prática teatral organizada na Educação Infantil, observamos algo da técnica de teatro épico. O estímulo à presença de muitos narradores (crianças e educador), que exploram diferentes pontos de vista a respeito da mesma narrativa, quebra a sensação de “ilusão”, própria do teatro aristotélico, aproximando o efeito obtido da técnica de “distanciamento brechtiano”.
Neste ponto é possível encontrarmos pontos de contato entre o teatro de Brecht e o que falava Bakhtin a respeito da arte dramática, principalmente no objetivo comum expresso por ambos de estimular a formação de uma consciência que seja modificadora do presente e que, ao compartilhar a construção de significados através da estética, possa tanto constituir um novo ser humano, como realizar a tarefa de reformar a sociedade pela crítica a valores arcaicos e à atitudes autoritárias, através do reconhecimento do valor dos sentidos compartilhados em sociedade e principalmente na vida.
Acreditamos que aqui reside o poder pedagógico do Teatro: na possibilidade de afetar comportamentos, atitudes, modos de pensar, através de uma atividade estética coletiva que obriga, por sua própria natureza, a constante troca de sentidos entre seus participantes. Talvez resida aí também a contribuição da arte na possibilidade de mudar o mundo que conhecemos: possibilitar acesso a formas de conhecimento sensível, realizando uma espécie de alfabetização sentimental, que permita a criança se dar conta de que ela se constitui nas relações sociais, que não está isolada num mundo de indivíduos isolados, que o que ela pensa, sente, já foi pensado, sentido por outros da comunidade humana.
Pelo contato com a diversidade contida nas narrativas fantasiosas (compilação de narrativas das relações humanas, expressas em linguagem encantada, produto da oralidade popular e da história de lutas sociais), aliada ao exercício da teatralidade que também pressupõe a troca afetiva, a ressignificação de modos de agir, a reflexão através do sensível, talvez a criança possa compreender que a arte não é um bem inacessível, mas um elemento comum da vida, que está bem aqui, ao alcance de sua mão e do qual ela pode se utilizar, recuperando a centralidade e o valor da palavra afetada pelo sensível, existente no fluxo da relação com a diversidade.
A criança pode rever a contrapelo a história na qual é lançada desde o nascimento, mas na qual pode influir ao se apossar do conhecimento, do signo lingüístico. Pode compreender (esse movimento mágico e intelectual, que implica algo de pedagógico) que não é possível viver na selva da vida, sem se comprometer em “ser para o outro”, esse que pode nos dar o acabamento, que nos completa, colaborando na tarefa do nosso próprio auto-conhecimento e em nossa consciência social.
Pelo gesto e pela entoação, provocados pelo interesse em interpretar teatralmente os personagens da narrativa fantasiosa dramatizada, a criança se aproxima do que Bakhtin dizia sobre estar esses dois elementos (gesto/entoação) impregnados “de uma relação forte e viva com o mundo externo e com o meio social” (Bakhtin, s/d, p. 9) já que “residem aqui as forças da Arte responsáveis pela criatividade estética e que criam e organizam a forma artística.”( Bakhtin, s/d, p.9)
O que afinal podemos desejar com o teatro aliado à dramatização dos contos de fada na Educação Infantil?
Talvez o que mais queiramos seja afetar a fala interior infantil para que, ao comunicar o que pensa e sente, ao procurar o contato com o outro, com o diferente, a criança crie consciência de si e deste outro e, mesmo estando ainda imatura para compreender em toda a sua extensão e profundidade o valor social e ideológico da arte, ela possa cantar, dançar, criar, teatralizar, sabendo que em seu poder está o mundo novo revigorado, renascido, na consciência de cada uma das crianças.
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A IMPORTÂNCIA DO TEATRO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
JULIANA CAVASSIN
MEU COMENTÁRIO:
A pedagogia de modo geral está repleta de comunistas e socialistas com suas idéia políticas malignas e maquiavélicas que tentam conspirar contra a humanidade e a liberdade. Os comunistas sempre foram umas pestes como foram os nazistas. O nazismo conseguiu mostrar ao mundo em uma década toda a imbecilidade das idéias ultranacionalistas que não pouparam nem mesmo um povo tão inteligente como os alemães (sem necessariamente serem arianos), na prática o nazismo do diabólico Hitler levou a morte 50 milhões de pessoas que morreram na bestial Segunda Guerra Mundial. Quem conhece as histórias de perseguição aos cristãos e aos demais religiosos do mundo sabe como o comunismo ( esta obra satânica) destruiu milhões de vidas ao longo do século vinte, por ser um movimento que agiu durante décadas, talvez tenha matado mais que o nazismo. Os comunistas tentaram sufocar a religião, acusando de ópio dos povos, sendo suas idéias comunistas o CRACK que pulverizou a razão das nações comunistas, exemplo de ruína social e material como vimos na Rússia, em Cuba e no Leste Europeu.
SOCIALISMO
Ainda resta lixo ideológico parente do nazismo e do comunismo na nossa sociedade, idéias socialistas pregada por retardados mentais, que se presumem intelectuais e boa parte desta corja se refugiam a sombra da pedagogia tentando seduzir as nossas crianças aos ideais socialistas. Na política da América Latina este lixo ideológico continua vivo através de doentes mentais como Hugo Chavez e Evo Morales. O Brasil também contribui a esta fila de babacas e temos o Lula como seu expoente, ainda que nas últimas décadas, foi inteligente o suficiente para abandonar as idéias mais radicais da esquerda. Contudo a maior vergonha brasileira que tem contribuído para a derrocada da nossa educação é PAULO FREIRE, considerado o papa da pedagogia brasileira, para mim não passa de um comunista barato, e como todos os “metidos” comunistas se passam por intelectuais e causam impressão por suas falas com vocabulários sofisticados, mas com cabeças de girinos, nunca se transformam em príncipes, somente em SAPOS.
Tenho dito isto porque o texto abaixo está ideologicamente voltado a hipnose das crianças para transformá-las em combatentes das FARC. Estas idéias de ensinar as crianças a contestarem têm servido apenas para explicar a causa da violência escolar. O Senhor Paulo Freire e a sua corja tem estimulado a violência escolar, ao discretamente contaminar a educação brasileira com propagação de ideologias dos alunos contestarem os adultos. Devemos ensinar as crianças à disciplina, o respeito aos adultos e não serem estúpidos contestadores.
Estes malditos alimentam ideologicamente grupos criminosos como o PCC, basta vê os livros preferidos e estudados por Marcola. Estas ideologias de contestar a sociedade é típica dos criminosos, eles na verdade não gostam de trabalhar e receber ordem e o pior, não tem iniciativa empreendedora como os capitalistas, só sabem roubar e querem tomar o poder para desapropriar a quem tanto trabalhou. No Brasil este lixo da esquerda, formou vários grupos de cangaceiros como o MST (Movimento Sem-Terra). Deveriam ser presos e enforcados por formação de quadrilha. Temo que a esta altura o Brasil esteja deixando a educação na mão de gente como os autores do texto abaixo que só sabem criticar o capitalismo, loucos de vontade para roubarem o patrimônio de quem honestamente trabalharam para ter os seus bens...
O texto abaixo pertence a Juliana Cavassin (meu é que não é graças a Deus!!!!) que foi publicado na R.cient./FAP, Curitiba, v.3, p.39-52 , jan./dez. 2008 39 com o título:
PERSPECTIVAS PARA O TEATRO NA EDUCAÇÃO COMO CONHECIMENTO E
PRÁTICA PEDAGÓGICA
RESUMO: O presente artigo objetiva demonstrar que o Teatro na Educação, apesar de ser considerado uma área do conhecimento, em função de uma série de dificuldades teóricas e práticas ainda precisa do desenvolvimento de bases sólidas e profundas para uma maior estabilidade dentro de um paradigma científico. É considerada a importância do foco nos campos de atuação da Pedagogia do Teatro, sobretudo na educação formal (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e os Cursos Superiores) já que esses estão diretamente ligados aos locais de formação humana e produção
do conhecimento. Em longo prazo, há uma influência direta aos demais campos de atuação do Teatro na Educação e diminuição das fragilidades apresentadas nessa área do conhecimento. Nesse sentido, argumenta-se sobre a fundamental importância da informação e do questionamento a respeito de ações efetivas do Estado ligadas ao ensino do Teatro (com foco nos Parâmetros Curriculares Nacionais) e também a formação de professores dentro de uma perspectiva do Pensamento Complexo e da Educação Progressista.
PALAVRAS-CHAVE: arte e ensino; Parâmetros Curriculares Nacionais; formação de professores.
PERSPECTIVES FOR DRAMA IN EDUCATION AS KNOWLEDGE AND PEDAGOGICAL PRACTICE
ABSTRACT: The aim of this article is to demonstrate that due to a series of theoretical and practical difficulties, Drama in Education still needs to develop firmer and deeper support for a greater stability from a scientific stance, although it is already considered a knowledge field. The importance of focusing on the fields of Theatre Pedagogy is considered, especially in formal education (elementary, middle and high school, and college level), since these levels are related to the human formal training and knowledge production. In a long range, there’s a direct influence upon the other fields of application of Drama in Education and the reduction of the weaknesses presented in this field of
knowledge. Emphasis is placed on the importance of adequate information and the questioning of effective governmental actions (focusing on the Brazilian Curriculum Guidelines) as well as teacher education from the stance of Complex Thought and Progressive Education.
KEYWORDS: art teaching; Brazilian curriculum policies; teacher development.
∗Licenciada em Artes Cênicas pela Faculdade de Artes do Paraná (2002) e em Jornalismo pela PUC-PR (2002) com Especialização em Fundamentos do Ensino das Artes (Faculdade de Artes do Paraná, 2004). È Mestre em
Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2006) e Professora do Curso de Licenciatura em Teatro da Faculdade de Artes do Paraná (desde 2007) e de Teatro do Ensino Fundamental e Ensino Médio do
Colégio Nossa Senhora Medianeira (Curitiba, P.R) desde 2003. Também presta assessorias e oficinas para instituições como SENAC e UFPR, nas áreas de Artes e Comunicação. R.cient./FAP, Curitiba, v.3,p.39-52 , jan./dez. 2008 40
O Teatro na Educação como uma nova área do conhecimento (KOUDELA, 2006) é
uma conquista. No entanto muitos fatores ainda limitam e dificultam a sedimentação não apenas no que se refere às pesquisas teóricas como ao desenvolvimento de práticas significativas também.
Na história da produção científica, em função da predominância do Paradigma
Moderno, Cartesino ou Racional, a relação arte e ciência já é algo bastante inovador. A supremacia dessa forma de conhecimento sobre aquela deixou, por séculos, a arte num status inferior (CAVASSIN, 20061). Assim, um dos problemas decorrentes, por exemplo, é a carência de material referente à metodologia de pesquisa e a identificação do objeto de estudo
em função do caráter processual e efêmero da arte (CARREIRA; CABRAL, 2006).
Todos esses aspectos são relevantes já que o Teatro é a base pistemológica dessa área2 que tem na Pedagogia do Teatro disciplinas de integração entre os pólos teatro e pedagogia e disciplinas limítrofes de ambas. Aí, a Pedagogia do Teatro tem como campos de atuação os Grupos Profissionais; a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio;
os Cursos Superiores; as Organizações Extra-Curriculares; o Lazer; os contextos: Social, Terapêutico e da Saúde e Empresarial. (KOUDELA, 2006).
O presente artigo focará a educação formal (da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio no que se refere ao Ensino do Teatro e aos Parâmetros Curriculares Nacionais e ao Ensino Superior na importância da formação de professores) já que “a escola é primeiro espaço formal onde o aluno tem contato com o conhecimento sistematizado em arte” (GOVERNO DO PARANÁ, 2006).
Um Professor de Teatro com formação sólida atuará nas Escolas com consciência e qualidade no ensino, o que, em longo prazo, representa a mudança cultural ampla de caráter paradigmático, ou seja, em todos os campos de atuação da Pedagogia do Teatro e além deles.
Não há como negar a relação direta entre a formação de professores de Teatro, as práticas do Teatro na escola e as demais manifestações dessa área do conhecimento em toda a sociedade, como já apontava Loureiro em 1979 :
O teatro brasileiro só apresentará um nível profissional elevado na medida em que houver um público culturalmente maduro para assisti-lo e sustentá-lo. E este só poderá formar-se numa experiência educacional integradora que inclua a aprendizagem da relação arte/vida. De nada adianta a instalação de cursos superiores de arte dramática se essa dimensão não se fizer presente em todos os níveis do processo educativo. (CHAVES In: REVERBEL, 1979, p. ix,) Muito se sabe a respeito da importância do Teatro na Educação em todos os campos de atuação. Os princípios pedagógicos do Teatro traçam relações claras entre Teatro e educação, considerando essa arte como uma forma humana de expressão, a semiótica e a cultura. Daí a ênfase em aspectos sígnicos, simbólicos, de linguagem e comunicação que vem
1 Em minha dissertação de Mestrado (Contribuições dos Sete Saberes para a Prática Pedagógica do Teatroeducador do Futuro) traço um paralelo entre a Teoria da Complexidade de Edgard Morin como perspectiva epistemológica de um novo paradigma do conhecimento e o ensino do Teatro dentro de um novo paradigma de educação.
2 Em artigo intitulado “Pedagogia do Teatro” Ingrid Koudela (2006) afirma que o embasamento epistemológico no Teatro para a área do conhecimento do Teatro na Educação deve-se a camisa-de-força gerada pela visão estreita dos conceitos de pedagogia, didática e metodologia.
sendo estudados e sistematizados na área, donde podem se destacar algumas idéias emetodologias como:
- O teatro como conhecimento que é busca respostas para os questionamentos sobre o que é o mundo, o homem, a relação do homem com o mundo e com outros homens nas teorias contemporâneas do conhecimento que propõem novos paradigmas para a ciência como a complexidade do pnsador Edgard Morin, que será explicada mais adiante;
- Abordagens Psicopedagógicas (sobretudo de Piaget nos estudos de Olga Reverbel) que apontam para o desenvolvimento de linguagem e representação, o exercício artístico e coletivo; a construção de conteúdos inerentes à personalidade por intermédio da estética e o valor emocional. Segundo Olga Reverbel (1979), teatro é a arte de manipular os problemas humanos, apresentando-os e equacionando-os. A autora defende a função eminentemente
educativa, e destaca que a instrução ocorre através da diversão.
A educação está no desenvolvimento emocional, intelectual e moral da criança, correspondente aos desejos, anseios e proporcionar uma marcha gradativa das próprias experiências e descobertas. Isso porque possui uma concepção totalizante que implica e compromete todas as potencialidades
do indivíduo e permite o alcance da plenitude da dimensão social com o desenvolvimento da auto-expressão. Para a autora, a importância da diversão justifica-se porque imitar a realidade brincando aprofunda a descoberta e é uma das primeiras atividades, rica e necessária, no
auxilio do processo de eclosão da personalidade e do imaginário que constitui um meio de expressão privilegiado da criança. Olga defende ainda que na infância tem-se a necessidade de brincar, jogar para se orientar no espaço, pensar, comparar, compreender, perceber, sentir para descobrir o mundo, integrar-se com o meio, construir o conhecimento e a socialização.
Nessa concepção, o teatro aplicado à educação possui o papel de obilização de todas as capacidades criadoras e o aprimoramento da relação vital do indivíduo com o mundo contingente; as atividades dramáticas liberam a criatividade e humanizam o indivíduo pois o aluno é capaz de aplicar e integrar o conhecimento adquirido nas demais disciplinas da escola e, principalmente, na vida. Isso significa o desenvolvimento gradativo na área cognitiva e também afetiva do ser humano.
- Courtney (2001) enfatiza através da história do teatro-educação dos gregos à atualidade que essa é uma maneira fundamental de aprendizagem por permitir o confronto dos problemas da existência e das modificações mentais necessárias para resolvê-los. Nessa perspectiva, o jogo teatral pode ser aplicado em todas as áreas com a importância de sua força
motivadora que é a de criar o significado da existência humana. O autor aborda o jogo, teatro e pensamento baseado nas teorias de antropologia e psicologia social, psicanálise e psicologia infantil, nas modernas teorias do conhecimento, behaviorismo da imitação, na psicolingüística e também na psicologia do desenvolvimento de Piaget. Em psicanálise, ele demonstra que o jogo é reflexo do pensamento inconsciente baseado na experiência da criança cujo objetivo é a reprodução em forma simbólica das experiências não solucionadas da vida e a busca de soluções. Freud acreditava que a criação é uma continuação e substituição para o jogo infantil.
O jogo permite, assim, a criança re-experimentar os acontecimentos e através da repetição ganhar o domínio sobre eles. Courtney tem considerável pesquisa que demonstra a relação direta entre o Jogo Dramático e o processo criativo essencial para o desenvolvimento
imaginativo. O autor defende que a imaginação dramática está no centro da criatividade humana, já que desde a infância a criança, ao final do primeiro ano, quando brinca pela primeira vez finge ser outra pessoa e desenvolve o humor, personifica o outro. Essa identificação é princípio básico do processo dramático e segue na juventude quando se imita algo e na fase adulta, quando se coloca no lugar de alguém. Para ele, a educação Dramática deve estar no centro de qualquer forma de educação que vise o desenvolvimento das características essencialmente humanas, pois a imaginação é a característica essencial que diferencia o homem dos primatas superiores, e, essa é essencialmente dramática.
- O aprendizado da linguagem teatral própria (da qual se destacam os trabalhos de Viola Spolim sobre o Jogo Teatral) que possibilita o desenvolvimento da sensibilidade, percepção e conhecimento das especificidades cognitivas ligadas à prática da improvisação.
De acordo com Ingrid Koudela (apud SPOLIN, 1985, p.12), o jogo teatral na educação é importante forma de aprendizagem cognitiva, afetiva e psicomotora através do processo de transformação do egocentrismo em jogo socializador. A criatividade dramática auxilia o pensamento criativo e desenvolvimento social, pois efetiva a passagem do teatro como ilusão
para o teatro como realidade cênica;
- O teatro como educação política e de ação e reflexão, presente nas propostas metodológicas do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (diretamente ligado a concepção de educação de Paulo Freire, como também se falará adiante) e Teatro Didático de Bertold Brecht. A proposta dramática brechtiniana se insere na filosofia marxista e busca uma solução
reintegradora para a sociedade e para a alienação artística através do Teatro Épico e Dialético que rompe a atitude passiva do espectador. Já o Teatro do Oprimido- que surgiu da necessidade de reação às relações ditatoriais na América Latina na década de 1960 - conclui uma total desativação do papel do espectador, tendo em vista a libertação do papel de mero observador para a liberdade do povo da passividade e impotência.
- O Psicodrama pedagógico (de Jacob Levi Moreno), que propõe improvisações a partir de situações traumáticas das relações do homem consigo mesmo ou com um grupo (sociodrama) para o desenvolvimento da espontaneidade, criatividade, auto-avalição e até cura dos traumas;
- A ênfase dada pelos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1999) no crescimento das crianças como cidadãs plenamente reconhecidas e conscientes de seu papel na sociedade.
Sobre esse ponto, faz-se necessária uma reflexão mais profunda.
OS PCN E A DISTÂNCIA ENTRE TEORIA E REALIDADE
O princípio de formação para a cidadania presente nos PCN-Arte refere-se não apenas ao Teatro, mas também às outras três linguagens artísticas (Dança, Artes Visuais e Música) já que de acordo com o documento a polivalência das linguagens é presença fundamental no currículo escolar. No entanto, deve-se estar atento a essa “normatização” pois é delegada à
escola a tarefa de decidir qual modalidade artística irá implementar, o momento mais adequado para promover o estudo de uma ou de outra linguagem e a duração de cada uma das atividades curriculares. E na realidade, em função de um processo histórico, o que se vê é a hegemonia das Artes Visuais.
Para todas as linguagens, os PCN-Arte fazem atribuição às múltiplas linguagens no currículo e a dimensão de produzir, apreciar e contextualizar a arte como experiência estética e de educação cognitiva. Esse conceito refere-se à proposta triangular de Ana Mae Barbosa,
que, apesar de muito interessante, é na realidade também uma transposição de uma metodologia original das Artes Visuais que ainda não foi bem entendida e aplicada às demais linguagens artísticas.
Um dos problemas para o desenvolvimento das múltiplas linguagens em sala de aula é que as escolas não possuem a mínima estrutura para a atuação dessa prática de modo efetivo em função de falhas estruturais e conjunturais que se desdobram em outras questões no que se refere ao ensino da arte. Podem-se pontuar algumas como: a carga horária destinada às artes; a carência material; a formação de professores; a desvalorização da área em relação às demais disciplinas do currículo. Esses problemas específicos da área de artes agravam-se quando somados aos problemas da educação como um todo, como a baixa remuneração do magistério, a falta de tempo para a preparação do professor e preparação didática das aulas, a
insuficiência e má qualidade de material didático... etc.
Aí se questiona não apenas os dizeres dos PCN-Arte, mas as próprias Leis de
Diretrizes e Bases (LDB 9394/96) que estabelecem orientações para a educação nacional e relacionam-se diretamente com o Ensino das Artes ao afirmarem os princípios de que: a educação deve ter abrangência de processos formativos pelas manifestações culturais; que é um fim da educação “a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber”; que é um direito um dever o “acesso aos níveis mais elevados de ensino, da pesquisa e da criação artística a capacidade de cada um”; que se faz necessários padrões mínimos na qualidade de ensino; e, sobretudo, o Parágrafo 2 do artigo 26 que afirma:
“O Ensino da Arte se constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos”. (GOVERNO FEDERAL, 1996)
Essa realidade pode ser criticada pelo ponto de vista de todas as linguagens artísticas e mesmo das demais áreas do conhecimento. Mas nos PCN-Arte, ainda, podem ser pontuadas outras falhas que refletem diretamente na distância entre a teoria descrita e a prática na
linguagem específica do Teatro. Algumas são apontadas no artigo intitulado “Ensinando Teatro: uma análise crítica das propostas dos PCN” (PEREGRINO. Y; ARÃO, P.S, s.d), que destaca:
- as considerações introdutórias sobre o Teatro do documento para as séries iniciais têm um caráter vago com argumentos que poderiam ser aplicados a qualquer área do conhecimento;
- a falta de orientações didáticas específicas nas séries iniciais;
- a abordagem superficial da opção epistemológica que fundamenta a importância do Teatro nas etapas de desenvolvimento da criança;
- o mau emprego das terminologias específicas, como o Jogo;
- a escassez de bibliografias referentes ao ensino do Teatro;
- a pouca instrução no que se aponta como eixos norteadores;
- as características genéricas ou totalizadoras, apesar dos conteúdos bem formulados;
- a mudança de nomenclatura, sem justificativa, de “ator/espectador” para
“atuante/público” do documento destinado aos primeiros e segundos ciclos e terceiro e quarto do Ensino fundamental;
Por essas e outras questões, vale destacar o comentário que os autores do artigo fazem na “análise crítica” das propostas do documento ao observarem que:
Isso reflete nossa preocupação quanto ao risco de o ensino se tornar muito teórico, situando-se, a maior parte do tempo, no plano discursivo, recaindo na didática tradicional, num pseudo-aprendizado baseado na memorização, na prática apenas decorativa das possibilidades de um ato verdadeiramente criador. (PEREGRINO; SANTANA, p.05)
Tais apontamentos e reflexões explicitam algumas deficiências dos parâmetros apresentados no documento que – é importante lembrar- fora concebido sobre as bases de políticas públicas liberais. Além do que, como descreve outro documento dessa natureza, as Diretrizes Curriculares de Arte e Artes para a Educação Básica do Paraná (2006, p.21):
Os PCN foram produzidos e distribuídos antes da elaboração das Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN) para o Ensino Fundamental e Ensino Médio, que
deveriam balizar a formulação dos Parâmetros. Além da pouca participação dos professores na produção dos PCN, os encaminhamentos adotados foram
questionados, porque sugeriam que o planejamento curricular fosse fundamentado no trabalho com temas e projetos de modo que os conteúdos seriam deixados em segundo plano. A falta de clareza na fundamentação teórica para subsidiar o trabalho do professor também causou esvaziamento desses conteúdos.
Apesar disso, os PCN-Arte representam um avanço nas conquistas dos Arte-
Educadores brasileiros, de modo que é fundamental que esses estejam atentos para que se fortaleça e prossigam tais conquistas. Isso porque essa é uma história de muita luta que até hoje se faz necessária. Dessa forma, é fundamental a ampliação de discussões e resoluções práticas acerca dos horizontes que propõe o documento para o desenvolvimento concreto do Teatro na sala de aula como prática pedagógica e demais campos de atuação. São ações também para um conseqüente fortalecimento da área como conhecimento e para que se efetivem as contribuições cognitivas, sociais e psicológicas que o Teatro tem a oferecer.
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE TEATRO COMO PERSPECTIVA DE MUDANÇAS
Para que no futuro o teatro na educação assuma o seu verdadeiro papel, que é o de contribuir para o desenvolvimento emocional, intelectual e moral da criança, correspondendo fielmente aos seus anseios e desejos, respeitando-lhe as etapas do pensamento que evolui do concreto para o formal, para dar-lhe uma visão de mundo a partir da marcha gradativa das suas próprias descobertas é preciso que se atendam dois pontos essenciais:
- a preparação dos professores
- o apoio governamental, isso é, uma efetiva ação do Ministério da Educação e da Cultura. (REVERBEL, 1979, p. 155)
A análise das teorias dos PCN-Arte e a realidade prática do sucateamento escolar estão bem distantes do que priorizam as Diretrizes e contextualizam o que se pode chamar, irônicamente, de efetiva ação do Estado na realidade do Teatro na Educação formal. Assim, tendo em vista a citação de Reverbel (1979), mais do que nunca se faz fundamental uma
solidez na formação de professores como perspectiva de novos horizontes. É nesse processo que se norteia o conhecimento e consciência de quem atuará na prática da pedagogia do Teatro. E tal como o ensino dessa arte deve ser desenvolvido de forma contínua e sistemática, também deve ser assim a formação do Professor.
Faz-se fundamental nessa formação que se dê uma atenção para a histórica luta pelo estabelecimento do teatro na escola. É bom sempre lembrar que o ensino da arte só apareceu em plena ditadura militar a partir da lei 5692/71 como obrigatoriedade da educação, então denominado Educação Artística. (a LDB de 1961 instituía o ensino de artes, porém não de
forma obrigatória) A lei, contraditoriamente, exigiu professores com habilitações específicas obtida em curso de graduação de licenciatura plena, mas ignorou a inexistência de cursos universitários para a formação dos mesmos.
Depois de três anos é que o governo federal criou cursos para a preparação dos professores de educação artística, contudo, eram cursos de licenciatura curta que em dois anos tentavam capacitar o professor para todas as linguagens e para todas as séries. A conseqüência prática no ensino das artes levou as escolas buscarem pessoas de áreas do conhecimento afins (comunicação e expressão e educação física) para ajudar a resolver o problema do currículo mínimo exigido pelo MEC.
A criação das licenciaturas plenas com linguagens específicas ocorreu somente no fim da década de 70, porém com fragilidade de bases teórico-conceituais, o que ainda hoje representa uma grande lacuna no que se refere à formação do professor de Teatro. Muitos não conhecem abordagens metodológicas que dão o suporte epistemológico do saber (como as citadas teorias de Brecht, Boal, Spolin, Reverbel, Moreno...), o que é undamental, pois:não somente na esfera do teatro como em qualquer área do conhecimento, os pressupostos metodológicos de uma metodologia de ensino necessitam proporcionar o conhecimento da estrutura teórico-prático dos procedimentos que levam à aprendizagem, ensejando a incorporação do pólo instrucional ao pólo sócio-cultural. Nessa trajetória, o que se convencionou denominar de metodologia do ensino adquire um valor relativo que se configura no enlace entre educador e educando, em meio às condições objetivas (matéria, situação escolar, ambiente etc.) e subjetivas (pessoas, comunidades, etc.). (KOUDELA; ARÃO, 2006, p. 63)
Por esse desconhecimento, muitas vezes o que os professores fazem quando atuam em sala de aula é, ainda, a reprodução de práticas pedagógicas ligadas aos modelos da Escola Tradicional ou Nova que enfatizam apenas a imitação ou o espontaneísmo como “produção” ou “educação” artística.
Assim, além da consciência do processo histórico da arte educação de bases
conceituais sólidas, uma formação do professor também deve priorizar essa natureza intrínseca: o papel do educador. Muitas vezes o arte-educador se deparará com uma série de problemas que na prática não estão em teoria alguma e, nesse sentido, sempre são vivos os princípios de Paulo Freire, maior representante da Escola Progressista, sobre a consciência do papel do educador.
Como foi dito, a história do ensino da arte no Brasil demonstra uma afinidade com os modelos de educação da Escola Tradicional e Nova3. É por se fazer necessária uma mudança que a Escola Progressista parece ser o que mais fundamenta a prática de ensino de Teatro que se pretende.
O modelo progressista é inspirado nas idéias de Paulo Freire e quer analisar criticamente a realidade social, fundamentando-se na problemática sociopolítica da educação.
Esse modelo promove a relação horizontal entre professor e aluno pois educador e educando são sujeitos do ato do conhecimento; A partir de situações problemas, a aprendizagem torna-
3 A Escola Nova é de fundamental importância na história do Teatro Educação pois foi a partir desse movimento que o Teatro na educação adquiriu status epistemológico e importância psicopedagógica. O problema é que nela firmou-se uma idéia das artes apenas como livre expressão, sem considerar as dimensões históricas, sociais e cognitivas.
se motivadora e se dá através da discussão do grupo autogestor do processo: trata-se de uma educação humanizadora que destaca idéias de que essa prática se passa em um espaço coloquial e afetivo e que busca o diálogo, a ética, a liberdade e a transformação individual e social. O processo educacional se faz de forma dialética no qual o educando constrói o conhecimento a partir do contexto que funde aprendizagem e experiência social através de uma antropologia política (de compaixão e solidariedade humanista) e uma epistemologia histórico-cultural de crença e fé nos seres humanos para a mudança de um mundo de opressões e injustiças.
A abordagem progressista olha a escola além de seus muros, inclui o lar, as
atividades sociais, religiosas, enfim todo o entorno em que vive o aluno. É uma educação para a transformação do sujeito e do mundo. Visa à realização de uma consciência crítica e superação do “saber de experiência feito” (FREIRE, 1992, p.107). O conhecimento se prolonga a outros sujeitos numa relação sujeito-objeto-sujeito: é a consciência do mundo que impulsiona a ação para a transformação da realidade, com a escolha do conteúdo, feita pelo aluno, visando trabalhar os conflitos de seu espaço de convivência. Professor e aluno caminham juntos e “o professor deverá ser mais criativo e aprender com o aluno e o mundo”.
(GADOTTI, 2000, p.107).
Vale lembrar que a metodologia de Augusto Boal se apropria explicitamente da proposta de Paulo Freire quando vai buscar, através do Teatro, a superação do conflito opressor/oprimido. Mas o que se pretende nesse artigo, ao falar em abordagem Progressista, é mostrar que esses princípios devem estar subjacentes em qualquer metodologia do ensino do Teatro. Aliás, uma utopia é que esteja não apenas no Teatro, mas em todas as linguagens e em todas as áreas do conhecimento, pois como preza Freire (1999); é impossível existir sem sonhos!
Para ele, formar professores como profissionais reflexivos passa por fundamentos que exigem a consciência do educador de que:
- estamos a repetir um modelo já conhecido de política de reforma, uma regulação do centro para a periferia em que uma orientação política emanada de um governo central para a periferia de instituições locais que é reforçado através de um sistema de prêmios e punições. O resultado disso é uma espécie de jogo paralelo entre as escolas na periferia , que continuam a fazer as mesmas atividades, e as autoridades centrais ou
regionais que tentam controlar os comportamentos das escolas.
- precisa –se questionar: quais competências os professores deveriam ajudar as crianças a desenvolver? ; que tipos de conhecimentos e saber fazer permitem os professores desempenhar seu trabalho eficazmente? que tipos de formação serão mais viáveis para equipar os professores com as capacidades necessárias ao desempenho do seu trabalho?
- deve-se compreender como se passa a crise de confiança no conhecimento
profissional;
- há necessidade de buscar uma nova epistemologia de prática profissional e vencer o conflito entre saber escolar e a reflexão- na- ação dos professores e alunos;
No ensino do Teatro, o paradigma da Escola Progressista afina-se com o que Japiassu (2001) denomina de educação pós-modernista4, que se inicia a partir da queda do muro de Berlim (1989) e da derrocada do socialismo no Leste Europeu (1991). É resultante de uma descrença no poder da ciência e do trabalho para a solução da gama de problemas humanos, e,
4 Ricardo Japiassu em seu livro Metodologia do Ensino do Teatro denomina como modelo pós-modernista a proposta triangular. Em função de esse segundo termo ser ligado as Artes Visuais, prefiro adotar apenas ao “pósmodernista” como busca de uma identidade própria para a linguagem do Teatro.
numa visão epistemológica ampla (no que se refere na história do conhecimento humano) é uma concepção que faz parte do Paradigma da Complexidade, como se verá adiante.
Busca-se na educação pós-modernista um posicionamento crítico e auto-reflexivo do sujeito que considera a subjetividade, as relações complexas e metassistemáticas como alternativa para substituição da “consciência fragmentária, deformada e não emanciapada” (JAPIASSU, 2001, p.13) da sociedade contemporânea. Uma alternativa ao contexto presente
de coisificação do sujeito e das relações e no qual se vive mais o simulacro da realidade do que ela em si e cujos valores burgueses da modernidade (como a família) foram substituídos pelo individualismo, efemeridade e presentificação. Nessa prática o autor destaca a
importância de se trabalhar o conceito de Indústria Cultural no Ensino do Teatro, já que essa teoria apresenta como a cultura também fora revertida em mercadoria na sociedade capitalista pós-moderna. Uma prática pedagógica do ensino do Teatro que se busca possibilitará o aluno vivenciar a arte não como produto da cultura de massa - como vem se oferecendo monicamente - mas sim como experiência estética, sensível e cognitiva, como é o Teatro
na Educação que se quer, afinal:
Se, na atualidade, a dissolução total das singularidades em modelos
predeterminados e idealizados de ação encontram-se ao alcance das mãos – e do bolso- do “consumidor”, o ensino modernista tardio de teatro, na perspectiva de uma educação emancipadora, necessita então contribuir para que o sujeito se conscientize desse processo de reificação ou coisificação no qual somos todos enredados com o advento da indústria cultural. (JAPISSU, 2001, p. 15)
Em processos de aprendizagem essa conscientização passa pela compreensão da
compreensão (metateorias e metasistemas cognitivos) através de diálogo, intertextualidade, intersubjetividade, da construção fenomênica da pesquisa e experiência, enfim, da construção do conhecimento. Nas práticas do Ensino de teatro seja qual for a abordagem metodológica escolhida, por esse viés o conhecimento se torna efetivo, pois é um instrumental gnificativo para que o sujeito atue criticamente na vida e sociedade, isso é, questione e interfira nas singularidades apresentadas. Destaca-se aí a contribuição das idéias de Complexidade do filósofo Francês Edgar Morin como uma nova epistemologia que busca a ligação entre o todo e as partes no saber fragmentado em todas as dimensões sociais.
CONTRIBUIÇÕES DA COMPLEXIDADE PARA O TEATRO NA EDUCAÇÃO
O termo complexidade surgiu no final dos anos 60, advindo da cibernética, das teorias dos sistemas e do conceito de auto-organização. A palavra deve lembrar problema, não solução, pois não é utilizada para designar idéias simples, nem se reduz a uma única linha ou vertente do pensamento, e sim a todas as influências recebidas, internas e externas (PETRAGLIA, 1995, p. 77). Etimologicamente, vem do latim complexus, que significa o que
abrange muitos elementos ou várias partes. É a qualidade do que é complexo, um conjunto de circunstâncias ou coisas interdependentes que apresentam ligações entre si, uma congregação de elementos que são membros e participantes do todo. Esse é uma unidade complexa, ao mesmo tempo em que não se reduz a mera soma dos elementos que constituem as partes.
O Complexo envolve a auto-regulação, a produção e organização, a autonomia e dependência, a complementaridade entre antagônicos em detrimento da exclusão, a reintrodução do conhecimento no conhecimento como algo infinito. São metassistemas que se comunicam para que se tenha compreensão crítica e construtiva da relação entre sujeito e objeto considerando o que o paradigma moderno de conhecimento (o racional) exclui o que é muitas vezes responsável por tantas deficiências não só na educação, mas na sociedade toda
5. No volume IV – As Idéias de O Método (a obra mais completa e densa de Edgard Morin, na qual o autor sistematiza os passos na direção de uma estrutura de investigação científica, sugerindo a reflexão do ser e do saber considerando os múltiplos e variados aspectos que os fazem complexos), o autor apresenta o conceito de metassistemas e metapontodevistas (contextos); são brechas que abrem perspectivas no campo da epistemologia para o conhecimento complexificador, infinito. A lógica da complexidade considera (inclusive surge daí), as contradições, ambigüidades, incertezas, irracionalidades porque dialoga com o mundo real para ser significativa.
Essa lógica quer o desenvolvimento da Inteligência, entendida como a ação exercitada pela organização. A Inteligência da Ação então se manifesta na capacidade de reconhecer os atos, ações, funcionamentos, comportamentos e são índices que permitem o acesso aos enunciados que descrevem o fenômeno e estabelecem referências aos verbos indicadores da ação. Envolvem: processos, processadores, funcionamentos, movimentos, transformação e
evolução. Com esses domínios, na aprendizagem é possível propor um modelo reproduzível e programado conhecendo o contexto do projeto da ação. “Um outro olhar, um outro modo de representação que privilegia o ato e não mais o ser, o movimento e não mais a substância imóvel” (MORIN e MOIGNE, 2000, p. 228), como a transformação que se opera na educação que propõe Paulo Freire.
Ação é qualquer forma de articulação inteligível, de jogo, intermediação que suscita a ocorrência de comportamentos imprevisíveis e inteligíveis, formando a organização (fenômeno organizado adicionado ao produto da organização e o organizante). É o que vai mediar a relação entre matéria e energia, a informação e a organização que mantém, que reúne e produz (transforma) a ação e seu resultado. “A organização é a ação de, ao mesmo tempo, manter e se manter, reunir e se reunir, produzir e se reproduzir” (MOIGNE, 2000, p. 236).
Na prática, ocorre através da articulação das funções de fazer, regular, informar, memorizar, decidir, coordenar, imaginar, finalizar, nas quais a complexidade aparece como um instrumento modelizador.
A Inteligência Ativa está atuante no jogo de complementaridade presente na relação com a complexidade: a inteligência ergue e descobre as faces escondidas da complexidade e a complexidade busca ativar a inteligência. Por esse motivo que a reforma do pensamento proposta por Edgar Morin deve processar-se pela reforma do ensino e vice-versa. Pensar um novo paradigma de conhecimento, portanto, implica em pensar uma nova educação com todas
as considerações até aqui levantadas.
O Teatro, assim, pode ser a brecha que se abre na nova perspectiva da ciência e ensino-aprendizagem, pois envolve essencialmente o que o soberanismo da lógica clássica e do modelo racional excluía; o ilógico, as possibilidades (o “vir a ser”), a intuição, a intersubjetivação, a criatividade... enfim, elementos existentes nas relações dessa manifestação artística e que são princípios para a concepção de Inteligência na Complexidade e vice-versa.
5 Muitos trabalhos de Morin e outros autores com pesquisas sobre os novos paradigmas pontuam o que vem a ser essas dificuldades na sociedade sob o ponto de vista da política, ecologia, espiritualidade, economia,etc. Alguns
autores são; Fritjopf Capra, Pedro Demo, Ubiratan D’ Ambrósio, A . R Damásio...
Nessa brecha está o desafio das artes na produção do conhecimento, rompendo com o padrão que por tanto tempo inferiorizou o status cientifico da arte na história do conhecimento, afinal;
Tanto a arte como a ciência respondem sempre às condições histórico-concretas da vida da sociedade. Estão determinadas pelo Estado e o caráter das relações de produção (...) Isto determina a existência de uma estreita relação entre o reflexo artístico que se traduz em imagens artísticas, e o pensamento científico, que o faz em conceitos, categorias e leis. Tanto o pensamento artístico como o científico refletem o mundo objetivo e se desenvolvem com a prática social. (DURÀN in CARREIRA e CABRAL, p. 12, 1996)
Arte é forma de conhecimento, pois envolve a história, a sociedade, a vida. Não está apenas ligada a idéia de prazer estético, contemplação passiva, mas ao contrário, é dinâmica e representa trabalho já que possui forças materiais e produtivas que impulsionam as relações históricas e sociais e levam o homem à compreensão de si mesmo e da sociedade. A arte
proporciona prática criadora à luz das relações sociais, culturais e estéticas levando em conta as transformações nas novas configurações de tempo e espaço. Compreendê-la como processo social, é, portanto, chamá-la de produção cultural e conhecimento humano. As transformações históricas que se operam nas estruturas artísticas e suportes físicos e materiais possibilitam atualização e construção do conhecimento artístico, já que é um produto social que utiliza recursos técnicos e forças produtivas que contribuem para determinar o grau de desenvolvimento da produção da sociedade e impulsiona as relações de distribuição e consumo da produção estética. O processo representa uma teia de relações humanas baseadas
em produções simbólicas, estéticas, estésicas e críticas que interferem no tempo e espaço humano.
São essas interferências que promovem transformações qualitativas de significados, por isso também promovem uma educação para a contradição –como prioriza a complexidade- e para a resistência e transformação – como é o ideal Progressista. Isso é, uma visão emancipatória, com ânsia em converter a potência repressora dos modelos dominantes apontados nesse artigo.
Aí é pertinente o questionamento feito por Ruben Alves (1999) no texto “O que é Científico?” que desmitifica o caráter de “guardião da verdade” que o cientificismo clássico (do paradigma racional ou moderno) traz intrinsecamente.
No texto o autor afirma ser científico aquilo que caiu nas redes reconhecidas pelas confrarias dos cientistas; os que pescam no grande rio, mas cujas redes não captam os céus, as matas e tudo demais que existe na natureza e sociedade. Dessa forma, concordando com Alves, as questões até aqui apresentadas não visam “elevar as artes a um status de ciência”,
mas sim buscam argumentar sobre a importância de tê-las como parte dos valores sociais, culturais e de aprendizagem numa educação libertária.
Parece utópico, principalmente no contexto “extremamente capitalista, cujos valores éticos, estéticos e morais soam guiados pela ganância do lucro e da massificação da cultura de mídia, do consumo”, como afirma Paiva (2003, p. 118). Mas é aí que está o papel do professor na escola e da universidade na formação desse professor, afinal, são mediadoras da
produção e reprodução de conhecimento (que aqui foca o Teatro).
Paiva (2003, p.118) afirma ainda que o processo de construção do conhecimento (cujo princípio básico é a educação) é imanente do diálogo do homem consigo mesmo, e, esse tem seu primórdio na expressão artística das pinturas rupestres ou na imitação que os filhos e amigos faziam do homem. Ele escreve que se a arte é práxis criadora, a educação deve ser considerada uma arte, principalmente na contemporaneidade. A recíproca é válida e as práticas na sala de aula são mais que necessárias para essa conquista e por isso reforça-se aqui a importância da formação do professor.
O autor ainda demonstra que vários pesquisadores relacionam ética e estética:
Domenico de Masi afirma que foi a sociedade moderna, industrial, que expulsou o belo, o sensível e o estético do mundo do trabalho; Benedito Nunes diz que o poder da técnica moderna, o trabalho industrial monótono torna-se cada vez mais um processo impessoal, refratário às necessidades criadoras e expressivas do indivíduo; Ortega y Gasset acredita que uma desumanização da arte é como desumanização da sociedade (PAIVA, 2003, p.119) Dessa forma, ações como as descritas no artigo visam um aprofundamento nas bases teóricas e práticas do Teatro na Educação para que esse, enquanto arte, seja entendido em sua ampla dimensão na escola e sociedade, e, não como lazer, recreação ou “luxo” como vem se reproduzindo predominantemente, mas como forma de conhecimento que possibilita a aprendizagem a partir dos saberes específicos.
Apresenta-se, assim, através do ensino do Teatro, a importância do desenvolvimento de uma educação Progressista para o desenvolvimento do pensamento complexo na amplitude da capacidade de viver relacionando as partes com o todo; do pensar sobre pensar o próprio pensar e da consciência e autonomia que melhoram as perspectivas individuais e coletivas, uma necessidade é urgente diante do contexto atual que renega o conhecimento não racional e sensível e valoriza a cultura como produto. Um novo olhar através do Teatro na educação que acessa com os saberes da área sentimentos, sensações, percepções e compreensões ao se entrar em contato com um texto, personagem, jogo teatral ou com um projeto de encenação.
Vive-se aí o novo que desafia, desperta, interrompe ou faz interromper alguma idéia. Essa disponibilidade está vinculada à capacidade cognitiva e expressiva, adquirida com a experiência teatral, estudos e técnicas. “Trata-se, portanto, de um processo de aprendizagem” (MACHADO, M. A., 2006, p. 100).
O olhar a partir desses apontamentos já deixa algumas pistas da ecessidade de continuísmo sobre as questões levantadas. Morin argumenta que as bases do pensamento racional (dedução e indução) tão dominante excluem a invenção e a criação. Ao chegar na questão paradigmática da lógica da complexidade, afirma que a racionalidade verdadeira é
aquela capaz de dialogar com a poesia: há clareza sobre a necessidade de novas gerações de sistemas de aprendizagem, como o que propõe o Teatro na Educação.
Há ainda inúmeras questões que merecem estudo e investigação no que se refere às buscas de bases mais sólidas para o Teatro na Educação; tem-se muito para se pesquisar. Esse artigo defende, nesse universo todo, a busca pelo conhecimento complexo num paradigma Progressista de educação a partir do ensino do Teatro, cuja mudança deve ser efetuada na prática, em todos os níveis de educação.
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A pedagogia de modo geral está repleta de comunistas e socialistas com suas idéia políticas malignas e maquiavélicas que tentam conspirar contra a humanidade e a liberdade. Os comunistas sempre foram umas pestes como foram os nazistas. O nazismo conseguiu mostrar ao mundo em uma década toda a imbecilidade das idéias ultranacionalistas que não pouparam nem mesmo um povo tão inteligente como os alemães (sem necessariamente serem arianos), na prática o nazismo do diabólico Hitler levou a morte 50 milhões de pessoas que morreram na bestial Segunda Guerra Mundial. Quem conhece as histórias de perseguição aos cristãos e aos demais religiosos do mundo sabe como o comunismo ( esta obra satânica) destruiu milhões de vidas ao longo do século vinte, por ser um movimento que agiu durante décadas, talvez tenha matado mais que o nazismo. Os comunistas tentaram sufocar a religião, acusando de ópio dos povos, sendo suas idéias comunistas o CRACK que pulverizou a razão das nações comunistas, exemplo de ruína social e material como vimos na Rússia, em Cuba e no Leste Europeu.
SOCIALISMO
Ainda resta lixo ideológico parente do nazismo e do comunismo na nossa sociedade, idéias socialistas pregada por retardados mentais, que se presumem intelectuais e boa parte desta corja se refugiam a sombra da pedagogia tentando seduzir as nossas crianças aos ideais socialistas. Na política da América Latina este lixo ideológico continua vivo através de doentes mentais como Hugo Chavez e Evo Morales. O Brasil também contribui a esta fila de babacas e temos o Lula como seu expoente, ainda que nas últimas décadas, foi inteligente o suficiente para abandonar as idéias mais radicais da esquerda. Contudo a maior vergonha brasileira que tem contribuído para a derrocada da nossa educação é PAULO FREIRE, considerado o papa da pedagogia brasileira, para mim não passa de um comunista barato, e como todos os “metidos” comunistas se passam por intelectuais e causam impressão por suas falas com vocabulários sofisticados, mas com cabeças de girinos, nunca se transformam em príncipes, somente em SAPOS.
Tenho dito isto porque o texto abaixo está ideologicamente voltado a hipnose das crianças para transformá-las em combatentes das FARC. Estas idéias de ensinar as crianças a contestarem têm servido apenas para explicar a causa da violência escolar. O Senhor Paulo Freire e a sua corja tem estimulado a violência escolar, ao discretamente contaminar a educação brasileira com propagação de ideologias dos alunos contestarem os adultos. Devemos ensinar as crianças à disciplina, o respeito aos adultos e não serem estúpidos contestadores.
Estes malditos alimentam ideologicamente grupos criminosos como o PCC, basta vê os livros preferidos e estudados por Marcola. Estas ideologias de contestar a sociedade é típica dos criminosos, eles na verdade não gostam de trabalhar e receber ordem e o pior, não tem iniciativa empreendedora como os capitalistas, só sabem roubar e querem tomar o poder para desapropriar a quem tanto trabalhou. No Brasil este lixo da esquerda, formou vários grupos de cangaceiros como o MST (Movimento Sem-Terra). Deveriam ser presos e enforcados por formação de quadrilha. Temo que a esta altura o Brasil esteja deixando a educação na mão de gente como os autores do texto abaixo que só sabem criticar o capitalismo, loucos de vontade para roubarem o patrimônio de quem honestamente trabalharam para ter os seus bens...
O texto abaixo pertence a Juliana Cavassin (meu é que não é graças a Deus!!!!) que foi publicado na R.cient./FAP, Curitiba, v.3, p.39-52 , jan./dez. 2008 39 com o título:
PERSPECTIVAS PARA O TEATRO NA EDUCAÇÃO COMO CONHECIMENTO E
PRÁTICA PEDAGÓGICA
RESUMO: O presente artigo objetiva demonstrar que o Teatro na Educação, apesar de ser considerado uma área do conhecimento, em função de uma série de dificuldades teóricas e práticas ainda precisa do desenvolvimento de bases sólidas e profundas para uma maior estabilidade dentro de um paradigma científico. É considerada a importância do foco nos campos de atuação da Pedagogia do Teatro, sobretudo na educação formal (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e os Cursos Superiores) já que esses estão diretamente ligados aos locais de formação humana e produção
do conhecimento. Em longo prazo, há uma influência direta aos demais campos de atuação do Teatro na Educação e diminuição das fragilidades apresentadas nessa área do conhecimento. Nesse sentido, argumenta-se sobre a fundamental importância da informação e do questionamento a respeito de ações efetivas do Estado ligadas ao ensino do Teatro (com foco nos Parâmetros Curriculares Nacionais) e também a formação de professores dentro de uma perspectiva do Pensamento Complexo e da Educação Progressista.
PALAVRAS-CHAVE: arte e ensino; Parâmetros Curriculares Nacionais; formação de professores.
PERSPECTIVES FOR DRAMA IN EDUCATION AS KNOWLEDGE AND PEDAGOGICAL PRACTICE
ABSTRACT: The aim of this article is to demonstrate that due to a series of theoretical and practical difficulties, Drama in Education still needs to develop firmer and deeper support for a greater stability from a scientific stance, although it is already considered a knowledge field. The importance of focusing on the fields of Theatre Pedagogy is considered, especially in formal education (elementary, middle and high school, and college level), since these levels are related to the human formal training and knowledge production. In a long range, there’s a direct influence upon the other fields of application of Drama in Education and the reduction of the weaknesses presented in this field of
knowledge. Emphasis is placed on the importance of adequate information and the questioning of effective governmental actions (focusing on the Brazilian Curriculum Guidelines) as well as teacher education from the stance of Complex Thought and Progressive Education.
KEYWORDS: art teaching; Brazilian curriculum policies; teacher development.
∗Licenciada em Artes Cênicas pela Faculdade de Artes do Paraná (2002) e em Jornalismo pela PUC-PR (2002) com Especialização em Fundamentos do Ensino das Artes (Faculdade de Artes do Paraná, 2004). È Mestre em
Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (2006) e Professora do Curso de Licenciatura em Teatro da Faculdade de Artes do Paraná (desde 2007) e de Teatro do Ensino Fundamental e Ensino Médio do
Colégio Nossa Senhora Medianeira (Curitiba, P.R) desde 2003. Também presta assessorias e oficinas para instituições como SENAC e UFPR, nas áreas de Artes e Comunicação. R.cient./FAP, Curitiba, v.3,p.39-52 , jan./dez. 2008 40
O Teatro na Educação como uma nova área do conhecimento (KOUDELA, 2006) é
uma conquista. No entanto muitos fatores ainda limitam e dificultam a sedimentação não apenas no que se refere às pesquisas teóricas como ao desenvolvimento de práticas significativas também.
Na história da produção científica, em função da predominância do Paradigma
Moderno, Cartesino ou Racional, a relação arte e ciência já é algo bastante inovador. A supremacia dessa forma de conhecimento sobre aquela deixou, por séculos, a arte num status inferior (CAVASSIN, 20061). Assim, um dos problemas decorrentes, por exemplo, é a carência de material referente à metodologia de pesquisa e a identificação do objeto de estudo
em função do caráter processual e efêmero da arte (CARREIRA; CABRAL, 2006).
Todos esses aspectos são relevantes já que o Teatro é a base pistemológica dessa área2 que tem na Pedagogia do Teatro disciplinas de integração entre os pólos teatro e pedagogia e disciplinas limítrofes de ambas. Aí, a Pedagogia do Teatro tem como campos de atuação os Grupos Profissionais; a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio;
os Cursos Superiores; as Organizações Extra-Curriculares; o Lazer; os contextos: Social, Terapêutico e da Saúde e Empresarial. (KOUDELA, 2006).
O presente artigo focará a educação formal (da Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio no que se refere ao Ensino do Teatro e aos Parâmetros Curriculares Nacionais e ao Ensino Superior na importância da formação de professores) já que “a escola é primeiro espaço formal onde o aluno tem contato com o conhecimento sistematizado em arte” (GOVERNO DO PARANÁ, 2006).
Um Professor de Teatro com formação sólida atuará nas Escolas com consciência e qualidade no ensino, o que, em longo prazo, representa a mudança cultural ampla de caráter paradigmático, ou seja, em todos os campos de atuação da Pedagogia do Teatro e além deles.
Não há como negar a relação direta entre a formação de professores de Teatro, as práticas do Teatro na escola e as demais manifestações dessa área do conhecimento em toda a sociedade, como já apontava Loureiro em 1979 :
O teatro brasileiro só apresentará um nível profissional elevado na medida em que houver um público culturalmente maduro para assisti-lo e sustentá-lo. E este só poderá formar-se numa experiência educacional integradora que inclua a aprendizagem da relação arte/vida. De nada adianta a instalação de cursos superiores de arte dramática se essa dimensão não se fizer presente em todos os níveis do processo educativo. (CHAVES In: REVERBEL, 1979, p. ix,) Muito se sabe a respeito da importância do Teatro na Educação em todos os campos de atuação. Os princípios pedagógicos do Teatro traçam relações claras entre Teatro e educação, considerando essa arte como uma forma humana de expressão, a semiótica e a cultura. Daí a ênfase em aspectos sígnicos, simbólicos, de linguagem e comunicação que vem
1 Em minha dissertação de Mestrado (Contribuições dos Sete Saberes para a Prática Pedagógica do Teatroeducador do Futuro) traço um paralelo entre a Teoria da Complexidade de Edgard Morin como perspectiva epistemológica de um novo paradigma do conhecimento e o ensino do Teatro dentro de um novo paradigma de educação.
2 Em artigo intitulado “Pedagogia do Teatro” Ingrid Koudela (2006) afirma que o embasamento epistemológico no Teatro para a área do conhecimento do Teatro na Educação deve-se a camisa-de-força gerada pela visão estreita dos conceitos de pedagogia, didática e metodologia.
sendo estudados e sistematizados na área, donde podem se destacar algumas idéias emetodologias como:
- O teatro como conhecimento que é busca respostas para os questionamentos sobre o que é o mundo, o homem, a relação do homem com o mundo e com outros homens nas teorias contemporâneas do conhecimento que propõem novos paradigmas para a ciência como a complexidade do pnsador Edgard Morin, que será explicada mais adiante;
- Abordagens Psicopedagógicas (sobretudo de Piaget nos estudos de Olga Reverbel) que apontam para o desenvolvimento de linguagem e representação, o exercício artístico e coletivo; a construção de conteúdos inerentes à personalidade por intermédio da estética e o valor emocional. Segundo Olga Reverbel (1979), teatro é a arte de manipular os problemas humanos, apresentando-os e equacionando-os. A autora defende a função eminentemente
educativa, e destaca que a instrução ocorre através da diversão.
A educação está no desenvolvimento emocional, intelectual e moral da criança, correspondente aos desejos, anseios e proporcionar uma marcha gradativa das próprias experiências e descobertas. Isso porque possui uma concepção totalizante que implica e compromete todas as potencialidades
do indivíduo e permite o alcance da plenitude da dimensão social com o desenvolvimento da auto-expressão. Para a autora, a importância da diversão justifica-se porque imitar a realidade brincando aprofunda a descoberta e é uma das primeiras atividades, rica e necessária, no
auxilio do processo de eclosão da personalidade e do imaginário que constitui um meio de expressão privilegiado da criança. Olga defende ainda que na infância tem-se a necessidade de brincar, jogar para se orientar no espaço, pensar, comparar, compreender, perceber, sentir para descobrir o mundo, integrar-se com o meio, construir o conhecimento e a socialização.
Nessa concepção, o teatro aplicado à educação possui o papel de obilização de todas as capacidades criadoras e o aprimoramento da relação vital do indivíduo com o mundo contingente; as atividades dramáticas liberam a criatividade e humanizam o indivíduo pois o aluno é capaz de aplicar e integrar o conhecimento adquirido nas demais disciplinas da escola e, principalmente, na vida. Isso significa o desenvolvimento gradativo na área cognitiva e também afetiva do ser humano.
- Courtney (2001) enfatiza através da história do teatro-educação dos gregos à atualidade que essa é uma maneira fundamental de aprendizagem por permitir o confronto dos problemas da existência e das modificações mentais necessárias para resolvê-los. Nessa perspectiva, o jogo teatral pode ser aplicado em todas as áreas com a importância de sua força
motivadora que é a de criar o significado da existência humana. O autor aborda o jogo, teatro e pensamento baseado nas teorias de antropologia e psicologia social, psicanálise e psicologia infantil, nas modernas teorias do conhecimento, behaviorismo da imitação, na psicolingüística e também na psicologia do desenvolvimento de Piaget. Em psicanálise, ele demonstra que o jogo é reflexo do pensamento inconsciente baseado na experiência da criança cujo objetivo é a reprodução em forma simbólica das experiências não solucionadas da vida e a busca de soluções. Freud acreditava que a criação é uma continuação e substituição para o jogo infantil.
O jogo permite, assim, a criança re-experimentar os acontecimentos e através da repetição ganhar o domínio sobre eles. Courtney tem considerável pesquisa que demonstra a relação direta entre o Jogo Dramático e o processo criativo essencial para o desenvolvimento
imaginativo. O autor defende que a imaginação dramática está no centro da criatividade humana, já que desde a infância a criança, ao final do primeiro ano, quando brinca pela primeira vez finge ser outra pessoa e desenvolve o humor, personifica o outro. Essa identificação é princípio básico do processo dramático e segue na juventude quando se imita algo e na fase adulta, quando se coloca no lugar de alguém. Para ele, a educação Dramática deve estar no centro de qualquer forma de educação que vise o desenvolvimento das características essencialmente humanas, pois a imaginação é a característica essencial que diferencia o homem dos primatas superiores, e, essa é essencialmente dramática.
- O aprendizado da linguagem teatral própria (da qual se destacam os trabalhos de Viola Spolim sobre o Jogo Teatral) que possibilita o desenvolvimento da sensibilidade, percepção e conhecimento das especificidades cognitivas ligadas à prática da improvisação.
De acordo com Ingrid Koudela (apud SPOLIN, 1985, p.12), o jogo teatral na educação é importante forma de aprendizagem cognitiva, afetiva e psicomotora através do processo de transformação do egocentrismo em jogo socializador. A criatividade dramática auxilia o pensamento criativo e desenvolvimento social, pois efetiva a passagem do teatro como ilusão
para o teatro como realidade cênica;
- O teatro como educação política e de ação e reflexão, presente nas propostas metodológicas do Teatro do Oprimido de Augusto Boal (diretamente ligado a concepção de educação de Paulo Freire, como também se falará adiante) e Teatro Didático de Bertold Brecht. A proposta dramática brechtiniana se insere na filosofia marxista e busca uma solução
reintegradora para a sociedade e para a alienação artística através do Teatro Épico e Dialético que rompe a atitude passiva do espectador. Já o Teatro do Oprimido- que surgiu da necessidade de reação às relações ditatoriais na América Latina na década de 1960 - conclui uma total desativação do papel do espectador, tendo em vista a libertação do papel de mero observador para a liberdade do povo da passividade e impotência.
- O Psicodrama pedagógico (de Jacob Levi Moreno), que propõe improvisações a partir de situações traumáticas das relações do homem consigo mesmo ou com um grupo (sociodrama) para o desenvolvimento da espontaneidade, criatividade, auto-avalição e até cura dos traumas;
- A ênfase dada pelos PCN (Parâmetros Curriculares Nacionais, 1999) no crescimento das crianças como cidadãs plenamente reconhecidas e conscientes de seu papel na sociedade.
Sobre esse ponto, faz-se necessária uma reflexão mais profunda.
OS PCN E A DISTÂNCIA ENTRE TEORIA E REALIDADE
O princípio de formação para a cidadania presente nos PCN-Arte refere-se não apenas ao Teatro, mas também às outras três linguagens artísticas (Dança, Artes Visuais e Música) já que de acordo com o documento a polivalência das linguagens é presença fundamental no currículo escolar. No entanto, deve-se estar atento a essa “normatização” pois é delegada à
escola a tarefa de decidir qual modalidade artística irá implementar, o momento mais adequado para promover o estudo de uma ou de outra linguagem e a duração de cada uma das atividades curriculares. E na realidade, em função de um processo histórico, o que se vê é a hegemonia das Artes Visuais.
Para todas as linguagens, os PCN-Arte fazem atribuição às múltiplas linguagens no currículo e a dimensão de produzir, apreciar e contextualizar a arte como experiência estética e de educação cognitiva. Esse conceito refere-se à proposta triangular de Ana Mae Barbosa,
que, apesar de muito interessante, é na realidade também uma transposição de uma metodologia original das Artes Visuais que ainda não foi bem entendida e aplicada às demais linguagens artísticas.
Um dos problemas para o desenvolvimento das múltiplas linguagens em sala de aula é que as escolas não possuem a mínima estrutura para a atuação dessa prática de modo efetivo em função de falhas estruturais e conjunturais que se desdobram em outras questões no que se refere ao ensino da arte. Podem-se pontuar algumas como: a carga horária destinada às artes; a carência material; a formação de professores; a desvalorização da área em relação às demais disciplinas do currículo. Esses problemas específicos da área de artes agravam-se quando somados aos problemas da educação como um todo, como a baixa remuneração do magistério, a falta de tempo para a preparação do professor e preparação didática das aulas, a
insuficiência e má qualidade de material didático... etc.
Aí se questiona não apenas os dizeres dos PCN-Arte, mas as próprias Leis de
Diretrizes e Bases (LDB 9394/96) que estabelecem orientações para a educação nacional e relacionam-se diretamente com o Ensino das Artes ao afirmarem os princípios de que: a educação deve ter abrangência de processos formativos pelas manifestações culturais; que é um fim da educação “a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber”; que é um direito um dever o “acesso aos níveis mais elevados de ensino, da pesquisa e da criação artística a capacidade de cada um”; que se faz necessários padrões mínimos na qualidade de ensino; e, sobretudo, o Parágrafo 2 do artigo 26 que afirma:
“O Ensino da Arte se constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos”. (GOVERNO FEDERAL, 1996)
Essa realidade pode ser criticada pelo ponto de vista de todas as linguagens artísticas e mesmo das demais áreas do conhecimento. Mas nos PCN-Arte, ainda, podem ser pontuadas outras falhas que refletem diretamente na distância entre a teoria descrita e a prática na
linguagem específica do Teatro. Algumas são apontadas no artigo intitulado “Ensinando Teatro: uma análise crítica das propostas dos PCN” (PEREGRINO. Y; ARÃO, P.S, s.d), que destaca:
- as considerações introdutórias sobre o Teatro do documento para as séries iniciais têm um caráter vago com argumentos que poderiam ser aplicados a qualquer área do conhecimento;
- a falta de orientações didáticas específicas nas séries iniciais;
- a abordagem superficial da opção epistemológica que fundamenta a importância do Teatro nas etapas de desenvolvimento da criança;
- o mau emprego das terminologias específicas, como o Jogo;
- a escassez de bibliografias referentes ao ensino do Teatro;
- a pouca instrução no que se aponta como eixos norteadores;
- as características genéricas ou totalizadoras, apesar dos conteúdos bem formulados;
- a mudança de nomenclatura, sem justificativa, de “ator/espectador” para
“atuante/público” do documento destinado aos primeiros e segundos ciclos e terceiro e quarto do Ensino fundamental;
Por essas e outras questões, vale destacar o comentário que os autores do artigo fazem na “análise crítica” das propostas do documento ao observarem que:
Isso reflete nossa preocupação quanto ao risco de o ensino se tornar muito teórico, situando-se, a maior parte do tempo, no plano discursivo, recaindo na didática tradicional, num pseudo-aprendizado baseado na memorização, na prática apenas decorativa das possibilidades de um ato verdadeiramente criador. (PEREGRINO; SANTANA, p.05)
Tais apontamentos e reflexões explicitam algumas deficiências dos parâmetros apresentados no documento que – é importante lembrar- fora concebido sobre as bases de políticas públicas liberais. Além do que, como descreve outro documento dessa natureza, as Diretrizes Curriculares de Arte e Artes para a Educação Básica do Paraná (2006, p.21):
Os PCN foram produzidos e distribuídos antes da elaboração das Diretrizes
Curriculares Nacionais (DCN) para o Ensino Fundamental e Ensino Médio, que
deveriam balizar a formulação dos Parâmetros. Além da pouca participação dos professores na produção dos PCN, os encaminhamentos adotados foram
questionados, porque sugeriam que o planejamento curricular fosse fundamentado no trabalho com temas e projetos de modo que os conteúdos seriam deixados em segundo plano. A falta de clareza na fundamentação teórica para subsidiar o trabalho do professor também causou esvaziamento desses conteúdos.
Apesar disso, os PCN-Arte representam um avanço nas conquistas dos Arte-
Educadores brasileiros, de modo que é fundamental que esses estejam atentos para que se fortaleça e prossigam tais conquistas. Isso porque essa é uma história de muita luta que até hoje se faz necessária. Dessa forma, é fundamental a ampliação de discussões e resoluções práticas acerca dos horizontes que propõe o documento para o desenvolvimento concreto do Teatro na sala de aula como prática pedagógica e demais campos de atuação. São ações também para um conseqüente fortalecimento da área como conhecimento e para que se efetivem as contribuições cognitivas, sociais e psicológicas que o Teatro tem a oferecer.
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE TEATRO COMO PERSPECTIVA DE MUDANÇAS
Para que no futuro o teatro na educação assuma o seu verdadeiro papel, que é o de contribuir para o desenvolvimento emocional, intelectual e moral da criança, correspondendo fielmente aos seus anseios e desejos, respeitando-lhe as etapas do pensamento que evolui do concreto para o formal, para dar-lhe uma visão de mundo a partir da marcha gradativa das suas próprias descobertas é preciso que se atendam dois pontos essenciais:
- a preparação dos professores
- o apoio governamental, isso é, uma efetiva ação do Ministério da Educação e da Cultura. (REVERBEL, 1979, p. 155)
A análise das teorias dos PCN-Arte e a realidade prática do sucateamento escolar estão bem distantes do que priorizam as Diretrizes e contextualizam o que se pode chamar, irônicamente, de efetiva ação do Estado na realidade do Teatro na Educação formal. Assim, tendo em vista a citação de Reverbel (1979), mais do que nunca se faz fundamental uma
solidez na formação de professores como perspectiva de novos horizontes. É nesse processo que se norteia o conhecimento e consciência de quem atuará na prática da pedagogia do Teatro. E tal como o ensino dessa arte deve ser desenvolvido de forma contínua e sistemática, também deve ser assim a formação do Professor.
Faz-se fundamental nessa formação que se dê uma atenção para a histórica luta pelo estabelecimento do teatro na escola. É bom sempre lembrar que o ensino da arte só apareceu em plena ditadura militar a partir da lei 5692/71 como obrigatoriedade da educação, então denominado Educação Artística. (a LDB de 1961 instituía o ensino de artes, porém não de
forma obrigatória) A lei, contraditoriamente, exigiu professores com habilitações específicas obtida em curso de graduação de licenciatura plena, mas ignorou a inexistência de cursos universitários para a formação dos mesmos.
Depois de três anos é que o governo federal criou cursos para a preparação dos professores de educação artística, contudo, eram cursos de licenciatura curta que em dois anos tentavam capacitar o professor para todas as linguagens e para todas as séries. A conseqüência prática no ensino das artes levou as escolas buscarem pessoas de áreas do conhecimento afins (comunicação e expressão e educação física) para ajudar a resolver o problema do currículo mínimo exigido pelo MEC.
A criação das licenciaturas plenas com linguagens específicas ocorreu somente no fim da década de 70, porém com fragilidade de bases teórico-conceituais, o que ainda hoje representa uma grande lacuna no que se refere à formação do professor de Teatro. Muitos não conhecem abordagens metodológicas que dão o suporte epistemológico do saber (como as citadas teorias de Brecht, Boal, Spolin, Reverbel, Moreno...), o que é undamental, pois:não somente na esfera do teatro como em qualquer área do conhecimento, os pressupostos metodológicos de uma metodologia de ensino necessitam proporcionar o conhecimento da estrutura teórico-prático dos procedimentos que levam à aprendizagem, ensejando a incorporação do pólo instrucional ao pólo sócio-cultural. Nessa trajetória, o que se convencionou denominar de metodologia do ensino adquire um valor relativo que se configura no enlace entre educador e educando, em meio às condições objetivas (matéria, situação escolar, ambiente etc.) e subjetivas (pessoas, comunidades, etc.). (KOUDELA; ARÃO, 2006, p. 63)
Por esse desconhecimento, muitas vezes o que os professores fazem quando atuam em sala de aula é, ainda, a reprodução de práticas pedagógicas ligadas aos modelos da Escola Tradicional ou Nova que enfatizam apenas a imitação ou o espontaneísmo como “produção” ou “educação” artística.
Assim, além da consciência do processo histórico da arte educação de bases
conceituais sólidas, uma formação do professor também deve priorizar essa natureza intrínseca: o papel do educador. Muitas vezes o arte-educador se deparará com uma série de problemas que na prática não estão em teoria alguma e, nesse sentido, sempre são vivos os princípios de Paulo Freire, maior representante da Escola Progressista, sobre a consciência do papel do educador.
Como foi dito, a história do ensino da arte no Brasil demonstra uma afinidade com os modelos de educação da Escola Tradicional e Nova3. É por se fazer necessária uma mudança que a Escola Progressista parece ser o que mais fundamenta a prática de ensino de Teatro que se pretende.
O modelo progressista é inspirado nas idéias de Paulo Freire e quer analisar criticamente a realidade social, fundamentando-se na problemática sociopolítica da educação.
Esse modelo promove a relação horizontal entre professor e aluno pois educador e educando são sujeitos do ato do conhecimento; A partir de situações problemas, a aprendizagem torna-
3 A Escola Nova é de fundamental importância na história do Teatro Educação pois foi a partir desse movimento que o Teatro na educação adquiriu status epistemológico e importância psicopedagógica. O problema é que nela firmou-se uma idéia das artes apenas como livre expressão, sem considerar as dimensões históricas, sociais e cognitivas.
se motivadora e se dá através da discussão do grupo autogestor do processo: trata-se de uma educação humanizadora que destaca idéias de que essa prática se passa em um espaço coloquial e afetivo e que busca o diálogo, a ética, a liberdade e a transformação individual e social. O processo educacional se faz de forma dialética no qual o educando constrói o conhecimento a partir do contexto que funde aprendizagem e experiência social através de uma antropologia política (de compaixão e solidariedade humanista) e uma epistemologia histórico-cultural de crença e fé nos seres humanos para a mudança de um mundo de opressões e injustiças.
A abordagem progressista olha a escola além de seus muros, inclui o lar, as
atividades sociais, religiosas, enfim todo o entorno em que vive o aluno. É uma educação para a transformação do sujeito e do mundo. Visa à realização de uma consciência crítica e superação do “saber de experiência feito” (FREIRE, 1992, p.107). O conhecimento se prolonga a outros sujeitos numa relação sujeito-objeto-sujeito: é a consciência do mundo que impulsiona a ação para a transformação da realidade, com a escolha do conteúdo, feita pelo aluno, visando trabalhar os conflitos de seu espaço de convivência. Professor e aluno caminham juntos e “o professor deverá ser mais criativo e aprender com o aluno e o mundo”.
(GADOTTI, 2000, p.107).
Vale lembrar que a metodologia de Augusto Boal se apropria explicitamente da proposta de Paulo Freire quando vai buscar, através do Teatro, a superação do conflito opressor/oprimido. Mas o que se pretende nesse artigo, ao falar em abordagem Progressista, é mostrar que esses princípios devem estar subjacentes em qualquer metodologia do ensino do Teatro. Aliás, uma utopia é que esteja não apenas no Teatro, mas em todas as linguagens e em todas as áreas do conhecimento, pois como preza Freire (1999); é impossível existir sem sonhos!
Para ele, formar professores como profissionais reflexivos passa por fundamentos que exigem a consciência do educador de que:
- estamos a repetir um modelo já conhecido de política de reforma, uma regulação do centro para a periferia em que uma orientação política emanada de um governo central para a periferia de instituições locais que é reforçado através de um sistema de prêmios e punições. O resultado disso é uma espécie de jogo paralelo entre as escolas na periferia , que continuam a fazer as mesmas atividades, e as autoridades centrais ou
regionais que tentam controlar os comportamentos das escolas.
- precisa –se questionar: quais competências os professores deveriam ajudar as crianças a desenvolver? ; que tipos de conhecimentos e saber fazer permitem os professores desempenhar seu trabalho eficazmente? que tipos de formação serão mais viáveis para equipar os professores com as capacidades necessárias ao desempenho do seu trabalho?
- deve-se compreender como se passa a crise de confiança no conhecimento
profissional;
- há necessidade de buscar uma nova epistemologia de prática profissional e vencer o conflito entre saber escolar e a reflexão- na- ação dos professores e alunos;
No ensino do Teatro, o paradigma da Escola Progressista afina-se com o que Japiassu (2001) denomina de educação pós-modernista4, que se inicia a partir da queda do muro de Berlim (1989) e da derrocada do socialismo no Leste Europeu (1991). É resultante de uma descrença no poder da ciência e do trabalho para a solução da gama de problemas humanos, e,
4 Ricardo Japiassu em seu livro Metodologia do Ensino do Teatro denomina como modelo pós-modernista a proposta triangular. Em função de esse segundo termo ser ligado as Artes Visuais, prefiro adotar apenas ao “pósmodernista” como busca de uma identidade própria para a linguagem do Teatro.
numa visão epistemológica ampla (no que se refere na história do conhecimento humano) é uma concepção que faz parte do Paradigma da Complexidade, como se verá adiante.
Busca-se na educação pós-modernista um posicionamento crítico e auto-reflexivo do sujeito que considera a subjetividade, as relações complexas e metassistemáticas como alternativa para substituição da “consciência fragmentária, deformada e não emanciapada” (JAPIASSU, 2001, p.13) da sociedade contemporânea. Uma alternativa ao contexto presente
de coisificação do sujeito e das relações e no qual se vive mais o simulacro da realidade do que ela em si e cujos valores burgueses da modernidade (como a família) foram substituídos pelo individualismo, efemeridade e presentificação. Nessa prática o autor destaca a
importância de se trabalhar o conceito de Indústria Cultural no Ensino do Teatro, já que essa teoria apresenta como a cultura também fora revertida em mercadoria na sociedade capitalista pós-moderna. Uma prática pedagógica do ensino do Teatro que se busca possibilitará o aluno vivenciar a arte não como produto da cultura de massa - como vem se oferecendo monicamente - mas sim como experiência estética, sensível e cognitiva, como é o Teatro
na Educação que se quer, afinal:
Se, na atualidade, a dissolução total das singularidades em modelos
predeterminados e idealizados de ação encontram-se ao alcance das mãos – e do bolso- do “consumidor”, o ensino modernista tardio de teatro, na perspectiva de uma educação emancipadora, necessita então contribuir para que o sujeito se conscientize desse processo de reificação ou coisificação no qual somos todos enredados com o advento da indústria cultural. (JAPISSU, 2001, p. 15)
Em processos de aprendizagem essa conscientização passa pela compreensão da
compreensão (metateorias e metasistemas cognitivos) através de diálogo, intertextualidade, intersubjetividade, da construção fenomênica da pesquisa e experiência, enfim, da construção do conhecimento. Nas práticas do Ensino de teatro seja qual for a abordagem metodológica escolhida, por esse viés o conhecimento se torna efetivo, pois é um instrumental gnificativo para que o sujeito atue criticamente na vida e sociedade, isso é, questione e interfira nas singularidades apresentadas. Destaca-se aí a contribuição das idéias de Complexidade do filósofo Francês Edgar Morin como uma nova epistemologia que busca a ligação entre o todo e as partes no saber fragmentado em todas as dimensões sociais.
CONTRIBUIÇÕES DA COMPLEXIDADE PARA O TEATRO NA EDUCAÇÃO
O termo complexidade surgiu no final dos anos 60, advindo da cibernética, das teorias dos sistemas e do conceito de auto-organização. A palavra deve lembrar problema, não solução, pois não é utilizada para designar idéias simples, nem se reduz a uma única linha ou vertente do pensamento, e sim a todas as influências recebidas, internas e externas (PETRAGLIA, 1995, p. 77). Etimologicamente, vem do latim complexus, que significa o que
abrange muitos elementos ou várias partes. É a qualidade do que é complexo, um conjunto de circunstâncias ou coisas interdependentes que apresentam ligações entre si, uma congregação de elementos que são membros e participantes do todo. Esse é uma unidade complexa, ao mesmo tempo em que não se reduz a mera soma dos elementos que constituem as partes.
O Complexo envolve a auto-regulação, a produção e organização, a autonomia e dependência, a complementaridade entre antagônicos em detrimento da exclusão, a reintrodução do conhecimento no conhecimento como algo infinito. São metassistemas que se comunicam para que se tenha compreensão crítica e construtiva da relação entre sujeito e objeto considerando o que o paradigma moderno de conhecimento (o racional) exclui o que é muitas vezes responsável por tantas deficiências não só na educação, mas na sociedade toda
5. No volume IV – As Idéias de O Método (a obra mais completa e densa de Edgard Morin, na qual o autor sistematiza os passos na direção de uma estrutura de investigação científica, sugerindo a reflexão do ser e do saber considerando os múltiplos e variados aspectos que os fazem complexos), o autor apresenta o conceito de metassistemas e metapontodevistas (contextos); são brechas que abrem perspectivas no campo da epistemologia para o conhecimento complexificador, infinito. A lógica da complexidade considera (inclusive surge daí), as contradições, ambigüidades, incertezas, irracionalidades porque dialoga com o mundo real para ser significativa.
Essa lógica quer o desenvolvimento da Inteligência, entendida como a ação exercitada pela organização. A Inteligência da Ação então se manifesta na capacidade de reconhecer os atos, ações, funcionamentos, comportamentos e são índices que permitem o acesso aos enunciados que descrevem o fenômeno e estabelecem referências aos verbos indicadores da ação. Envolvem: processos, processadores, funcionamentos, movimentos, transformação e
evolução. Com esses domínios, na aprendizagem é possível propor um modelo reproduzível e programado conhecendo o contexto do projeto da ação. “Um outro olhar, um outro modo de representação que privilegia o ato e não mais o ser, o movimento e não mais a substância imóvel” (MORIN e MOIGNE, 2000, p. 228), como a transformação que se opera na educação que propõe Paulo Freire.
Ação é qualquer forma de articulação inteligível, de jogo, intermediação que suscita a ocorrência de comportamentos imprevisíveis e inteligíveis, formando a organização (fenômeno organizado adicionado ao produto da organização e o organizante). É o que vai mediar a relação entre matéria e energia, a informação e a organização que mantém, que reúne e produz (transforma) a ação e seu resultado. “A organização é a ação de, ao mesmo tempo, manter e se manter, reunir e se reunir, produzir e se reproduzir” (MOIGNE, 2000, p. 236).
Na prática, ocorre através da articulação das funções de fazer, regular, informar, memorizar, decidir, coordenar, imaginar, finalizar, nas quais a complexidade aparece como um instrumento modelizador.
A Inteligência Ativa está atuante no jogo de complementaridade presente na relação com a complexidade: a inteligência ergue e descobre as faces escondidas da complexidade e a complexidade busca ativar a inteligência. Por esse motivo que a reforma do pensamento proposta por Edgar Morin deve processar-se pela reforma do ensino e vice-versa. Pensar um novo paradigma de conhecimento, portanto, implica em pensar uma nova educação com todas
as considerações até aqui levantadas.
O Teatro, assim, pode ser a brecha que se abre na nova perspectiva da ciência e ensino-aprendizagem, pois envolve essencialmente o que o soberanismo da lógica clássica e do modelo racional excluía; o ilógico, as possibilidades (o “vir a ser”), a intuição, a intersubjetivação, a criatividade... enfim, elementos existentes nas relações dessa manifestação artística e que são princípios para a concepção de Inteligência na Complexidade e vice-versa.
5 Muitos trabalhos de Morin e outros autores com pesquisas sobre os novos paradigmas pontuam o que vem a ser essas dificuldades na sociedade sob o ponto de vista da política, ecologia, espiritualidade, economia,etc. Alguns
autores são; Fritjopf Capra, Pedro Demo, Ubiratan D’ Ambrósio, A . R Damásio...
Nessa brecha está o desafio das artes na produção do conhecimento, rompendo com o padrão que por tanto tempo inferiorizou o status cientifico da arte na história do conhecimento, afinal;
Tanto a arte como a ciência respondem sempre às condições histórico-concretas da vida da sociedade. Estão determinadas pelo Estado e o caráter das relações de produção (...) Isto determina a existência de uma estreita relação entre o reflexo artístico que se traduz em imagens artísticas, e o pensamento científico, que o faz em conceitos, categorias e leis. Tanto o pensamento artístico como o científico refletem o mundo objetivo e se desenvolvem com a prática social. (DURÀN in CARREIRA e CABRAL, p. 12, 1996)
Arte é forma de conhecimento, pois envolve a história, a sociedade, a vida. Não está apenas ligada a idéia de prazer estético, contemplação passiva, mas ao contrário, é dinâmica e representa trabalho já que possui forças materiais e produtivas que impulsionam as relações históricas e sociais e levam o homem à compreensão de si mesmo e da sociedade. A arte
proporciona prática criadora à luz das relações sociais, culturais e estéticas levando em conta as transformações nas novas configurações de tempo e espaço. Compreendê-la como processo social, é, portanto, chamá-la de produção cultural e conhecimento humano. As transformações históricas que se operam nas estruturas artísticas e suportes físicos e materiais possibilitam atualização e construção do conhecimento artístico, já que é um produto social que utiliza recursos técnicos e forças produtivas que contribuem para determinar o grau de desenvolvimento da produção da sociedade e impulsiona as relações de distribuição e consumo da produção estética. O processo representa uma teia de relações humanas baseadas
em produções simbólicas, estéticas, estésicas e críticas que interferem no tempo e espaço humano.
São essas interferências que promovem transformações qualitativas de significados, por isso também promovem uma educação para a contradição –como prioriza a complexidade- e para a resistência e transformação – como é o ideal Progressista. Isso é, uma visão emancipatória, com ânsia em converter a potência repressora dos modelos dominantes apontados nesse artigo.
Aí é pertinente o questionamento feito por Ruben Alves (1999) no texto “O que é Científico?” que desmitifica o caráter de “guardião da verdade” que o cientificismo clássico (do paradigma racional ou moderno) traz intrinsecamente.
No texto o autor afirma ser científico aquilo que caiu nas redes reconhecidas pelas confrarias dos cientistas; os que pescam no grande rio, mas cujas redes não captam os céus, as matas e tudo demais que existe na natureza e sociedade. Dessa forma, concordando com Alves, as questões até aqui apresentadas não visam “elevar as artes a um status de ciência”,
mas sim buscam argumentar sobre a importância de tê-las como parte dos valores sociais, culturais e de aprendizagem numa educação libertária.
Parece utópico, principalmente no contexto “extremamente capitalista, cujos valores éticos, estéticos e morais soam guiados pela ganância do lucro e da massificação da cultura de mídia, do consumo”, como afirma Paiva (2003, p. 118). Mas é aí que está o papel do professor na escola e da universidade na formação desse professor, afinal, são mediadoras da
produção e reprodução de conhecimento (que aqui foca o Teatro).
Paiva (2003, p.118) afirma ainda que o processo de construção do conhecimento (cujo princípio básico é a educação) é imanente do diálogo do homem consigo mesmo, e, esse tem seu primórdio na expressão artística das pinturas rupestres ou na imitação que os filhos e amigos faziam do homem. Ele escreve que se a arte é práxis criadora, a educação deve ser considerada uma arte, principalmente na contemporaneidade. A recíproca é válida e as práticas na sala de aula são mais que necessárias para essa conquista e por isso reforça-se aqui a importância da formação do professor.
O autor ainda demonstra que vários pesquisadores relacionam ética e estética:
Domenico de Masi afirma que foi a sociedade moderna, industrial, que expulsou o belo, o sensível e o estético do mundo do trabalho; Benedito Nunes diz que o poder da técnica moderna, o trabalho industrial monótono torna-se cada vez mais um processo impessoal, refratário às necessidades criadoras e expressivas do indivíduo; Ortega y Gasset acredita que uma desumanização da arte é como desumanização da sociedade (PAIVA, 2003, p.119) Dessa forma, ações como as descritas no artigo visam um aprofundamento nas bases teóricas e práticas do Teatro na Educação para que esse, enquanto arte, seja entendido em sua ampla dimensão na escola e sociedade, e, não como lazer, recreação ou “luxo” como vem se reproduzindo predominantemente, mas como forma de conhecimento que possibilita a aprendizagem a partir dos saberes específicos.
Apresenta-se, assim, através do ensino do Teatro, a importância do desenvolvimento de uma educação Progressista para o desenvolvimento do pensamento complexo na amplitude da capacidade de viver relacionando as partes com o todo; do pensar sobre pensar o próprio pensar e da consciência e autonomia que melhoram as perspectivas individuais e coletivas, uma necessidade é urgente diante do contexto atual que renega o conhecimento não racional e sensível e valoriza a cultura como produto. Um novo olhar através do Teatro na educação que acessa com os saberes da área sentimentos, sensações, percepções e compreensões ao se entrar em contato com um texto, personagem, jogo teatral ou com um projeto de encenação.
Vive-se aí o novo que desafia, desperta, interrompe ou faz interromper alguma idéia. Essa disponibilidade está vinculada à capacidade cognitiva e expressiva, adquirida com a experiência teatral, estudos e técnicas. “Trata-se, portanto, de um processo de aprendizagem” (MACHADO, M. A., 2006, p. 100).
O olhar a partir desses apontamentos já deixa algumas pistas da ecessidade de continuísmo sobre as questões levantadas. Morin argumenta que as bases do pensamento racional (dedução e indução) tão dominante excluem a invenção e a criação. Ao chegar na questão paradigmática da lógica da complexidade, afirma que a racionalidade verdadeira é
aquela capaz de dialogar com a poesia: há clareza sobre a necessidade de novas gerações de sistemas de aprendizagem, como o que propõe o Teatro na Educação.
Há ainda inúmeras questões que merecem estudo e investigação no que se refere às buscas de bases mais sólidas para o Teatro na Educação; tem-se muito para se pesquisar. Esse artigo defende, nesse universo todo, a busca pelo conhecimento complexo num paradigma Progressista de educação a partir do ensino do Teatro, cuja mudança deve ser efetuada na prática, em todos os níveis de educação.
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